BRANDS' ECO Qualidade, especialização e valor acrescentado são essenciais para exportar
Oportunidades e desafios, e a experiência de quem já faz negócios com países como Japão, França, Estados Unidos e Brasil estiveram em debate na 4ª edição da Expo Fish.
Portugal tem o maior consumo de pescado per capita da União Europeia (EU) – 59 quilos por habitante -, três vezes superior à média dos 27 estados-membros, mas as capturas em águas nacionais apenas satisfazem 29% das necessidades. Ainda assim, a exportação de pescado fresco e congelado tem crescido ao longo das últimas décadas, e os players do setor acreditam que o potencial exportador do país está longe de estar esgotado. No entanto, defendem, “é preciso fazê-lo com valor acrescentado”.
“Temos que unir esforços para fazer coisas diferentes”, alertou Manuel Tarré na abertura da 4ª edição da Expo Fish. Para o presidente da ALIF (Associação Nacional da Indústria pelo Frio e Comércio de Produtos Alimentares), que, na sua apresentação elencou um conjunto de desafios globais para o setor do pescado, entre os quais a redução global da quantidade de peixe no mar, disse ainda que Portugal tem a possibilidade de tirar partido da inovação ao serviço dos produtos com origem no mar. Ao nível da sustentabilidade, exemplifica, “é também possível melhorar muito, reduzindo a pegada de carbono do setor, e introduzindo uma maior circularidade na vertente industrial”.
Japão absorve 90% das exportações de pescado fresco
Em 2022, Portugal exportou 5,78 milhões de euros de pescado com destino ao Japão, um mercado que, de acordo com Miguel Garcia, absorve 90% do pescado fresco português. No entanto, e apesar do potencial de crescimento do produto nacional naquele mercado, o diretor da delegação do AICEP (Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal) no Japão, alerta para as suas especificidades. “O mercado japonês requer investimento e planeamento a longo prazo, tem processos de decisão lentos porque precisa de criar confiança nos fornecedores”. Ainda assim, o responsável pelo AICEP, recomenda que o primeiro passo seja a criação de parcerias, cujo contacto poderá ser iniciado com a ajuda daquela agência, nomeadamente através de missões japonesas a Portugal, por exemplo.
“O mercado japonês precisa de tempo, de namoro”, acrescenta Bernardo Amaral. O responsável pelo Pavilhão de Portugal na Expo Japão 2025 relembra, contudo, a relação de excelência entre os dois países, com mais de cinco séculos, o que reforça a confiança de que os empresários japoneses necessitam. Um dos objetivos de Portugal na Expo Japão é, garante, “dar a conhecer ainda melhor o que o nosso país pode oferecer”.

Este evento, que decorre entre abril e outubro do próximo ano, é “uma grande oportunidade de levar ao Japão o que de melhor se faz em Portugal no setor do pescado”, defende Sérgio Faias. O presidente do Conselho de Administração da Docapesca recorda o nível de exigência dos japoneses, que valorizam a qualidade, e reforça a importância de olhar para a Expo Japão como “uma porta de entrada e uma montra para mostrar a qualidade dos produtos portugueses”.
França: “se não tivermos produtos de qualidade não entramos no mercado”
O mercado francês é o maior consumidor de ostras do mundo, o que gera oportunidades para os produtores nacionais, como refere Francisco Avelelas. O presidente da Associação Portuguesa de Aquacultores alerta, contudo, para a importância da qualidade. “Se não tivermos produtos de qualidade não entramos no mercado”, afirma, salientando igualmente o peso de uma boa comunicação e de uma imagem de prestígio. O responsável fala com conhecimento, uma vez que, durante vários anos, os produtores de ostra nacional dependeram do mercado francês para escoar o seu produto. Hoje, revela, “a ostra portuguesa tem muito boa aceitação nos Países Baixos, Bélgica e Alemanha”. “Há um grande mercado a conquistar em França”, acrescenta José Gomes de Sá, apesar de reconhecer as dificuldades. Contudo, salienta o CEO da Lusopress, “é preciso promoção e persistência porque a qualidade faz o resto”.
"Há muitas oportunidades, desde que estejamos presentes em eventos e feiras”
Despertar a curiosidade com os produtos da Madeira em França é a meta de José Ornelas. Contudo, o CEO da Ilha Peixe, reconhece que existem algumas dificuldades logísticas que ainda é preciso ultrapassar. Para começar, a empresa madeirense estabeleceu parceria com uma empresa de pescado fresco e congelado, mas, defende o responsável, “há muitas oportunidades, desde que estejamos presentes em eventos e feiras”. Já José Correia, que trabalha há 40 anos com o mercado francês, sente uma dificuldade inversa. “Há pouco peixe para exportar em Portugal porque é consumido localmente”.
Espanha: “é um mercado ibérico diário”
Com presença em todos os portos de pesca espanhóis, a Gialmar vê o mercado do país vizinho como fundamental para o negócio da empresa, de raiz familiar, e que ali representa a sua marca há 32 anos. “É um mercado ibérico diário”, diz Bruno Coimbra, administrador da Gialmar que acrescenta: “com muito potencial de crescimento e dinâmica, e interessante para as empresas nacionais”.
"Devemos apostar em iniciativas comuns ibéricas para promover o consumo de peixe, por exemplo, junto dos mais jovens, que têm menos esse hábito”
Pedro Barraco, diretor da Cadeia Agroalimentar da Mercadona, reconhece igualmente o potencial do mercado ibérico. A Mercadona compra bacalhau para as lojas nacionais, algo inédito até à entrada em Portugal, visto que em Espanha não existe este consumo, embora seja vendido em 2 lojas na Galiza perto da fronteira. Também o consumo de conservas é diferente nos dois mercados visto que em Portugal se vende mais atum do que em Espanha. O diretor da Cadeia Agroalimentar aponta a importância de uma visão ibérica ao relembrar o investimento de 200 milhões de euros numa plataforma logística em Portugal. Uma perspetiva semelhante à de Júlia Moreno, representante da Asociación de Empresarios Mayoristas de Pescados de Madrid. “Podemos e devemos reforçar os laços e as sinergias entre os dois países”, defende, recordando que em Espanha vende-se muito rodovalho português e muito peixe selvagem, também de águas nacionais. “Devemos apostar em iniciativas comuns ibéricas para promover o consumo de peixe, por exemplo, junto dos mais jovens, que têm menos esse hábito”.
Espanha é também um mercado importante e interessante para as conservas A Poveira que, como refere, Sofia Brandão, hoje exporta cerca de 70% da sua produção. A responsável pelos mercados externos de A Poveira (Grupo Finsa) revela que em 2023 a empresa faturou 125 milhões de euros fora de Portugal, maioritariamente em contexto europeu. “A Minerva é a marca para a internacionalização e muito bem aceite fora”, reforça.
Brasil e Estados Unidos são mercados preferenciais
Apesar de atualmente o Brasil não poder exportar pescado para a Europa é, ainda assim, um grande importador do pescado fresco e congelado nacional. “As pessoas gostam da gastronomia e dos produtos portugueses”, afirma Sílvio Carlos, representante da Secretaria do Desenvolvimento Económico do Ceará. No entanto, assegura, “é muito importante que o Brasil também possa exportar para a Europa”. Uma opinião partilhada por Arimar Filho, da Produmar, empresa que exporta 95% de atum para sushi e sashimi. “Desde 2018 que exportações do Brasil para a Europa estão barradas por questões políticas, e é preciso mudar isso”.
Em sentido inverso, as exportações portuguesas para o Brasil e para outros mercados da América Latina contam com grandes oportunidades, na opinião de Miguel Marques, Blue Economy International Advisor. “Há, na América Latina, uma muito baixa agregação de valor neste setor e Portugal possui esse grande ativo de agregar valor e deve tirar partido disso”, sublinha.
Já nos Estados Unidos, o reconhecimento da marca Portugal tem crescido ao longo da última década, muito por força do turismo norte-americano em terras lusas. Joshua Scherz, importador americano de conservas portuguesas, através da Bela Brand Seafood, reconhece que a aceitação dos produtos nacionais começou por ser desafiante, mas que hoje é fácil porque “a sardinha portuguesa é reconhecida pela sua qualidade e é simples contar a história de Portugal pela comida”. Nos últimos quatro anos, salienta, o consumo de comida enlatada cresceu 8% nos Estados Unidos, com o pescado a dominar. “O mercado da cavala e dos patês também está a crescer muito”, diz.
"Portugal tem um grande potencial de crescimento”
Carlos Moura, coordenador do AICEP nos Estado Unidos, sublinha as oportunidades que os produtores nacionais podem explorar. O país é o maior importador de pescado do mundo e aqui “Portugal tem um grande potencial de crescimento”. O responsável sugere aos produtores nacionais que participem em mais eventos do outro lado do Atlântico, e que estabeleçam parcerias locais.
O custo do transporte é hoje, e na perspetiva de Luís Silvério, da empresa exportadora Luís Silvério & Filhos, um dos maiores obstáculos às vendas para o mercado norte-americano. Exportador de peixe fresco nacional, há quatro décadas, para Nova Jérsia revela que já vendeu mais do qua agora “porque os aviões eram maiores e diretos”. Está, atualmente, a expandir o negócio para Boston, com o objetivo de cativar o ‘mercado da saudade’, mas “é impossível ter um preço baixo devido aos custos logísticos”, lamenta.
A marca ‘O fantástico mundo das sardinhas’, da empresa Valor do Tempo, um projeto dirigido por Tiago Quaresma, chegou há cerca de um ano e meio ao mercado norte-americano, através da abertura de uma loja em Time Square. A aventura, revela, tem sido “muito boa” não apenas nas vendas da loja física, mas sobretudo no e-commerce que será, como revela, “a grande aposta” em terras do Tio Sam. “Portugal tem um património reputacional enorme que não estava a ser aproveitado”, salienta. Para o futuro estão previstas mais três ou quatro lojas que sirvam, essencialmente, de âncora para as vendas online.

Em jeito de resumo e conclusão, um painel composto por Manuel Tarré, Rodrigo Souza (Associação Nacional dos Industriais de Conservas de Peixe), Paulo Mónica (Associação dos Industriais do Bacalhau), Francisco Avelelas, e João Zorrinho (AICEP), deixou algumas importantes mensagens à plateia e aos players do setor. “Temos que ser exigentes, mudar mentalidades e focar na excelência”, disse Francisco Avelelas. “Precisamos de pessoas que façam a diferença”, acrescentou Manuel Tarré referindo-se aos líderes que é preciso “que saibam o que fazem e que compreendam o mercado”. Além disso, é fundamental comunicar, mostrar o que vale o país, estar nos sítios certos e acrescentar valor. O sucesso, esse, surgirá naturalmente.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Qualidade, especialização e valor acrescentado são essenciais para exportar
{{ noCommentsLabel }}