Astuce denuncia que os doentes com glioblastoma “estão a lutar contra o relógio para receber um tratamento que lhes permita prolongar a sua sobrevivência”.
De acordo com a Associação Espanhola de Pessoas Afectadas por Tumores Cerebrais (Astuce), o glioblastoma é o tumor cerebral mais agressivo e de pior prognóstico.
A Associação Espanhola de Pessoas Afectadas por Tumores Cerebrais (Astuce) denunciou, esta quarta-feira, a grave desigualdade no acesso aos TTFields (terapia por campos eléctricos) entre as diferentes comunidades autónomas para os doentes com glioblastoma, uma situação que obriga os familiares destes doentes a “lutar contra o relógio para obter um tratamento que prolongaria a sua sobrevivência e que lhes seria prescrito se vivessem noutras regiões”.
De acordo com Astuce, o glioblastoma é o tumor cerebral mais agressivo e de pior prognóstico, com um tempo médio de sobrevivência de apenas 14,6 meses com o tratamento padrão, que combina cirurgia, radioterapia e quimioterapia com temozolomida. Apesar deste prognóstico, o padrão de tratamento permaneceu estático em Espanha durante mais de duas décadas.
No entanto, nos últimos anos, os estudos clínicos demonstraram que a utilização de TTFields, um dispositivo que emite campos eléctricos para travar a proliferação das células cancerígenas, pode aumentar significativamente a sobrevivência quando combinado com quimioterapia de manutenção. De facto, as diretrizes internacionais (NCCN) e nacionais, incluindo as da Sociedade Espanhola de Oncologia Médica (SEOM) e do Grupo Espanhol de Investigação em Neuro-oncologia (Geino), recomendam a incorporação de TTFields como parte do padrão de tratamento para o glioblastoma recém-diagnosticado.
Como salienta o presidente nacional da Astuce, José Luis Mantas, “enquanto em países como a Alemanha, França, Japão ou Estados Unidos, os TTFields são o padrão de tratamento, em Espanha os pacientes só podem aceder a esta terapia em algumas comunidades autónomas”. “Noutras é negado, obrigando as famílias a pagar o tratamento do seu próprio bolso, se tiverem meios para o fazer, ou mesmo a deslocarem-se para outra região”, acrescenta.
Concretamente, os centros da Catalunha, Madrid, Galiza, Aragão e Castilla la Mancha começaram a incorporar este tratamento nos seus hospitais, mas em regiões como a Andaluzia, o País Basco e Múrcia a terapia ainda não está disponível, deixando os doentes numa situação vulnerável.
“Esta disparidade é inaceitável. Todos os doentes têm o mesmo direito de aceder a tratamentos inovadores que podem prolongar a sua sobrevivência, independentemente do local onde vivem”, afirma Mantas, acrescentando que ‘sabemos de famílias de doentes que lutam pelo tratamento com TTFields em toda a Espanha’.
Casos
Um desses casos é precisamente o de Sonia – nome fictício, pois prefere não dar o seu nome verdadeiro -, em Múrcia, que denuncia uma corrida de obstáculos para que a sua irmã de 67 anos, diagnosticada em outubro com glioblastoma, tenha acesso a este tratamento. Para Sónia, é lamentável sentir que não lhe são dadas todas as informações necessárias por parte dos profissionais de saúde, bem como a sensação de impotência ao deparar-se com inúmeros obstáculos para aceder à terapia. “Estamos felizes agora porque a minha irmã já está a fazer tratamento com TTFields, mas e se ela não tivesse a sua família para tomar todas as medidas necessárias para o conseguir”, lamenta, recordando o grau de dependência em que os doentes com glioblastoma caem rapidamente.
Na Andaluzia, histórias como a de Carlos, 46 anos, de Málaga, ou de Maria, 65 anos, de Córdova, põem em evidência o desespero de muitas famílias. Embora os seus médicos reconheçam os benefícios dos TTFields, “os hospitais da Andaluzia não os podem prescrever porque o tratamento não está incluído na carteira de serviços do Serviço Andaluz de Saúde (SAS)”. “Disseram-nos que, mesmo que assinassem o pedido, o governo andaluz rejeitá-lo-ia por ser demasiado caro”, explica Inma, a mulher de Carlos.
Situações semelhantes ocorrem no País Basco e um exemplo é o da mãe de Ander, que teve de se mudar para Madrid e pagar os tratamentos numa clínica privada. Ander reclamou o custo total do tratamento à Osakidetza, uma vez que se trata de uma terapia que outras comunidades oferecem no seu sistema público de saúde. “Não podemos permitir que o local de residência determine a esperança de vida de um doente com glioblastoma”, afirma.
Um direito protegido por lei
Astuce insiste que a recusa de algumas comunidades em fornecer TTFields poderia constituir uma violação do direito à equidade na saúde, tal como estabelecido pela Lei Geral da Saúde (Lei 14/1986) e pela Lei de Coesão e Qualidade do Sistema Nacional de Saúde (Lei 16/2003). Ambas as leis garantem que todos os cidadãos devem ter igual acesso aos avanços terapêuticos disponíveis no país.
A Associação Astuce solicitou formalmente ao governo regional da Andaluzia que reconsiderasse a sua posição e facilitasse o acesso aos campos de TT através do seu sistema de saúde e planeia fazer o mesmo no País Basco e noutras regiões. Concretamente, numa carta dirigida à Comissão Central de Produtos e Tecnologias Sanitárias do SAS, a Astuce exige que “seja garantida a igualdade de acesso a tratamentos inovadores apoiados pela comunidade médica e científica, como os TTFields, que já estão a ser utilizados noutras regiões de Espanha e em países vizinhos”.
Entretanto, as famílias afectadas continuam a sua luta através de queixas institucionais e de apelos aos meios de comunicação social. “Não estamos a pedir um privilégio, mas um direito. Não podemos permitir que as decisões económicas ditem quem vive e quem não vive”, conclui o porta-voz da Astuce.
Desde a sua criação, a Astuce tem colocado em cima da mesa a necessidade de mais ensaios clínicos e de equidade não só no acesso ao tratamento, mas também na investigação, com o objetivo de os doentes terem acesso a terapias que possam mudar a sua esperança e a sua qualidade de vida. Para a associação é “fundamental dar visibilidade aos tumores cerebrais, ainda considerados uma minoria, e promover a investigação sobre eles, para o que organiza e desenvolve conferências de estudo, análise e atualização”.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Astuce denuncia que os doentes com glioblastoma “estão a lutar contra o relógio para receber um tratamento que lhes permita prolongar a sua sobrevivência”.
{{ noCommentsLabel }}