BCE a caminho de liderar descidas de juros a nível global

O alívio da política monetária do BCE deverá ser lenta, mas começar mais cedo do que nos Estados Unidos e de forma mais intensa do que é esperado para a Reserva Federal.

A subida da inflação nos Estados Unidos em março, para valores acima do esperado, levou o mercado a adiar as perspetivas de cortes de juros da Reserva Federal (Fed) e outros bancos centrais, mas a reunião desta quinta-feira do Banco Central Europeu (BCE) não alterou as previsões de que a autoridade monetária da Zona Euro vai reduzir a taxa de juro em junho e efetuará mais duas descidas até ao final do ano.

O BCE cumpriu o guião, deixando pela primeira vez de forma explícita a possibilidade de cortar os juros na próxima reunião. Christine Lagarde, como era esperado, não deu o alívio em junho como garantido e também não se comprometeu com descidas adicionais, mas deixou bem claro que o banco central não está refém das decisões da Fed, mas sim dos dados económicos.

Se cumprir a promessa, o BCE terá poucos argumentos para não baixar os juros em junho e prosseguir posteriormente com a redução do nível restritivo da política monetária. A taxa dos depósitos está atualmente num máximo histórico de 4%, numa altura em que a inflação está a caminho da meta dos 2% (o indicador subjacente, que exclui alimentos e energia, está em mínimos abaixo dos 3%) e a atividade económica está praticamente estagnada.

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O BCE “é dependente dos dados [económicos] e não da Fed”, vincou Lagarde na conferência de imprensa desta quinta-feira. Depois de ter sido anunciado que a inflação dos EUA subiu em março para 3,4%, no terceiro mês seguido acima das estimativas, as expetativas para cortes de juros na Fed foram adiadas de junho para setembro, com o mercado a contemplar no máximo duas descidas de juros em 2024. As previsões para outros bancos centrais também foram ajustadas, com os investidores a aguardarem cortes de juros do Banco de Inglaterra só em agosto e alívios mais lentos das autoridades monetárias de países como a Austrália e Canadá.

O banco central da Suíça foi o primeiro do G10 (moedas mais negociadas do mundo) a baixar os juros, mas entre os de maior dimensão deverá ser o BCE a liderar o movimento de descidas, o que será inédito na curta história da autoridade monetária do euro. A reação dos mercados e as declarações dos economistas validam esta perspetiva. Embora sem oscilações muito significativas, o euro recuou para mínimos de fevereiro e o diferencial entre as yields das obrigações a 10 anos dos Estados Unidos e da Alemanha agravou-se para mais de dois pontos percentuais.

O mercado de swaps de taxa de juro indica que o BCE cortará os juros em 77 pontos base em 2024, o que implica descidas de 25 pontos base nas reuniões de junho, setembro e dezembro. No caso da Fed, as expetativas apontam para uma descida acumulada de apenas 43 pontos base este ano, pelo que a descidas de 25 pontos base em setembro e dezembro não estão totalmente descontadas. A concretizar-se este cenário, o BCE pode avançar a 12 de setembro com o segundo corte de juros, uma semana antes da Fed anunciar a primeira redução (18 de setembro).

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Alívio será lento ou muito lento?

Dando por garantida a descida de juros em junho, a principal dúvida está em saber qual o ritmo de alívio da política monetária que o BCE vai adotar. A resposta está nos próximos indicadores económicos, mas é consensual entre os economistas que, a menos que se assista a uma recessão grave na Zona Euro, não está em cima da mesa uma descida célere das taxas de juro que anule já este ano o nível restritivo da política monetária.

A Capital Economics mantém a previsão de que o BCE vai cortar os juros em 25 pontos base em junho e optará por mais três reduções até ao final do ano. A consultora estima que a inflação da Zona Euro vai baixar para 2% no verão (indicador subjacente nos 2,5%) e a atividade económica continuará fraca, pelo que “será difícil para o BCE justificar um ciclo de corte de juros muito lento”.

Felix Feather, economista da gestora de ativos britânica Abrdn, assinala que o BCE abriu a porta a um corte de juros em junho, mas alerta que os investidores “não devem esperar que o BCE acelere a descida das taxas”. O banco central “sublinhou a necessidade de manter a política monetária restritiva durante algum tempo, o que impede uma série de cortes muito acentuados”. Ainda assim, o Felix Feather aponta para “vários cortes de juros antes do final do ano”.

O ING tem uma perspetiva mais cautelosa, assinalando que o BCE deu mais um passo em direção a uma reversão “muito gradual da política monetária”, aguardando que o corte de juros em junho seja acompanhado de uma comunicação agressiva (hawkish), uma vez que a “margem de manobra para o BCE reduzir as taxas de forma mais significativa é limitada”.

Os economistas do banco dos Países Baixos concluem que a relutância no BCE em ser mais explícito reflete “um maior grau de discordância” dentro do Conselho do BCE. Lagarde revelou que vários membros deste órgão que define a política monetária defenderam o corte de juros já este mês, mas o ING assinala que outros responsáveis “temem que a inflação ainda elevada nos serviços, a recente escalada nos preços do petróleo, bem como a evolução dos salários na Alemanha”, ainda representem um risco de a inflação voltar a acelerar.

“Enquanto a economia da Zona Euro continuar no bom caminho para uma recuperação gradual – por mais fraca que seja – e enquanto o risco de reaceleração da inflação permanecer elevado, não veremos o BCE a reduzir os juros em mais de 75 pontos base este ano”, assinala o ING.

Na reunião de 6 de junho, o BCE já terá na sua posse uma bateria de dados económicos e os números da evolução dos salários do primeiro trimestre. O staff do banco central avançará com a atualização das projeções macroeconómicas, o que dará ao mercado uma visibilidade mais nítida sobre o rumo das taxas de juro na segunda metade do ano.

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