Avaliação da TAP ainda decorre. O que muda com o choque das tarifas

EY e banco Finantia ainda estão a trabalhar na avaliação para a privatização, diz o Governo. Novo contexto económico global tem impactos negativos e positivos para a companhia aérea.

A EY e o Finantia ainda prosseguem com os trabalhos de avaliação da TAP no âmbito do processo de privatização. Um trabalho que decorre agora num contexto económico muito diferente, marcado por uma intensa guerra comercial desencadeada por Trump. Quebra na procura por viagens pode penalizar a companhia aérea, mas queda do petróleo tem impacto positivo.

A consultora e o banco tinham sido selecionados pela Parpública para fazer a avaliação financeira para o processo de reprivatização da TAP lançado pelo anterior Governo. O novo relançou o processo e há cerca de seis meses pediu à EY e ao Finantia para atualizarem as contas. Um processo que ainda não está terminado.

“Os trabalhos de avaliação ainda decorrem”, respondeu ao ECO fonte oficial do Ministério das Infraestruturas sem, no entanto, esclarecer se o novo enquadramento económico vai ser considerado nos valores que vão ser entregues. A resposta foi dada ainda antes de Donald Trump na quarta-feira ter anunciado uma pausa de 90 dias nas tarifas, mantendo durante esse período de negociação tarifas reciprocas de 10% para 75 países.

O setor da aviação não foi poupado à forte queda das bolsas desencadeada pelo aumento global de tarifas anunciado por Donald Trump a 2 de abril e posteriores ações retaliatórias, mas apresentaram um desempenho bem melhor do que a generalidade do mercado.

As tarifas aduaneiras não se aplicam às passagens aéreas, mas há um impacto indireto que pode ser relevante. “Um ambiente de maior incerteza e receio quanto à evolução da economia global poderá levar a uma redução na procura de viagens, especialmente no segmento de negócios”, assinala ao ECO Nuno Esteves, analista financeiro que acompanha o setor.

Com a ampla incerteza global, o crescimento estagnou.

Ed Bastian

CEO da Delta Airlines

O CEO da Delta Airlines, Ed Bastian, assinalou esta quarta-feira na apresentação resultados do primeiro trimestre que “com a ampla incerteza global, o crescimento estagnou”. Para se proteger deste novo contexto de travagem da economia, a companhia aérea americana vai reduzir a oferta de voos planeada para a segunda metade do ano, que será afinal igual à de 2024, e irá “gerir ativamente” os custos e o investimento, anunciou. “Estamos a agir como se fossemos para uma recessão”, disse ao canal americano CNBC. O CEO da Air France – KLM reconheceu à mesma estação que estão a “registar uma ligeira quebra na classe económica” nos voos para os EUA.

Para a TAP, “uma eventual recessão nos EUA, aliada a uma depreciação do dólar, poderá traduzir-se num menor número de visitantes norte-americanos e numa redução da receita gerada por este mercado”, refere Nuno Esteves. A América do Norte foi responsável por 19,4% das receitas de 4.231 milhões conseguidas pela companhia aérea no ano passado.

Para 2025, a transportadora portuguesa antecipa um aumento de 2,8% na oferta de lugares e de 3% no número de passageiros neste mercado. Em resposta à agência Lusa, a TAP afirmou continuar confiante no sucesso das rotas que opera” para os EUA. “A melhor prova dessa confiança é que vai iniciar nos próximos três meses, três novas rotas, a saber, Lisboa/Los Angeles, Porto/Boston e Terceira/São Francisco”.

No reverso da moeda também há boas notícias para a TAP. Se em 2024 os resultados foram penalizados pela desvalorização do euro contra o dólar, nas últimas semanas tem acontecido o inverso. Depois de quase ter chegado à paridade, o euro transaciona agora na casa dos 1,10 dólares. “A apreciação do euro face ao dólar em 2025 (+5,91%) vai permitir uma menor fatura anual com o custo dos leasings (financeiros e operacionais) que em 2024 totalizavam os 2.037 milhões em moeda norte-americana, e tiveram um custo de 569 milhões de euros”, refere Nuno Esteves.

A cotação do barril (Brent) desce cerca de 20% desde o dia 2 de abril, o que se reflete no preço do jet fuel, a principal rubrica de custos da companhia aérea. “A TAP SA irá conseguir poupar aproximadamente 72,2 milhões de euros por cada diminuição de 10% no preço do jet fuel em 2025, considerando um nível de cobertura (hedging) de 31% e um nível de atividade em linha com o ano anterior”, estima o analista financeiro.

Apesar dos desafios atuais — nomeadamente a potencial perturbação do mercado norte-americano e a instabilidade no espaço europeu —, a TAP aparenta ter capacidade para gerir esta fase de uma forma relativamente controlada.

Nuno Esteves

Analista financeiro

“Apesar dos desafios atuais — nomeadamente a potencial perturbação do mercado norte-americano e a instabilidade no espaço europeu —, a TAP aparenta ter capacidade para gerir esta fase de uma forma relativamente controlada“, considera Nuno Esteves, que aponta a estabilidade laboral, a frota moderna, a forte presença no mercado brasileiro e o perfil de dívida como fatores favoráveis à companhia portuguesa.

Com a queda do Governo a privatização da TAP foi suspensa, embora os preparativos não tenham sido interrompidos. O Ministro das Infraestruturas, Miguel Pinto Luz, afirmou há duas semanas que o “trabalho de backoffice” para a venda da companhia aérea “continua a ser feito e será vertido para a pasta de transição”. A avaliação é um dos passos obrigatórios.

Nuno Esteves considera que “o facto de existirem atualmente três concorrentes europeus com uma elevada capacidade financeira, com know-how do setor e projetos estruturados que acrescentam valor ao país em setores da economia de elevado capital humano e tecnológico, vai permitir potenciar o preço de venda da TAP, com uma expectável recuperação dos valores injetados na empresa durante a pandemia”.

O analista financeiro avalia a TAP entre 1.720 e 1.745 milhões de euros, “recorrendo ao método dos cash-flows descontados e com base numa perspetiva prudente, ancorada nas quatro últimas transações e avaliações relevantes do setor — com destaque para a ITA Airways”. “Num espaço europeu onde cinco companhias aéreas detêm 76% da quota de mercado, manter a TAP isolada representa um risco elevado para o seu desempenho operacional e estratégico”, alerta.

O ECO questionou o Governo, o Grupo IAG e a Air France – KLM sobre o impacto que o atual contexto poderá ter na privatização da companhia aérea e todos preferiram não comentar.

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