Novo líder do PS só depois das autárquicas. Socialistas preferem dar a mão ao Governo de Montenegro

Vozes socialistas pedem tempo para escolher o novo secretário-geral, preferindo uma gestão transitória até às eleições locais. Carneiro repete candidatura, Mariana e Medina pressionados a ir a jogo.

Tropas socialistas começam a posicionar-se e querem falar a uma só voz para dar força e união na escolha do sucessor de Pedro Nuno Santos para a liderança do partido. A maioria pede tempo, uma profunda reflexão interna sobre as causas da hecatombe eleitoral de 18 de maio, preferem uma gestão provisória até às autárquicas, que se realizam no final de setembro ou início de outubro, e só depois um novo secretário-geral que, em diálogo, deixe passar o Governo de Luís Montenegro, fazendo uma cerca sanitária ao Chega.

A comissão nacional do PS, liderada pelo presidente do partido, Carlos César, reúne-se este sábado para marcar o calendário da sucessão. Pedro Nuno Santos abandona os comandos socialistas no mesmo dia, a 24 de maio, e César vai assumir interinamente a liderança até às diretas. Entre os potenciais candidatos que se perfilam está desde logo José Luís Carneiro, que já anunciou que vai disputar novamente o trono do Rato. Alexandra Leitão, que está na corrida à Câmara de Lisboa, já afastou uma eventual candidatura, preferindo dedicar-se às eleições locais. Também Duarte Cordeiro, da ala pedronunista colocou-se de fora. Mariana Vieira da Silva e Fernando Medina, delfins de António Costa, estão a ser pressionados para irem a jogo. A primeira não exclui entrar na corrida já o segundo prefere manter-se, por agora, em silêncio.

Aquele que perdeu as eleições internas há um ano para Pedro Nuno Santos, e que volta a candidatar-se, já se mostrou disponível para conversar com a Aliança Democrática (AD) – coligação PSD/CDS e deixar passar o programa de Governo, em nome da “estabilidade”, mas rejeita uma solução de bloco central, porque “seria prejudicial aos dois partidos subsumirem-se”, afirmou, esta segunda-feira, José Luís Carneiro, em entrevista à CNN Portugal.

Os apoiantes da candidatura do ex-ministro da Administração Interna, como Augusto Santos Silva ou João Soares, preferem uma eleição rápida antes das autárquicas, para que o partido possa estar organizado e estável aquando das eleições locais. O antigo presidente da Assembleia da República defende que o PS deve ter “cabeça fria” e uma “direção plenamente legitimada o mais depressa possível”, considerando que o partido deve inviabilizar qualquer tentativa de derrubar um Governo da AD, afirmou em declarações à Lusa, no rescaldo da pesada derrota do PS nas legislativas de domingo.

24º Congresso Nacional do PS - 05JAN24
José Luís Carneiro à chegada ao 24.º Congresso Nacional do PS, em janeiro de 2024Hugo Amaral/ECO

Vitalino Canas também considera que “quem estiver disponível deve apresentar-se o mais rapidamente possível”, porque “os candidatos do PS às autárquicas querem um partido organizado e estável”, justificou em entrevista à Rádio Renascença. “O melhor para o PS é um processo rápido de reestruturação da liderança para procurar ter o partido pronto a funcionar por altura do verão”, defendeu. No entanto, o antigo dirigente socialista alerta que a pressão não deve ser inimiga de uma “reflexão profunda” que o partido deve fazer, para regressar ao seu “código genético, à sua linha tradicional combatente pelo centro”, abandonada com a geringonça de António Costa.

Mas a maioria das vozes usa precisamente esse argumento, da necessidade de “reflexão profunda interna”, para pedir tempo e afastar precipitações na escolha do novo secretário-geral do PS. O próprio José Luís Carneiro admite que “há sempre a possibilidade de fazer a eleição, dando logo legitimidade ao novo secretário-geral e depois realizar o congresso com a eleição dos delegados depois das das eleições autárquicas”.

O ex-ministro das Finanças, Fernando Medina, que não se quer pronunciar ainda se irá ou não entrar na corrida à sucessão de Pedro Nuno Santos, entende que “haverá mais espaço para reflexão” caso as eleições internas se realizem depois das autárquicas. De lembrar que o socialista colocou-se de fora das listas para as legislativas de 18 de maio e foi contra o chumbo da moção de confiança que derrubou o Governo de Luís Montenegro. Divergências à parte, apareceu na campanha do PS a dar apoio a Pedro Nuno Santos, no grande comício da Aula Magna, em Lisboa.

O secretário-geral do Partido Socialista (PS), Pedro Nuno Santos e Fernando Medina durante o comício na Aula Magna, em Lisboa, 13 de maio 2025, no âmbito das eleições legislativas 2025Hugo Amaral/ECO

“Temos que ter tempo de reflexão e respeito pelo secretário-geral em funções pela campanha dura e resultado muito doloroso. Não me irei pronunciar nos próximos dias, creio que ainda não é o tempo. No dia a seguir às eleições, ainda há muita coisa a digerir”, disse à Renascença.

Mariana Vieira da Silva, que foi número dois do governo de maioria absoluta socialista de António Costa, também tem sido desafiada para entrar na corrida à liderança do partido e, para já, não afasta essa hipótese. “Nunca excluí. Estou disponível para, das mais diversas formas, ajudar o PS a encontrar um caminho que possa ser de união”, afirmou esta terça-feira, em entrevista à SIC Notícias.

Mas o partido precisa de tempo. “Isto não é uma corrida de 100 metros. Há a necessidade de uma profunda reflexão, o PS precisa de tempo e, para isso, estes primeiros dias serem marcados pela pressa não é útil. A pressa é inimiga de um processo alargado de discussão interna de quem se considera a pessoa mais capaz de fazer o duro trabalho que o partido tem pela frente. É preciso ter consciência da dimensão da derrota”, afirmou. E atirou umas larachas a José Luís Carneiro: “Só porque alguém já se candidatou no último congresso do PS tem um direito reforçado ou prioritário para ser líder do PS”.

Sobre o calendário das eleições internas, Mariana Vieira da Silva apontou que, numa primeira fase, o partido deve “ter eleições ainda antes do verão” e haverá “um congresso depois das autárquicas, porque o PS tem de se concentrar nas autárquicas”. As eleições locais, que se deverão realizar no final de setembro ou início de outubro, devem “ser a prioridade”. “Mas, na comissão nacional, veremos as sensibilidades e os candidatos”, completou.

Mariana Vieira da Silva durante o comício do PS na Aula Magna a propósito da campanha eleitoral para as Legislativas 2025Hugo Amaral/ECO

Também o ex-ministro da Educação e militante do PS, João Costa, advoga que o partido “deve encontrar uma solução interna de gestão que dirija a discussão e adiar eleições e a escolha de alguém para depois das eleições autárquicas, concentrando-se nesta campanha e neste debate”, escreveu num artigo de opinião publicado no Expresso.

“Uns focar-se-ão em personalidades, outros na questão da governabilidade, e ainda outros no ‘esquerdómetro’. É da natureza dos ciclos mediáticos e, em verdade, podem ser pontos importantes para o futuro imediato de um partido que precisa de se reconstruir e voltar a ser atrativo para o português médio. Não podemos, porém, permitir que nos quedemos pelo curto prazo e nos esqueçamos de preparar o futuro”, defende Miguel Matos, num artigo publicado na Sábado. O socialista foi responsável por coordenar os mini-estados-gerais do PS que prepararam o programa eleitoral com que Pedro Nuno Santos concorreu às legislativas.

Independentemente dos timings, todas as tropas socialistas estão unidas num ponto: é preciso estabilidade, deixar passar o Governo de Luís Montenegro e fazer uma cerca sanitária ao Chega. “O PS deve ser aquilo que sempre foi, um fator de estabilidade e de confiança no futuro. Temos de ter a capacidade de, em sede parlamentar, sermos capazes de assentar compromissos, PS e AD. E o PS deve ser claro na garantia de viabilização do Governo, porque é isso que os cidadãos nos pedem”, sublinha o antigo ministro da Administração Interna e atual membro da comissão política nacional do PS, José Luís Carneiro.

Fernando Medina também já acenou com a necessidade de entendimentos ao centro. Se a AD “der sinais de uma vontade de diálogo mais estrutural com o PS, o PS deve ter as portas abertas no sentido de assegurar uma solução de Governo [de Luís Montenegro], desde que exclua a extrema-direita da esfera da governabilidade”, defendeu em declarações ao canal NOW.

Aquele já foi apontado como putativo líder do PS salientou que “Luís Montenegro vai ter de fazer um caminho, vai ter de escolher se prefere ter o PS como seu interlocutor e, se o quiser, vai ter de ser claro em renegar a extrema-direita e as propostas da IL”.

Mariana Vieira da Silva é mais assertiva ao defender que, nesta fase, o PS deve deixar passar o Governo de Luís Montenegro. “Não vejo razões para o PS alterar a sua posição. Não faz sentido votar favoravelmente moções de rejeição, devemos olhar para o processo que temos pela frente. O PS tem tido uma posição que só vota favoravelmente moções de rejeição quando tem uma alternativa, como em 2015, e não vejo que o PS mude essa abordagem”.

Já sobre Orçamentos de Estado “é preciso esperar” para ver. “Temos experiência suficiente com a AD, precisamos de tempo para nos reorganizamos e isso tem de estar presente na cabeça de todos os socialistas”, frisou, não se comprometendo à partida com uma viabilização da proposta orçamental para 2026.

O eurodeputado socialista Francisco Assis, que afastou a hipótese de entrar na corrida às eleições internas, reforça a mesma tese: de que “há momentos em que os grandes partidos do espapo democrático-liberal têm de procurar entendimentos”. “Não estou a preconizar um Governo de bloco central como é o caso alemão. Acho que a haver um entendimento, tem de ser negociado”, acrescentou.

Mas foi mais longe do que Mariana Vieira da Silva ao entender que, à partida, “o PS deve viabilizar os próximos Orçamentos de Estado do Governo da AD”, defendeu esta terça-feira a partir de Bruxelas, em declarações à RTP3.

Para Assis, não há outra alternativa. “Ou é isso ou é a ingovernabilidade ou é atirar a AD para os braços do Chega”. Contudo, deu nota que, “se, em algum momento a AD der sinais de que privilegia a relação com o Chega, aí o PS tem de ter uma posição” diferente.

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