Agências de viagens receiam travão ao crescimento do mercado norte-americano
Agência Abreu admitiu registar “uma ligeira quebra de passageiros para o destino” EUA. Se a instabilidade política se mantiver, é natural que haja menos turistas portugueses nos EUA.
A Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo (APAVT) receia que a inflação e eventual recessão nos Estados Unidos (EUA), na sequência das tarifas comerciais, travem o crescimento daquele importante mercado no país.
“A espetacular dinâmica recente do mercado emissor americano para o nosso país, deve provocar-nos preocupação acrescida: inflação e eventual recessão no final do ano, nos EUA, trariam certamente alguma espécie de travão ao crescimento deste mercado, que se tem revelado tão importante junto de Portugal”, considerou o presidente da APAVT, Pedro Costa Ferreira, em resposta escrita à Lusa.
O Presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou, na semana passada, novas tarifas sobre todas as importações, com sobretaxas para os países considerados particularmente hostis ao comércio. No caso da União Europeia, as novas tarifas norte-americanas de 20% a produtos importados acrescem às de 25% sobre os setores automóvel, aço e alumínio.
A APAVT disse estar receosa das eventuais consequências desta medida, que pode acelerar a inflação e até mesmo causar depressões económicas, provocando menos consumo mundial, o que “poderia implicar, de facto, menor número de turistas a nível mundial”.
Questionado sobre se a instabilidade política nos EUA e as novas políticas de controlo de fronteiras estão a ter impacto na procura daquele destino por turistas portugueses, Pedro Costa Ferreira considerou que ainda é “cedo para comentários definitivos”, até porque “a dinâmica do mercado emissor português para os EUA implica ela própria que, nesta fase do ano, não existam reservas em número significativo”.
“Contudo, se a instabilidade política se mantiver e as políticas identitárias e antiglobalização perdurarem, é natural que venhamos a ter, este ano, menos turistas portugueses nos EUA”, realçou o presidente da APAVT. Contactada pela Lusa, a Agência Abreu, uma das principais no país, admitiu registar “uma ligeira quebra de passageiros para o destino” EUA.
“Tudo o que signifique restrição de livre circulação de pessoas e sentimento de insegurança afeta qualquer destino. Nos EUA não será diferente”, salientou a agência de viagens. A Lusa contactou outras duas principais agências de viagens do país, mas não obteve resposta até ao momento.
Em 26 de março, a vice-presidente executiva da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP), Cristina Siza Vieira, destacou a incerteza quanto à política comercial dos Estados Unidos, que terá impactos em todo o mundo, como o provável abrandamento da procura turística pelos EUA, mas que poderá ser compensada pela procura interna na Europa e outros destinos como o mercado asiático.
Turismo nos EUA passa de crescimento a queda em 2025 devido a políticas de Trump
O turismo internacional para os Estados Unidos deverá cair 9,4% em 2025 devido às políticas agressivas da administração de Donald Trump nas fronteiras, uma reversão total da expectativa anterior de crescimento de 9%.
Os dados, divulgados pela Tourism Economics, refletem a alteração da abordagem das autoridades nas fronteiras em relação a turistas com vistos temporários, desde interrogatórios mais demorados e revista de ‘smartphones’ à revogação sumária da entrada, detenção e deportação.
De acordo com o presidente da Tourism Economics, Adam Sacks, as notícias de vários turistas europeus revistados e detidos à entrada dos EUA teve um efeito significativo nos planos dos viajantes internacionais. Também o diretor do programa sem fins lucrativos American Friends Service Committee, Pedro Rios, disse à estação pública PBS que numa se viu este tipo de detenções de turistas.
“A única razão que vejo é que há uma atmosfera anti imigração muito mais fervorosa”, afirmou. O ruído mediático de algumas destas detenções – que nalguns casos chegaram a três semanas sem motivos concretos – levaram autoridades de vários países, como França, Dinamarca, Alemanha, Finlândia, Reino Unido e Canadá a avisarem os cidadãos de potenciais problemas se tentarem viajar para os Estados Unidos.
Portugal juntou-se, em 28 de março, à lista de países que atualizaram as recomendações, com advertências específicas sobre a identidade de género e para o facto de um visto não dar entrada automática.
No Canadá, em particular, as tarifas e o discurso antagónico da nova administração provocou uma quebra expressiva das viagens e reservas para os EUA. Entre março e abril, o número de passageiros em voos do Canadá para os EUA caiu 70%, segundo a firma de analítica OAG. As reservas passaram de 1,22 milhões para 296 mil em relação ao período homólogo.
A previsão para a época alta, entre abril e setembro, já está 10% abaixo de 2024, o que levou as companhias aéreas a reduzir a capacidade. Também as travessias por via terrestre sofreram: segundo as autoridades da fronteira, houve menos 500 mil canadianos a atravessarem para os EUA em fevereiro.
Só a Califórnia, que recebe anualmente cerca de 1,8 milhões de turistas canadianos, já tem previsões de perdas. A organização que promove o turismo no estado, Visit California, reviu em baixa de seis mil milhões de dólares (cerca de 5,5 mil milhões de euros) a previsão de gastos de turistas em 2025.
O Canadá é o segundo país que mais turistas envia para a Califórnia, atrás do México, e muitos estão a refrear os planos de viagem por receio do tratamento à entrada e indignação com as declarações da administração, que disse que o país se devia tornar no 51º estado dos EUA.
Nas cidades junto à fronteira, os hotéis já registam queda nas dormidas. Os dados da firma de analítica CoStar mostram quebras de 3% nos hotéis a menos de 80 quilómetros da fronteira com o México e ainda mais (-4,8%) no mesmo raio em relação à fronteira com o Canadá.
Também as tarifas impostas a 180 países estão a contribuir para os efeitos negativos na indústria do turismo, com menos turistas dispostos a passarem férias nos Estados Unidos e a gastarem dinheiro lá. No relatório da Tourism Economics, os analistas antecipam que a guerra comercial vai ter impacto, quer na procura doméstica, quer internacional.
“As viagens domésticas vão ser afetadas negativamente pelo abrandamento do crescimento dos salários e preços mais elevados, enquanto as internacionais serão atingidas por um trio de efeitos: economias a abrandar, dólar forte e antipatia em relação aos EUA”. O turismo tem um peso importante no Produto Interno Bruto (PIB) do país, superior a dois biliões de dólares por ano.
Os EUA receberam 72,4 milhões de turistas em 2024, aproximando-se dos níveis pré-pandemia, recuperação que deverá agora inverter-se. A previsão da Tourism Economics é que esse nível só aconteça em 2029, depois do fim da administração de Trump.
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