Metade das emitentes resiste a dar poderes a independentes nas nomeações
A existência de uma comissão de nomeação pretende garantir que são cumpridos critérios de independência, nomeadamente na escolha dos administradores independentes.
As empresas emitentes da bolsa portuguesa continuam a revelar resistência para designar uma comissão de nomeações dos órgãos sociais e quadros dirigentes, composta por uma maioria de não executivos independentes. Apenas metade das cotadas do PSI cumpre esta recomendação, com as empresas a continuarem a mostrar-se pouco disponíveis para permitir a intrusão de independentes na tomada de decisões.
Só 49% das emitentes da bolsa portuguesa tinham, no final de 2022, uma comissão com competências em matéria de nomeações relativamente a membros dos órgãos sociais. No PSI, o número de empresas que cumpre a recomendação sobe para 87%, mas quando se olha para a composição desta comissão, as empresas falham noutra recomendação: inclusão de uma maioria de membros não executivos independentes.
Apenas metade das cotadas do índice de referência da bolsa de Lisboa concedem em dar poder a estas figuras, segundo conclui o Relatório Anual de Monitorização do Código de Governo das Sociedades do Instituto Português de Corporate Governance (IPCG) de 2022, revelado esta segunda-feira, 18 de dezembro.
Ainda em matéria de comissões, o código do governo das sociedades recomenda a criação de uma entidade com poderes em matéria de governo societário. Uma recomendação acolhida por pouco mais de metade (54%) das 36 empresas emitentes consideradas neste relatório, uma percentagem que sobe para 87% considerando apenas as 16 empresas que compõem o PSI.
A existência de uma comissão de nomeações, um perfil predefinido com base no qual se vão escolher os independentes, a percentagem dos independentes no conselho e um coordenador que represente os independentes no conselho são áreas onde temos que crescer.
Se em matéria de nomeações, os números não são famosos, noutras rubricas relacionadas com independentes as empresas portuguesas também estão longe dos níveis de acolhimento desejados. Apenas 44% (80% no PSI) das emitentes acolheu a designação, pelos administradores independentes, de um coordenador.
Por outro lado, apenas 62% das empresas emitentes acolhe a inclusão de, pelo menos, um terço de administradores independentes no órgão de administração, subindo o acolhimento para 86% no universo das empresas do PSI.
“A existência de uma comissão de nomeações, um perfil predefinido com base no qual se vão escolher os independentes, a percentagem dos independentes no conselho e um coordenador que represente os independentes no conselho são áreas onde temos que crescer”, explica ao ECO João Moreira Rato, Presidente do IPCG.
O mesmo responsável nota que “à medida que se vai construindo o edifício da corporate governance, a importância das funções de controlo e dos órgãos de fiscalização e importância dos independentes e a forma como são escolhidos são no fundo as últimas evoluções do corporate governance”, adiantando que estas são áreas onde o “nível de adesão é bastante fraco”.
As empresas que resistem a haver um coordenador dos independentes estão a resistir aos independentes terem uma voz.
Para Moreira Rato, a resistência das empresas em aceitar a presença de administradores independentes é “sinal do subdesenvolvimento do nosso tecido empresarial”, acrescentando que o reduzido número de independentes no conselho e a inexistência de uma comissão de nomeações é uma das principais críticas apontadas pelos representantes de grandes investidores externos nas empresas portuguesas.
“As empresas que resistem a haver um coordenador dos independentes estão a resistir aos independentes terem uma voz”, realça Moreira Rato, acrescentando que a “comissão de nomeações e ter uma maioria de independentes é muito importante” para garantir a independência dos independentes.
“Para atrair investidores, estes aspetos têm que ser melhorados, mas provavelmente não o são porque as empresas não sentem essa necessidade”, refere o presidente do IPCG, lembrando a urgência de incentivar uma redução da dependência do financiamento à banca.
Órgão de fiscalização sem poderes
Outra das orientações do código do governo das sociedades com menor grau de acolhimento tem que ver com os poderes concedidos ao órgão de fiscalização. As recomendações do código apontam para uma maior interligação entre o órgão de fiscalização e a administração, prevendo-se que haja uma avaliação e pronúncia por parte do órgão de fiscalização sobre as linhas estratégicas e sobre a política de risco definidas pelo órgão de administração, ainda antes da sua aprovação final.
Em ambas as recomendações (fiscalização sobre as linhas estratégicas e política de risco) foi observado um nível de cumprimento de 60%, com estes números a subirem para 93% e 87%, respetivamente, nas empresas do PSI.
Em termos globais, o grau médio de acolhimento das 53 recomendações do código do IPCG – desdobradas em 74 subrecomendações – foi de 83%, em 2022. Considerando apenas as empresas do PSI, esse número sobe para 95%.
Sustentabilidade ganha capítulo próprio
No exercício de monitorização de 2023 serão incluídas algumas modificações no código, naquela que é a segunda revisão desde que foi lançado em 2018, ano em que o IPCG assumiu a elaboração do Código de Governo das Sociedades (CGS) e a sua monitorização, substituindo a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) nesta função, numa lógica de autorregulação.
Segundo Mariana Fontes da Costa, Diretora Executiva da Comissão Executiva de Acompanhamento e Monitorização, o código revisto inclui “a introdução de um capítulo primeiro que tem por tema a sustentabilidade”, onde será abordada a relação da comunidade com o acionista e as partes interessadas, assim como outros temas que têm vindo a assumir maior relevância, como a inteligência artificial.
O código vai, por exemplo, levar em consideração a possibilidade de haver mecanismos de IA em matérias de decisão e haver necessidade de reporte, caso isso aconteça.
Além desta alteração, o código introduz pequenos ajustes em algumas recomendações, que têm como objetivo manter estas recomendações dinâmicas e atualizadas.
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