Pilotos acusam gestão da TAP de “fechar a porta ao diálogo” antes da privatização
"Está à vista de todos que há uma intervenção política na TAP", afirma a nova direção do sindicato dos pilotos, que acusa a gestão de estar a "empurrar" os profissionais para "quebrar a paz social".
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A nova direção do Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (SPAC) acusa a comissão executiva da TAP de ter mudado de atitude em relação ao diálogo sobre as condições dos trabalhadores, depois da chegada do novo Governo e com o aproximar do processo de privatização. Seja qual for a percentagem da companhia a ser vendida, a gestão deve ser independente e livre de pressões políticas, defende.
Hélder Santinhos preside ao SPAC desde julho de 2024, depois da lista que encabeçava ter vencido as eleições realizadas no mês anterior, na sequência da demissão antecipada da direção liderada por Tiago Farias Lopes. Sete meses depois, a nova liderança, que inclui ainda Frederico Saraiva de Almeida (vice-presidente), Nuno Esteves de Matos, João Lira Abreu e Bruno Batista, decidiu divulgar publicamente as preocupações e prioridades do sindicato.
“Notamos uma diferença na postura desta comissão executiva depois de haver eleições. Antes havia uma grande preocupação com a paz social e neste momento encontramos uma porta fechada. Deixou de haver abertura para o diálogo“, afirmou Hélder Santinhos num encontro com jornalistas, esta segunda-feira, na sede do SPAC. “A decisões são apresentadas como já tomadas pela gestão”, lamentou.
Foi dado o exemplo da alteração no valor das ajudas de custo — já criticada também pelo Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC) — sem qualquer diálogo prévio com os pilotos, ou o facto de a gestão da TAP apontar a via judicial para questões laborais particulares, quando anteriormente havia disponibilidade para soluções com base no diálogo. O SPAC tem, neste momento, vários processos a correr em tribunal contra a TAP.
Uma mudança de atitude que a direção do sindicato diz estar “abraçada à janela da privatização e ser fruto de um twist político”. Ainda assim, como em qualquer processo de privatização, à medida que o processo se aproxima diminui a margem para novos compromissos laborais.
A insatisfação com a gestão levou o SNPVAC a declarar o fim da paz social na companhia aérea, no dia 13 de fevereiro. Uma hipótese que os pilotos não afastam. “Nós sentimos que estamos a ser empurrados para quebrar a paz social. O SPAC não quer quebrar a paz social, mas representamos na TAP 1.200 pilotos e a nossa obrigação é representar a vontade dos associados. Se o caminho continuara a ser esse, podemos ter de quebrar a paz social. Se calhar não seria a altura ideal, tendo em conta a privatização, mas se for necessário…”, diz Hélder Santinhos. O presidente do sindicato disse ainda que foi pedida uma reunião ao ministro das Infraestruturas e Habitação, Miguel Pinto Luz, mas que não foi ainda marcada por falta de agenda.
Para o SPAC, o pré-aviso de greve a tempo parcial para os dias 12 a 27 de março emitido pelo Sindicato Independente de Pilotos de Linhas Aéreas (SIPLA), que representa a maioria dos pilotos da Portugália, também resulta da indisponibilidade para o diálogo da gestão da TAP.
“Era importante a comissão executiva da TAP deixasse estas questões de lado. Quem tem de se entender sobre a privatização é o PS e o PSD. São os partidos que face ao atual cenário vão decidir e a comissão executiva devia deixar o processo decorrer normalmente”, considera Hélder Santinhos.
Privatização tem de assegurar gestão independente
A liderança do SPAC diz-se neutral em relação à venda da TAP a privados. “Em relação à privatização estamos neutrais, não temos ideologia a favor ou conta”, garante Hélder Santinhos. Mas o sindicato estará vigilante em relação ao processo e quer que o comprador cumpra três condições: ter idoneidade financeira, idoneidade técnica e um histórico de idoneidade na relação com os trabalhadores, enumera o vice-presidente do SPAC. “Se considerarmos que existe algum perigo ou alguma coisa que não esteja adequada nas condições de trabalho iremos denunciar”, diz o presidente.
Para Hélder Santinhos se é vendida a maioria ou minoria do capital “não é tema”, o importante é que a gestão tenha autonomia. “Da experiência que temos, está mais do que evidenciado que comissões executivas nomeadas por políticos não são boas para nós. Um dos melhores períodos para a companhia e pilotos foi durante gestão privada”, afirmou. “O Governo tem de assegurar que, independentemente da posição do Estado que for vendida, a gestão é independente”, defendeu.
A direção do SPAC não se quis pronunciar sobre os interessados na TAP já conhecidos — Grupo IAG, Lufthansa e Air France- KLM — mas disse que está já em contacto com os sindicatos destas companhias para recolher informação.
O SPAC está também a acompanhar a privatização da SATA, deixando elogios à gestão. “A administração da SATA está a fazer tudo o possível para melhorar a empresa. Vemos um grande esforço e legítimo para melhorar as condições da empresa”, afirmou o presidente do sindicato. Questionado sobre a possibilidade da TAP vir a ter um papel no processo, caso a companhia não seja vendida até ao final deste ano como prevê o acordo de reestruturação, Helder Santinhos considerou que “o poder político devia fazer reflexão sobre se faz sentido para um país desta dimensão ter uma TAP, uma Portugália e uma SATA. A tendência é para uma consolidação no setor”.
Pagamento antecipado de 60 milhões merece críticas
O presidente do SPAC disse que o sindicato quer “garantir a defesa de todos os pilotos independentemente das companhias ou cargos”. E. quis deixar claro que os salários adiantados que os pilotos receberam em contrapartida pela revisão do Regulamento do Recurso à Contratação Externa (RRCE), no valor de 60 milhões, foram um mau negócio para estes profissionais.
Obrigada a pagar aos pilotos sempre sempre que a contratação de companhias externas excedesse 8% das horas totais de voo, entre elas a Portugália, a TAP pediu que a cláusula fosse alterada para um limite de 20% (no ano passado estes serviços pesaram 17,6%). Em contrapartida foram pagos seis salários base, que segundo o SPAC não abrangeram todos os pilotos.
“Esses salários foram um adiantamento pela perda de rendimento futuro. Alguns pilotos consideraram que essa perda é superior aos seis salários”, refere o presidente do SPAC. “Para um piloto que ainda vá voar 20 ou 30 anos há uma perda de dinheiro”, acrescenta João Lira Abreu.
Segundo a nova direção, foram as divergências sobre este acordo celebrado com a TAP em março de 2024 que levaram à queda da anterior.
Sobre a negociação de um novo Acordo de Empresa, o que poderá acontecer a partir de 2026, o SPAC diz que não irá denunciar o atual. Só se a TAP o fizer é que existirão negociações.
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