Exclusivo Ex-governante critica mudanças na Microsoft. “Decisão carece de alinhamento com a história”
André de Aragão Azevedo, ex-governante com a Transição Digital, critica integração de operação portuguesa num grupo que inclui a Albânia, Malta e Chipre. Em carta aberta, pede reavaliação da decisão.
A notícia, avançada pelo ECO em primeira mão, foi uma surpresa: A partir de 1 de julho, a Microsoft Portugal passará a integrar um amplo cluster denominado “South MCC” na área da “Europa do Sul, que incluirá países como Chipre, Malta e Albânia, uma opção que, internamente, é considerada um desinvestimento e uma perda de autonomia da companhia. Em carta aberta, dirigida ao presidente da Região Sul da Microsoft, o antigo governante André de Aragão Azevedo, pede uma reavaliação desta decisão, integrando Portugal num cluster ibérico ou num grupo “mais coerente, ao lado de países como Itália, Espanha e Israel“.
“Foi com surpresa e perplexidade que tomei conhecimento, através da comunicação social [no ECO], da decisão da organização que agora lidera, de integrar Portugal num novo cluster regional designado “South MCC”.
Uma decisão que considero carecer de alinhamento com a história, o impacto e a relevância de Portugal no percurso da Microsoft, que pude testemunhar pessoalmente ao longo de 12 anos“, escreve o gestor, que trabalhou na Microsoft antes e depois das funções como secretário de Estado da Transição Digital no governo de Costa, numa carta aberta a Charles Calestroupat.
Segundo um email interno a que o ECO teve acesso, a partir de 1 de julho, a Microsoft Portugal passará a integrar um amplo cluster denominado “South MCC” na área da “Europa do Sul, que incluirá também países como Turquia, Grécia, Chipre, Malta, Albânia, Bósnia, Eslovénia, Sérvia, Macedónia do Norte, Montenegro, Kosovo, Croácia e Bulgária. Segundo indicações da Microsoft, esta reorganização enquadra-se numa estratégia global da tecnológica para o ano fiscal de 2026. No documento interno, a empresa destaca que tem três grandes pilares organizacionais para apoiar a sua estratégia de crescimento: “Evolução das nossas Áreas de Solução, Aceleração da Competência Regional em Escala e Alinhamento das nossas equipas SME e de Canal”.
Inicialmente, a Microsoft não respondeu às perguntas do ECO, mas já depois da sua publicação, fez chegar uma resposta por escrito. “Recentemente, anunciámos uma mudança na estrutura da nossa área EMEA da Microsoft. A Microsoft Portugal, que atualmente reporta à nossa área da Europa Ocidental, passará – a partir de 1 de julho – a fazer parte de uma nova estrutura de área, denominada Europa do Sul, liderada por Charles Calestroupat. Portugal continua a ser liderado por Andrés Ortolá“, justifica a companhia. Por outras palavras, a Microsoft garante que não haverá mudanças de relevo, porque a operação portuguesa passa de um cluster para outro.
Esta explicação, contudo, não colhe junto de quadros superiores da Microsoft, que, sob anonimato, denunciam a perda de autonomia e relevância da operação portuguesa, desde logo pela composição deste novo grupo regional. Para a operação portuguesa, esta reorganização representa uma significativa perda de autonomia. Se até agora a Microsoft Portugal tem funcionado como subsidiária independente com liderança local, passará a ser apenas uma parte de um cluster multinacional que engloba mercados bastante diversos, desde a Turquia até aos Balcãs.
Agora, por escrito, as críticas são do ex-governante. “A nova configuração agrupa Portugal com países sem continuidade geográfica ou tradição histórica comum. Perde-se, assim, a possibilidade de potenciar sinergias naturais — como acontece, por exemplo, entre Portugal e Espanha, cuja proximidade cultural, económica e histórica é reconhecida e valorizada por múltiplas multinacionais. Por comparação, a atual decisão parece ignorar a realidade construída ao longo de mais de 30 anos de presença da Microsoft em Portugal“.
André de Aragão Azevedo pede uma reavaliação desta organização. Na carta aberta, a que o ECO teve acesso, o ex-governante dá duas alternativas possíveis: “Estamos ainda no início desta reorganização. Por isso, gostaria de apelar a que Portugal pudesse ser retirado do South MCC e integrado num cluster mais coerente, ao lado de países como Itália, Espanha e Israel, respeitando a sua verdadeira dimensão estratégica. Caso tal não seja possível, proponho, em alternativa, a criação de um cluster ibérico, integrando Portugal e Espanha, que respeitaria a história, a cultura e a lógica de mercado que tantas outras organizações globais seguem“.
No email da Microsoft que o ECO revelou, a Microsoft justifica estas alterações com o foco na aceleração do crescimento num momento de forte adoção da inteligência artificial. “Em tempos de incerteza e desafio que a nossa região enfrenta, clientes e parceiros procuram-nos para liderança – não apenas sobre como adotar IA, mas sobre como isso pode remodelar a forma como compram, constroem e crescem de maneira responsável”, refere Samer Abu-Ltaif, presidente da Microsoft para a Europa, Médio Oriente e África desde janeiro deste ano, na referida comunicação.
“Portugal sempre foi um país de inovação para a Microsoft, com uma história consistente de criação de valor, muito acima do seu peso económico relativo. Seja em termos de contributo para o PIB nacional, seja em valor acrescentado per capita, a operação portuguesa demonstrou, ao longo de décadas, uma capacidade de inovação, criatividade, desenvolvimento de talento e impacto nos clientes que a distingue claramente dentro da Europa”, responde Aragão Azevedo. “Portugal não é apenas mais um país do cluster: é uma operação estratégica, inovadora, um polo de talento que a Microsoft ajudou a construir — e que construiu a Microsoft em Portugal”.
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