Montenegro põe as fichas na reforma do Estado e arrisca na saúde. Os sinais sobre o novo Governo
Segundo Governo de Montenegro tem 16 ministérios, menos um do que o anterior. Gonçalo Matias é aposta para as reformas e Maria Lúcia Amaral a resposta com peso para pasta marcada pelas polémicas.
É um Governo de continuidade aquele que esta quinta-feira, às 18 horas, tomará posse, mas com alterações cirúrgicas que podem desencadear mudanças de fundo. Luís Montenegro entregou ao Presidente da República uma lista com 16 nomes, 13 dos quais a transitar da liderança das pastas do executivo cessante. A surpresa chegou contudo com a criação de um novo Ministério, o da Reforma do Estado, dando sinais de que será uma aposta forte do Executivo. Paralelamente, surgiu um super-ministério, que junta a economia e os fundos europeus, e o primeiro-ministro preferiu arriscar e manter a ministra da Saúde, apesar das críticas.
Luís Montenegro apresentou a Marcelo Rebelo de Sousa, na quarta-feira, a composição do seu segundo Governo, que terá 16 ministérios, menos um do que o anterior. “Há uma grande continuidade. Formalmente é um novo Governo, mas é mais uma reformulação do que existia do que um novo. A própria mensagem da campanha eleitoral foi “deixem o Luís trabalhar”, pelo que fazia pouco sentido que o deixassem trabalhar e substituíssem os ajudantes todos“, considera André Azevedo Alves, professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, em declarações ao ECO.
Apesar da continuidade, o primeiro-ministro indigitado avançou com pequenos ajustes e deu um sinal de que a reforma do Estado será uma “aposta forte”, com a criação de um ministério dedicado à sua execução. Desconhecendo-se ainda os detalhes, numa primeira leitura os politólogos consultados pelo ECO destacam este como um dos principais marcos da estrutura do novo Executivo. Para o liderar, Luís Montenegro foi buscar Gonçalo Matias, um repetente num governo da coligação PSD/CDS e na pasta que lhe coube.
O presidente da Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) e professor de Direito da Universidade Católica foi Secretário de Estado Adjunto e para a Modernização Administrativa no segundo Executivo de Pedro Passos Coelho, entre outubro e novembro de 2015, e os sinais são de que será puxado para o núcleo duro do primeiro-ministro ao ser-lhe concedido o título de ministro-Adjunto.
“Há uma intenção do primeiro-ministro com a questão da autonomização da reforma do Estado, claramente para tentar sinalizar uma aposta num ímpeto reformista, que foi uma crítica que foi feita ao Governo até dentro do próprio PSD, como Pedro Passos Coelho. Acaba por ser também o reconhecimento de que é preciso fazer mais“, refere André Azevedo Alves.

As mudanças na orgânica do Governo não se ficaram por aqui. Numa saída (surpresa) de Pedro Reis da pasta da Economia, uma decisão que Luís Montenegro manteve para si até à última, o primeiro-ministro criou um super-ministério, o da Economia e da Coesão Territorial, e entregou-o a Manuel Castro Almeida, numa espécie de “promoção” que lhe compensa perder o título de ministro-adjunto. Castro Almeida passou, assim, a acumular os fundos europeus com o pelouro da economia, numa altura em que a incerteza internacional levanta desafios acrescidos ao crescimento e Portugal está a pouco mais de um ano do fim do prazo para cumprir os compromissos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
Paula Espírito Santo, professora do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa (ISCSP), assinala ao ECO que a junção dos dois pelouros é uma estratégia acertada. “Há aqui quase uma aclaração da área da economia. Em termos de concretização a economia acaba por estar muto dependente da execução dos fundos europeus. Temos de recordar que se fala do cumprimento do PRR enquanto grande motor económico e a relação com a Coesão tem também a ver com essa articulação”, argumenta.
Conforme esperado, Margarida Blasco abandonou a Administração Interna, depois de um ano marcado por polémicas. Para a substituir entrou em cena Maria Lúcia Amaral, até agora Provedora de Justiça. “Era uma substituição anunciada e o Governo conseguiu encontrar um nome forte, com credibilidade e independência“, destaca André Azevedo Alves sobre aquela que foi a primeira mulher a chegar à liderança da Provedoria. Antes disso, Maria Lúcia Amaral passou pelo Tribunal Constitucional como vice-presidente, órgão para o qual entrou em 2007, por escolha da Assembleia da República. Tem uma vida dedicada ao direito, nomeadamente com maior foco na área Constitucional.
Enquanto provedora requereu ao Tribunal Constitucional (TC) a declaração de inconstitucionalidade da lei da eutanásia, mostrou-se preocupada com o tempo de legalização dos imigrantes, mas foi durante a Troika que começou a ser referenciada pelos jornais por, no TC, estar contra algumas das oposições do órgão a medidas de austeridade, como o corte de salários.

A juntar-se à mesa do Conselho de Ministros onde o sotaque do Norte será o mais ouvido, ou a maioria dos escolhidos não fosse natural ou tivesse ligações a essa região do país, a começar pelo próprio primeiro-ministro, estará Carlos Abreu Amorim, que se viu promovido de secretário de Estado Adjuntos e dos Assuntos Parlamentares a ministro dos Assuntos Parlamentares, com a saída de Pedro Duarte, candidato à Câmara Municipal do Porto.
Deputado entre 2011 e 2019 e vice-presidente da bancada social-democrata quando Luís Montenegro e Hugo Soares lideraram os grupos parlamentares, tendo-se mostrado indisponível para se manter no cargo quando Rui Rio assumiu a presidência do PSD, era conhecido pelas posições muitas vezes polémicas nas redes sociais, sobre política e futebol.
“É um tipo de posição que não é fácil de substituir, porque mais do que formação técnica é preciso um determinado perfil político. Sendo a substituição forçada pela saída do ministro [Pedro Duarte] para candidato autárquico faz algum sentido olhar para o secretário de Estado. Comporta algum risco pelo histórico de personalidade, mas as coisas não lhe correram mal e não existiram embaraços“, assinala André Azevedo Alves. E o risco pode ser mitigado pelo peso de Hugo Soares, líder parlamentar dos sociais-democratas.
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Arriscada é, contudo, segundo os politólogos ouvidos pelo ECO, a manutenção de Ana Paula Martins na pasta da Saúde. A manutenção da ministra já era dada como certa nos corredores, mas a confirmação oficial de que Montenegro lhe renova a confiança, mesmo perante as polémicas, gerou críticas dos partidos políticos e de representantes do setor.
“É uma pasta difícil pela dificuldade do setor, mas também em progredir em termos de reforma estruturantes. Há uma aposta talvez mais pessoal do primeiro-ministro em continuar um trabalho que foi iniciado, mas que está longe de ser satisfatório, olhando às reações não só dos partidos como da Ordem dos Médicos“, frisa Paula Espírito Santos.
André Azevedo Alves, que descreve a ministra como “muito fragilizada”, considera que “é uma área onde Luís Montenegro arrisca, porque este ano a mensagem foi de que a culpa dos problemas era do PS que esteve no poder oito anos, mas daqui a três anos o que não funcionar já não será culpa do PS”.
Outra alteração cirúrgica abrange Margarida Balseiro Lopes, até agora ministra da Juventude e da Modernização, que com a saída já esperada de Dalila Rodrigues passa a acumular a Cultura com a da Juventude e do Desporto, perdendo o pelouro da Modernização Administrativa, transferida para as competências do recém-criado Ministério da Reforma do Estado.
Um elenco governativo, composto por 10 homens e seis mulheres, que mereceu o assentimento de Marcelo Rebelo de Sousa, que lhe dará posse 18 dias depois das legislativas, tornando-se no processo mais rápido de formação de Governo do atual inquilino de Belém.
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