Costa pede desculpa por Escária, afasta-se ‘do melhor amigo’ e justifica negócios

A partir de São Bento, diz-se envergonhado por Escária, afastou-se de Lacerda Machado e "respondeu" às investigações do Ministério Público a negócios do lítio, hidrogénio e Data Center em Sines.

Fomos surpreendidos esta semana por um processo judicial com suspeitas muito graves. Não posso deixar de partilhar que a apreensão de envelopes com dinheiro no gabinete de uma pessoa que escolhi trabalhar, envergonha-me e peço desculpa aos portugueses”. O Primeiro-ministro falava este sábado ao país, no Palácio de São Bento, quatro dias depois da sua demissão e de Marcelo Rebelo de Sousa ter anunciado a dissolução do Parlamento e marcado eleições antecipadas para 10 de março.

Dizendo-se “envergonhado e magoado e com a confiança traída”, António Costa pediu desculpa aos portugueses, referindo-se aos envelopes contendo 78 mil euros encontrados no gabinete de Vítor Escária, em São Bento. O seu ex-Chefe de Gabinete é um dos detidos e arguidos na chamada “Operação Influencer”. Foi exonerado dias depois de ter sido tornada pública esta investigação.

Os investimentos

Mas isso não quer dizer, disse António Costa, que “Portugal desperdice oportunidades de investimento – para Portugal” e que futuros governos não percam oportunidades e pelo não aproveitamento das infraestruturas que o país dispõe. Explicou ainda que os governos têm o dever de trabalhar na “atração de investimento estrangeiro” e relembra que “há regras especiais a projetos de interesse nacional tem de acontecer com transparência”. Ainda assim, sublinha, esses investimentos “nunca podem resultar de mera decisão arbitrária de qualquer membro do Governo”.

Relativamente às minas de lítio em Montalegre ou Boticas – dois dos negócios que estão na mira da justiça – sublinhou que “houve estudos de impacto ambiental e que esta exigência de compatibilização das várias dimensões de interesse público é particularmente crítica em Sines”.

“Não posso deixar a pairar na opinião pública a ideia de que os governos não têm de atrair investimentos, combater a burocracia e agilizar os licenciamentos, a ideia de quase sempre qualquer investimento exige a compatibilização com outros interesses públicos”, esclareceu.

“A qualquer Governo compete assegurar que o resultado final é a melhor satisfação do interesse público no seu conjunto. É assim por exemplo que o licenciamento da exploração de minas de Lítio em Montalegre e Boticas foi sujeito a um estudo de impacto ambiental e os concessionários foram obrigados a cumprir as condições impostas por esses estudos”, seja pela localização, seja para assegurar as necessidades de abastecimento de água e de uma nova via necessária para ligação à autoestrada”.

Esta exigência de compatibilização das diferentes dimensões do interesse público é particularmente crítica em Sines”, diz Costa, falando sobre o projeto do Data Center em Sines. “Todos os projetos em desenvolvimento em Sines, designadamente o centro de dados, que é o maior investimento estrangeiro realizado em Portugal desde a instalação da Autoeuropa têm sido obrigados a respeitar a Zona Especial de Conservação“.

António Costa explica o porquê da comunicação aos portugueses, dizendo que ao “ver o noticiário”, “fui verificando que, para além dos casos concretos, pressupunha-se uma ideia perigosa”, “uma ideia de que os governantes não devem agir para captar investimento, para simplificar os procedimentos democráticos” que são “ideias perigosas para o futuro do País”.

“A justiça o que é da justiça”

António Costa é alvo de uma investigação do Ministério Público no Supremo Tribunal de Justiça, após suspeitas num processo relacionado com negócios sobre o lítio, o hidrogénio verde e um centro de dados em Sines terem invocado o seu nome como tendo intervindo para desbloquear procedimentos.

“Confio na Justiça e na Administração Central”, disse ainda, garantindo uma total colaboração com a investigação do Ministério Público e do Supremo Tribunal de Justiça. Acrescentando ainda que esta declaração ao país não pretende ser uma “ingerência na Justiça” mas sim explicar “opções políticas do Governo”. “Com grande probabilidade não exercerei nunca mais qualquer cargo público”, disse ainda.

A justificação da escolha de Mário Centeno

António Costa foi questionado relativo à escolha de Mário Centeno. “A minha preocupação era habilitar o Presidente da República com uma alternativa a colocar o país a três anos do fim de uma legislatura a dissolver um Parlamento e a irmos para um processo eleitoral”, explica, argumentando que a consciência o levou a encontrar “alternativas à dissolução da Assembleia da República”.

Na quarta-feira, Centeno foi proposto por Costa ao Presidente da República como solução para segurar a maioria absoluta. Marcelo não rejeitou logo a ideia do Governador do Banco de Portugal (BdP) poder ser um primeiro-ministro interino.

Costa entendeu que o nome de Centeno era o certo por ter “sólida experiência governativa”, por merecer “o respeito e admiração da maior parte dos portugueses” e por ter “reconhecimento e credibilidade internacional”, nomeadamente quando nas capas dos jornais internacionais foi noticiado que “o primeiro-ministro de Portugal se demitiu associado a um caso de corrupção”. Costa quis dar “mensagem para o mundo” ao escolher Mário Centeno.

A investigação judicial

O Ministério Público (MP) considera que houve intervenção do primeiro-ministro na aprovação de um diploma favorável aos interesses da empresa Start Campus, responsável pelo centro de dados, de acordo com a indiciação, que contém várias outras referências a António Costa.

No dia da demissão, Costa recusou a prática “de qualquer ato ilícito ou censurável”. Depois desta demissão e do Conselho de Estado se ter reunido na quinta-feira. Marcelo Rebelo de Sousa dissolveu o Parlamento e convocou eleições antecipadas para 10 de março. Costa será exonerado em dezembro e fica em funções até tomada de posse do próximo Governo. Para dia 15 de janeiro está marcada a dissolução do Parlamento.

Na terça-feira, foram conhecidas buscas à residência oficial do primeiro-ministro e diversas buscas e detenções de ex e atuais membros do Governo levadas a cabo pela PSP. Em causa estariam negócios relacionados com a área de energia. O dia acabou com o pedido de demissão do primeiro-ministro de António Costa.

Diogo Lacerda Machado foi detido, tal como o chefe de gabinete de António Costa, Vítor Escária, e ainda Nuno Mascarenhas, Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, numa investigação que visaria os casos dos negócios do lítio, do hidrogénio e do centro de dados em Sines, chamada de “Operação Influencer”. Nesse mesmo dia, foram ainda constituídos arguidos o ministro João Galamba e Nuno Lacasta, presidente da Agência Portuguesa do Ambiente (APA).

Em causa estariam alegadas “irregularidades” em investimentos em projetos de exploração do lítio, hidrogénio e da construção do data center, que podem ter superado os 1.000 milhões de euros.

A operação levou ainda à constituição de quatro arguidos, designadamente o ministro das Infraestruturas, João Galamba, o presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta, o advogado e antigo porta-voz do PS, João Tiago Silveira, e a empresa Start Campus.

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