Espanha necessita de incorporar mais de 15.000 profissionais na área da logística e mais de 5.000 no setor automóvel, tendo em conta o novo cenário industrial europeu

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  • 2 Julho 2025

De acordo com o relatório “Previsiones ante un escenario de conflicto” do Instituto de Ciencias del Empleo y las Relaciones Laborales (Instituto de Ciências do Emprego e das Relações Laborais).

A aceleração dos conflitos internacionais e a transformação geopolítica global estão a obrigar sectores-chave da economia espanhola a reestruturarem-se com urgência. Dois dos setores mais afetados, a logística e o automóvel, terão de aumentar significativamente a sua capacidade de atrair talentos para manter a competitividade e responder aos desafios da sustentabilidade, da autonomia tecnológica e da resiliência industrial.

Estas são algumas das principais conclusões do relatório “Previsões num cenário de conflito”, elaborado pelo Instituto de Ciências do Emprego e das Relações Laborais (ICER), que analisa o impacto dos novos riscos geoestratégicos no mercado de trabalho espanhol e antecipa uma profunda transformação do capital humano nos setores industriais mais sensíveis às perturbações globais.

O setor da logística, duramente atingido pelas perturbações nas cadeias de abastecimento globais, terá de incorporar entre 11 500 e 17 500 novos profissionais nos próximos cinco anos, de acordo com o documento, que identifica a logística como um dos pilares fundamentais para garantir a resiliência económica de Espanha face a um ambiente global cada vez mais volátil.

Deste total, entre 8 500 e 12 500 profissionais serão necessários especificamente no domínio dos transportes terrestres e marítimos, enquanto entre 3 000 e 5 000 terão de se especializar em áreas críticas como a digitalização dos processos logísticos e a sustentabilidade ambiental.

A necessidade de reforçar a autonomia estratégica da Europa em relação a países terceiros colocou a tónica na modernização do sistema logístico. Este processo implica a reformulação das rotas de transporte, o investimento em infra-estruturas multimodais, a digitalização das operações e a melhoria da rastreabilidade das mercadorias ao longo da cadeia de valor. Para tal, serão necessários perfis formados em gestão de crises, otimização de rotas, planeamento da procura, comércio internacional, tecnologias de localização em tempo real e cumprimento da regulamentação transfronteiriça.

Num momento de forte pressão sobre o aprovisionamento energético, de perturbações no tráfego marítimo e de tensões em corredores estratégicos como o Mar Vermelho ou o Estreito de Gibraltar, a Espanha tem a oportunidade de consolidar a sua posição como plataforma logística entre a Europa, a África e a América Latina. No entanto, como adverte o ICER, esta possibilidade só se concretizará se o atual défice de capital humano for resolvido e se se avançar na profissionalização do setor.

Um dos principais obstáculos identificados pelo relatório é a transferência desigual de gerações e a disparidade entre os níveis de digitalização nos diferentes ramos do setor. Enquanto algumas empresas de logística estão a avançar para modelos totalmente automatizados e orientados para os dados, outras ainda operam com infra-estruturas e processos ultrapassados. Esta dualidade representa um desafio para a coesão setorial e dificulta a aplicação de normas comuns de sustentabilidade, segurança e eficiência.

O relatório alerta igualmente para o risco de estrangulamentos estruturais no sistema logístico se não for possível recrutar rapidamente talentos especializados. Uma parte significativa desta necessidade centra-se no planeamento da rede de transportes, na análise preditiva de riscos, na cibersegurança logística e na conceção de rotas resilientes face a eventos perturbadores, como conflitos armados, catástrofes naturais ou crises sanitárias.

A transformação da logística será também condicionada pelo cumprimento dos objetivos climáticos. A promoção de modelos de transporte com baixas emissões, a eletrificação das frotas, a eficiência energética dos armazéns e a gestão dos resíduos são já critérios essenciais dos contratos internacionais, tanto públicos como privados.

De acordo com o ICER, será necessário reforçar a formação profissional em logística avançada e estabelecer sinergias entre empresas, centros tecnológicos e administrações públicas para alinhar a oferta de formação com a evolução real do mercado. Recomenda igualmente a promoção de políticas ativas de emprego que permitam a reconversão de profissionais de setores em declínio, como a indústria transformadora tradicional ou a distribuição física retalhista.

SETOR AUTOMÓVEL

De acordo com o relatório, o setor automóvel espanhol deverá incorporar entre 5.000 e 6.000 novos profissionais nos próximos cinco anos. Esta necessidade está diretamente relacionada com a transformação estrutural que a indústria está a sofrer, impulsionada por fatores como a eletrificação, a digitalização, a deslocalização de componentes críticos e o reforço dos requisitos regulamentares.

Um dos principais focos desta transformação será o fabrico de baterias para veículos elétricos, uma atividade que a Espanha deverá liderar na Europa. Ao contrário da produção tradicional de veículos, esta nova indústria requer perfis com um elevado grau de qualificação técnica. De facto, o documento estima que serão necessários entre 1.200 e 1.700 engenheiros especializados em armazenamento de energia e tecnologias de hidrogénio verde, além de 800 a 1.200 profissionais com experiência em fábricas inteligentes, com competências em Internet das Coisas (IoT), big data e robótica industrial.

O relatório também identifica como críticos os perfis ligados à conceção de veículos elétricos, à eficiência energética e à sustentabilidade, com uma previsão de 500 a 700 novos profissionais neste domínio. Do mesmo modo, prevê-se uma elevada procura de especialistas em semicondutores, analistas da cadeia de abastecimento, gestores de plataformas digitais, profissionais da economia circular e gestores de marketing sustentável.

Para além desta necessidade quantitativa, existe um problema qualitativo, nomeadamente a falta de talentos disponíveis nos territórios onde se prevê a instalação de novas fábricas. De acordo com “Previsões para um cenário de conflito”, esta lacuna obrigará as empresas a desenvolver estratégias proativas de formação, de atração de talentos internacionais e de mobilidade geográfica, sobretudo se quiserem assegurar a sustentabilidade dos novos clusters industriais que estão a ganhar forma.

O contexto não é simples. O abrandamento da Agenda Verde Europeia, causado pelas tensões entre sustentabilidade e competitividade, poderá atrasar investimentos fundamentais em tecnologias limpas. A isto juntam-se os efeitos das políticas tarifárias, tanto na Europa (com o Mecanismo de Ajustamento às Emissões de Carbono nas Fronteiras) como nos Estados Unidos (através de subsídios à indústria nacional), que estão a perturbar a balança comercial global e a exercer uma pressão adicional sobre a indústria automóvel espanhola.

Como detalha o relatório da ICER, estas mudanças estão a forçar as empresas do setor a reconfigurar as suas cadeias de abastecimento, a reduzir a dependência de componentes da Ásia e a avançar para modelos de distribuição mais digitais e personalizados. A descarbonização, a inovação das baterias, a produção local de semicondutores e a criação de infra-estruturas de carregamento adequadas serão fundamentais para o êxito deste processo.

Nas palavras do ICER, “a adaptabilidade, a formação técnica avançada e uma visão industrial integrada serão condições indispensáveis para que a Espanha mantenha uma posição competitiva no novo mapa automóvel europeu”.

Tanto o setor automóvel como o setor logístico exemplificam a profundidade da mudança que a economia espanhola está a sofrer. O ICER insiste em que não se trata apenas de uma transformação tecnológica ou regulamentar, mas de uma reconfiguração estrutural das competências profissionais, dos fluxos de trabalho e dos modelos de produção.

Como sublinha o relatório, o êxito desta transição dependerá da capacidade de antecipar as novas exigências do mercado, de adaptar os sistemas de formação e de criar ambientes atrativos para os talentos altamente qualificados.

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