Investidor avalia litigância após exclusão de bolsa da Reditus. “Favorece o infrator”

A Carisvalor, um dos acionistas da Reditus com uma posição relevante no capital, vai esperar pela divulgação das contas do ano passado para decidir que ações vai tomar, após a exclusão de bolsa.

A sociedade Carisvalor, que detém perto de 5% do capital da Inapa e está a mover dois processos judiciais na sequência da insolvência, é também acionista da Reditus, a tecnológica portuguesa excluída da bolsa de Lisboa esta segunda-feira, dia 16 de setembro, por decisão da Euronext Lisbon devido ao incumprimento de regras. À espera de conhecer os resultados de 2023, o acionista vai avaliar as suas opções e admite um processo de litigância, uma vez que a saída de bolsa penaliza a participação na empresa.

A exclusão de bolsa “parece favorecer o infrator”, atira o representante da sociedade Carisvalor, em declarações exclusivas ao ECO. “Que outra forma tão simples [existe] de tirar uma empresa de bolsa” através das ações da gestão da empresa, que atrasou de forma sucessiva a divulgação de resultados, questiona.

O acionista reconhece – ao contrário do que aconteceu na Inapa, onde foi surpreendido com a notícia da falência da empresa a um domingo – que no caso da Reditus está consciente dos riscos do investimento e até tem vindo a reforçar a posição após a divulgação dos resultados de 2022. E, acrescenta, que, para já, está a “dar o benefício da dúvida” à empresa, que apresentou um conjunto de resultados que agradou à sociedade.

A empresa liderada por José-Louis Pagés (na foto), divulgou no passado dia 21 de agosto que registou um lucro de 8,7 milhões de euros em 2022, que é mais do triplo do resultado positivo de 2,7 milhões de euros um ano antes.

Estes são os últimos indicadores financeiros conhecidos da empresa, que foram reportados após sucessivos atrasos e reagendamentos. Sem indicar uma data precisa sobre quando poderá apresentar as contas do primeiro semestre de 2023, a tecnológica propõe mostrar estes números até 60 dias após os resultados de 2022. Ou seja, até 21 de outubro.

O incumprimento na divulgação de informação financeira ao mercado esteve na origem da exclusão do mercado de capitais. Numa decisão comunicada à empresa no passado dia 11 de julho e divulgada ao mercado um dia depois, a gestora da bolsa de Lisboa informou a Reditus da exclusão do mercado com efeitos no dia 16 de setembro. As ações negociaram na bolsa pela última vez na última sexta-feira, tendo abandonado o mercado a valer 3,6 cêntimos por ação.

“A Euronext tomou a decisão de excluir a Reditus do mercado Euronext Lisbon após uma avaliação cuidadosa do seu incumprimento das regras do mercado a que está sujeita”, explicou fonte oficial da gestora da bolsa portuguesa ao ECO. Segundo a Euronext, “os acionistas tinham acesso limitado à informação financeira da empresa, devido à ausência de relatórios anuais auditados nos últimos anos; as ações da empresa estavam no Penalty Bench há mais de 36 meses (passaram para este compartimento em Julho de 2021); e a empresa continuava a não cumprir as obrigações regulamentares (Regra 61005/1)”, justifica.

A Regra 61005/1 da Euronext prevê a possibilidade de a gestora remover valores mobiliários listados nos seus mercados por sua própria iniciativa com base em qualquer motivo apropriado, incluindo situações em que exista o incumprimento manifesto do Emitente em relação às obrigações impostas e aos requisitos estabelecidos nas regras ou no Formulário de Aplicação.

“Estar cotado significa privilegiar a transparência para que os investidores tenham informação para tomarem as suas decisões de investimento adequadamente”, aponta fonte oficial da bolsa portuguesa, acrescentando que, “quando uma emitente não cumpre esses deveres de informação, é avisada, e, caso não corrija, é colocada no penalty bench para que os investidores percebam que a empresa não está a prestar a informação a que é obrigada, havendo um acesso limitado à informação financeira da empresa”, o que aconteceu com a Reditus em 2021.

Os acionistas com participações mais reduzidas ficam com as mãos atadas com exclusão de bolsa.

Carisvalor

Três anos após estar “sob aviso” da Euronext e sem regularizar a situação, a Euronext decidiu avançar com a penalização mais grave: a exclusão. Os investidores com ações da empresa mantêm os seus títulos e podem negociá-los fora do mercado, mas veem o valor das suas posições desvalorizadas, devido à empresa já não estar cotada e não ser líquida.

Os acionistas com participações mais reduzidas ficam com as mãos atadas“, admite o representante da Carisvalor. Apesar de todos os riscos associados ao investimento, a sociedade mantém uma “boa perspetiva” para a sua participação. “Os resultados apresentados são bastante animadores, para quem acompanha a empresa“, aponta, reconhecendo algumas preocupações associadas à ausência de informação: “é uma empresa muito pouco transparente”.

Para Octávio Viana, presidente da Associação de Investidores e Analistas Técnicos do Mercado de Capitais (ATM), uma vez que a expulsão do mercado “resultou de um comportamento da gestão”, ao não divulgar contas e adiar sucessivamente as datas indicativas de reporte da informação financeira, os investidores podem agir judicialmente contra a gestão: “Causou prejuízo aos acionistas e por isso pode ser responsabilizada, podem avançar contra a gestão.”

A situação da Reditus tem estado também a ser acompanhada pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), que “no âmbito das suas competências de supervisão, acompanha os processos de exclusão de sociedades cotadas, mesmo que essa exclusão resulte de decisão da entidade gestora do mercado“, adiantou fonte oficial do regulador ao ECO.

Exclusão de negociação não elimina, nos termos do Código dos Valores Mobiliários, a responsabilidade da sociedade pelo eventual incumprimento de deveres (de prestação de informação ao mercado ou outros) ocorrido durante o período em que era emitente cotado (…) o incumprimento de deveres de prestação de informação pode gerar o apuramento de responsabilidades contraordenacionais.

CMVM

“A exclusão de negociação não elimina, nos termos do Código dos Valores Mobiliários, a responsabilidade da sociedade pelo eventual incumprimento de deveres (de prestação de informação ao mercado ou outros) ocorrido durante o período em que era emitente cotado”, explica ainda a mesma fonte.

A CMVM reforça ainda que o Código dos Valores Mobiliários prevê que “o incumprimento de deveres de prestação de informação pode gerar o apuramento de responsabilidades contraordenacionais“, ainda que não se possa pronunciar sobre “medidas de supervisão ou sancionatórias concretas em curso em relação a qualquer entidade sob sua supervisão.”

Exclusão por incumprimento sem contrapartida

Ao contrário dos casos em que o pedido de perda de qualidade de sociedade aberta é voluntário, como aconteceu com várias empresas na bolsa portuguesa nos últimos anos, na Reditus a exclusão foi imposta pela Euronext, deixando os investidores sem direito a uma contrapartida.

“A obrigação de aquisição das participações dos acionistas que não votem a favor a exclusão de mercado apenas se aplica a exclusões voluntárias, ou seja, por iniciativa da própria sociedade cotada, após uma Assembleia Geral (251.º-F do Código dos Valores Mobiliários). Significa isto que, quando a exclusão é determinada pela Euronext Lisbon, por incumprimento de regras do mercado aplicáveis aos emitentes cotados, essa obrigação não se aplica”, explica fonte da CMVM.

Esta posição do regulador vem confirmar aquela que era a visão de juristas e do mercado em relação a este caso. Octávio Viana, o representante da associação de pequenos investidores, reconhece que “não há ninguém a quem exigir essa contrapartida. Não há a quem imputar, porque a perda de qualidade de sociedade aberta não resultou de nenhuma alteração pedida pelo acionista”, ainda que “a perda de sociedade aberta representa uma perda grande para os acionistas.”

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