Lucros da Nors caem 5% para 110 milhões. Ciberataque parou negócios durante dez dias

Disparo do custo de endividamento, “ceticismo” dos investidores no Brasil e perdas cambiais em Angola travam resultados do grupo do Porto, que emprega 4.715 pessoas e faturou 1.500 milhões em 2023.

Os lucros do grupo Nors baixaram quase 5% no ano passado, para 110 milhões de euros. Ainda assim, este foi o segundo ano consecutivo com resultados líquidos acima dos oito dígitos para a multinacional portuguesa liderada por Tomás Jervell, que detém negócios que vão dos equipamentos de construção aos veículos pesados (camiões ou autocarros), passando pelas máquinas agrícolas e industriais até ao comércio de automóveis.

“O ano de 2023 ficou marcado por efeitos de políticas monetárias restritivas na maioria dos países onde o grupo opera, a traduzirem-se num aumento significativo do custo de endividamento. Em paralelo, a normalização dos níveis de inventários (associada à regularização das cadeias de abastecimento) e os investimentos nas aquisições de empresas implicaram um aumento da dívida média” justifica, calculando em três milhões de euros o impacto da subida dos juros líquidos.

No relatório e contas consultado pelo ECO, em que salienta este “agravamento da função financeira do grupo” e a “expressiva desvalorização do kwanza [que] produziu um impacto negativo de 6,4 milhões de euros” nos lucros em termos homólogos, o grupo sediado no Porto reporta um novo recorde no volume de negócios consolidado: 1.500,4 milhões de euros vs. 1.483,3 milhões em 2022. Em termos agregados, isto é, incluindo a especialista em equipamentos de construção Ascendum, participada em 50% pela Nors, o indicador sobe para os 2.801,3 milhões de euros.

Fonte: relatório e contas do grupo Nors

Em termos geográficos, as vendas foram distribuídas por Portugal (21,2%), Brasil (20,2%), EUA (15,3%), Canadá (12,4%), Turquia (9%), Europa Central (8,4%), Espanha (4,9%), Angola (4,2%), México (2,4%) e Botswana, Moçambique e Namíbia (2%). “Num contexto de elevados desafios macroeconómicos e geopolíticos, o grupo demonstrou resiliência e capacidade de adaptação às circunstâncias do mercado. Estes fatores foram críticos para captar valor em todas as geografias onde o grupo opera, assegurando a importância da diversificação de operações”, frisa.

No mesmo documento, o grupo fundado há 91 anos e detido pelas famílias Jervell (maioritária) e Jensen destaca o crescimento de 21% das vendas em Portugal, “em boa parte associado à carteira de negócios que transitou do ano anterior”. No mercado doméstico, o principal negócio são os camiões e as peças, com a representação da Renault Trucks e Volvo Trucks no país.

Já no Brasil, onde entrou em 2007 com a distribuição de camiões, o negócio foi afetado pelo “contexto de algum ceticismo por parte dos investidores no início do ano, que levou ao adiamento de decisões de compra”. Em relação ao exercício anterior, as vendas estabilizaram (+0,3%) devido à inclusão de duas das mais recentes aquisições no perímetro de operações.

Em causa estão a compra da Agrofito para reforçar a presença na área agrícola (tratores, pulverizadores, equipamentos de plantação e ceifeiras debulhadoras), que integrou o grupo em março de 2023; e a entrada no setor das máquinas de construção do outro lado do Atlântico, ao adquirir por 40 milhões de euros os ativos operacionais da Tecnoeste e ficar com os direitos de representação exclusiva das marcas Volvo e SDLG nos estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. A Nors Centro Oeste, como é designada esta operação, integrou o perímetro do grupo em novembro.

No mercado canadiano, onde opera apenas na área da construção e que é um dos mais recentes mercados no portefólio — no início de 2020, a poucas semanas do início da pandemia, pagou 132 milhões de euros pela cotada StrongCo Corporation — registou no ano passado uma queda de volume de negócios de 44,5 milhões de euros (-11,4%), “refletindo os efeitos da política económica restritiva”. Já em março deste ano fechou a compra da concessionária de equipamentos de construção e floresta Great West Equipment por cerca de 100 milhões de euros.

Desvalorização da moeda no segundo semestre de 2023 teve um impacto negativo de 14,4 milhões de euros nas vendas em Angola.

Finalmente, as vendas da multinacional portuguesa em África também caíram 9,3%, “umbilicalmente relacionadas com o impacto da atividade em Angola”. Nesta geografia, contabiliza, o efeito da desvalorização da moeda na segunda metade do ano “impactou negativamente” as vendas em 14,4 milhões de euros, quando comparado com o período homólogo.

Num ano em o EBITDA se cifrou em 188,8 milhões de euros, baixando 1,8% face ao “resultado histórico” de 2022, e em que a margem bruta aumentou 1% para 267,2 milhões, “alicerçada essencialmente no segmento de após-venda”, fechou o exercício com uma dívida líquida de 133,1 milhões de euros. Um disparo de 82,8%, metade dele explicado pelas duas aquisições no Brasil. Ainda assim, ressalva que o endividamento em função do EBITDA gerado “continua em níveis muito conservadores” e mantém um “balanço sólido e capaz de acomodar eventuais movimentos desfavoráveis do mercado”.

Perda de resultados por ciberataque ainda por quantificar

Fundada em 1933 pelo avô de Tomás Jervell, que em 2009 trocou o cargo de administrador financeiro pela liderança máxima do grupo, em substituição do pai, a antiga AutoSueco está atualmente presente em 17 países: Portugal, Espanha, Áustria, República Checa, Eslováquia, Roménia, Hungria, Croácia, Brasil, Turquia, Angola, Moçambique, Botswana, Namíbia, México, EUA e Canadá.

A 31 de dezembro de 2023 tinha um total de 4.715 trabalhadores (dos quais 1.453 em Portugal), mais quase meio milhar do que empregava um ano antes. Com 534 pessoas em cargos de gestão — 445 são homens e apenas 89 mulheres –, as equipas são compostas por 30 nacionalidades diferentes e a idade média dos funcionários é de 41 anos.

No relatório e contas, a Nors revela, por outro lado, que em março deste ano foi “alvo de um ciberataque de elevada magnitude, que impediu o normal funcionamento dos negócios durante cerca de 10 dias”. “Análises forenses permitiram validar que não existiu perda ou fuga de informação, estando em quantificação o impacto de perdas de resultados em 2024, não sendo, contudo, esperado que o mesmo seja material para o grupo”, completa.

Tomás Jervell, CEO do grupo Nors, em entrevista ao ECO - 22SET23
Tomás Jervell, CEO do grupo NorsRicardo Castelo/ECO

Em termos de categorias, o negócio que mais pesa no total (63,7%) é o dos equipamentos de construção, que inclui desde retroescavadoras e pás carregadoras a camiões articulados para as minas, em que começou a operar em 1970 em Portugal. Opera diretamente neste segmento off-road no Canadá, Brasil e Angola; e está presente indiretamente noutros 14 países da Europa e da América através da participada Ascendum, uma das maiores fornecedoras mundiais de equipamentos para construção e infraestruturas da Volvo.

Segue-se o negócio dos camiões englobado na Nors Mobility (33,6%), a Nors Aftermarket (2,2%) e a Nors Ventures (0,5%), dedicada a explorar novos negócios em áreas não core. Detém uma participação de 66% na corretora Amplitude Seguros e a totalidade de uma operação industrial ligada aos contentores do lixo enterrados. Com sede e unidade fabril no Entroncamento (distrito de Santarém), a ribatejana Sotkon, que comprou em 2008, tem como clientes várias autarquias e entidades privadas, em Portugal e no estrangeiro.

Para 2024, o grupo perspetiva um “ano desafiante, com conjunturas distintas nas várias geografias onde opera”. “Não obstante, prevê-se que dê continuidade à estratégia de consolidação do seu negócio core, através da aquisição de novos negócios, assinala no mesmo documento. A primeira grande compra do ano já foi concretizada em março no Canadá, onde a Great West Equipment tem operações em duas províncias (British Columbia e Yukon) e cerca de 250 trabalhadores distribuídos por 11 filiais.

Por outro lado, cumprindo a ideia de “focar a atividade nos setores da mobilidade pesada (camiões e autocarros), dos equipamentos de construção e dos equipamentos agrícolas, definidos como estratégicos para os próximos anos”, como explicou Tomás Jervell, em declarações ao ECO, a Nors já encontrou compradores para a Auto Sueco Automóveis (retalhista de ligeiros de passageiros em Portugal, com 190 funcionários e representações das marcas Volvo, Mazda, Honda, Jaguar e Land Rover). A Carclasse comprou os pontos de venda de Braga, Lisboa e Setúbal e a Gocial adquiriu os dois concessionários localizados no Grande Porto (Porto e Gaia).

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