Óbidos ganha mega centro de biotecnologia com fábrica e centro de I&D
Após vender patentes à BioNTech, Nuno Prego Ramos lidera a construção de “um dos maiores centros de biotecnologia da Europa” em Óbidos. Inovação, impostos e imigração dominam "Conversas com Fomento".
Depois de ter vendido à gigante BioNTech as patentes de tratamentos revolucionários contra o cancro desenvolvidas pela CellmAbs, por cerca de 1,5 mil milhões de euros, Nuno Prego Ramos criou uma nova startup (Valvian) que pretende transformar Portugal numa referência mundial na área da biotecnologia. E prepara-se para dar “em breve” o primeiro passo concreto nesse sentido, notando que o país está a “reunir um conjunto de players disponíveis para olhar para saúde e biotecnologia de forma integrada”.
“Estamos a pensar não só na Investigação e Desenvolvimento (I&D), mas na forma como Portugal, um país periférico, pode ser relevante para a Europa. Estamos a investir em I&D e, ao mesmo tempo, para assegurar a produção. Não temos capacidade produtiva na Europa e é preciso tê-la cá. Vamos construir em Óbidos um dos maiores centros de biotecnologia da Europa, que vai produzir para a Valvian, mas também para outras empresas, para termos a capacidade de responder às necessidades portuguesas, europeias e, quem sabe, também às americanas”, anunciou durante o encontro “Conversas com Fomento”.
Outro projeto que o empreendedor tem em carteira chama-se “Hospital do Futuro” e pretende atacar aqueles que diz ser os maiores problemas do SNS: os atrasos e os custos. “Não faz sentido termos um tipo de tratamento e um acesso à saúde como há 100 anos. A Inteligência Artificial (IA) pode-nos ajudar a fazer isso. São projetos que vão ver a luz do dia muito em breve e com a capacidade de se desenvolverem mais rapidamente do que o que se vê nos hospitais públicos”, referiu.

Sustentando que “nunca houve tanto acesso a capital inteligente” em Portugal, Nuno Prego Ramos assenta o otimismo na experiência anterior com a CellmAbs, recordando como em 2019 também duvidaram que conseguisse competir com os maiores centros internacionais de tratamentos para oncologia.
Então com o apoio da Portugal Ventures e da Hovione, começou por levantar uma pequena ronda de capital de 1,4 milhões de euros e desenvolveu três terapêuticas até vender a empresa. “Arregaçámos as mangas, pedimos que saíssem da frente e isso fez com que os nossos produtos tivessem escala internacional”, resumiu.
A mais recente ronda de financiamento foi igualmente fechada só com investidores portugueses, que vê “comprometidos” com o atual projeto da Valvian e que sentem o “conforto dos números” que mostram o potencial de investimento no setor da biotecnologia. Por outro lado, o empreendedor sublinha que está a desafiar os investidores a apoiarem também outras empresas portuguesas do setor “para que o ecossistema seja relevante”.
Sensei colocou Leiria “no mapa mundial da Inteligência Artificial”
Foi com tecnologia da portuguesa Sensei que a Sonae abriu no início deste ano em Leiria aquela que se apresenta como a maior loja inteligente do mundo e que resultou de um investimento de seis milhões de euros. Joana Rafael, COO da Sensei, refere que esta experiência com o Continente está a superar as expectativas e integra “do melhor que se faz em Inteligência Artificial (IA) no mundo”.

“Tem as tecnologias mais avançadas de visão artificial e toda a loja é digitalizada. É visitada todas as semanas por retalhistas do mundo todo, que vêm a Leiria, que está agora no mapa mundial da IA. Este é um grande cartão de visita para podermos crescer. Estamos em cinco países e dois continentes, e a trabalhar com grandes retalhistas para trazer esta tecnologia para o mercado”, resumiu a cofundadora da Sensei, durante a mesma conferência que decorreu no Europarque, em Santa Maria da Feira.
Da equipa atual de 84 pessoas, 17% têm doutoramento ou pós-doutoramento em áreas de grande especialização e que são o core da empresa. Sem poder competir em salários com gigantes como a Amazon ou a Meta no que toca à atração do talento da ciência e da engenharia, Joana Rafael diz que a Sensei consegue atrair “missionários” que querem “ajudar o país e têm a missão de fazer algo diferenciador porque esta é uma tecnologia com impacto”.
“Este sentido de missão é o ADN da nossa equipa e o que é necessário para a fazer crescer”, acrescentou, valorizando os planos de stock options que possibilitam aos colabores serem também donos da empresa e beneficiarem com o seu crescimento.
“Portugal só fica mais rico se tiver mais Visabeiras”, mas precisa de mexer nos impostos

Nas “Conversas com Fomento”, partilhando o palco com os líderes de algumas das mais promissoras startups portuguesas, o líder da Visabeira referiu que “faltam a Portugal mais grandes empresas, que não tenham receio de ter escala”, sublinhando que o grupo de Viseu “saiu de Portugal com objetivo de ser campeão europeia e hoje já é”.
Está agora a investir nos EUA na área das redes de energia e das telecomunicações, mas “lá a guerra é diferente e isso [liderança do mercado] vai demorar mais tempo”, reconhece.
Olhando para Portugal, Nuno Terras Marques lamenta que continue a ter “uma política fiscal que desincentiva o crescimento e desincentiva a escala”. Devia ser simplificada, abolidas “taxas paralelas como a derrama” e o IRC devia descer para empresas que reinvistam parte dos lucros em inovação ou na exportação.
E apontou os limites da dedutibilidade dos encargos financeiros nas empresas com aquisições, como as que tem concretizado em vários países, como “paradigmático no desaconselhamento das empresas se sediarem e crescerem em Portugal”.
“É preciso coragem para mudar isso. É uma questão de coragem porque há uma diabolização das grandes empresas, que trazem escala, capacidade de investimento e de exportação. Precisamos de reforçar as políticas fiscais que incentivam a criação de valor, o crescimento e a escala”, insistiu o líder da Visabeira, que mantém a sede em Viseu por “acreditar muito no país e na região” e por ser assim que ajuda a mudar a economia nacional.
“Portugal só fica mais rico se tiver mais Visabeiras a ganharem escala porque temos muito talento. Temos é de arranjar forma de o reter e aí a parte fiscal também é relevante”, concluiu.
Indie Campers vê imigração como “a maior oportunidade”
“Toda a gente fala da imigração como se fosse um bicho de 7 cabeças, mas é a maior oportunidade. Só há imigração em países que são desenvolvidos e devemos ser ativos na imigração e a tentar trazer os melhores. Não conseguimos construir as nossas empresas sem pessoas de fora”, advertiu o CEO da Indie Campers, lembrando que Dublin ou Berlim “tornaram-se ricas graças à imigração” e pedindo que sejam criadas condições para estas pessoas “chegarem rapidamente a Portugal e sejam postas a trabalhar e a contribuir para o crescimento” do país.
Hugo Oliveira, que lidera esta jovem empresa conhecida pelo aluguer de caravanas, que conta atualmente com mais de 8.000 viaturas próprias e soma presença em várias geografias, sublinha que os empreendedores nacionais devem “desenhar os projetos com ambição desde o início” e focados à partida numa escala internacional. Algo que diz ter feito quando detetou uma oportunidade de mercado.

Lembrado que há dez anos, quando poucos acreditavam no projeto, a capital de risco pública Portugal Ventures (atualmente integrada no Banco de Fomento) investiu 140 mil euros, o responsável da Indie Campers, que em maio fechou uma nova ronda de investimento de 27,5 milhões, referiu que o financiamento não é atualmente um “estrangulamento” nem um “problema”, vendo “mais investidores preparados”.
Pelo contrário, apontou que o que faltam são projetos. “Estamos num momento em que há mais capital disponível do que projetos”, concretizou Hugo Oliveira.
“Não podemos ser os empresários do ‘ai, ai, ai’, que correm para o Estado mal começa a chover”
Antes de “apontar o dedo aos outros”, seja porque “o Governo não é suficientemente dinâmico, a banca não é amiga das empresas ou então [culpar] as circunstâncias”, o presidente da CIP – Confederação Empresarial de Portugal, diz que cabe aos próprios empresários assumirem um “verdadeiro compromisso” com o crescimento.
“Não podemos ser os empresários do ‘ai, ai, ai’, que acreditam na economia de mercado, mas que correm para o Estado mal começa a chover”, atirou.
Nas “Conversas com Fomento”, Armindo Monteiro valorizou a criação de um “contrato de confiança com o Estado” que envolva as regras laborais (“quadro de contratação, pelo menos igual, ao que existe na Europa”) e também a nível fiscal, em que a Autoridade Tributária não olhe para os empresários como estando “sempre do lado errado da lei, mas ajudando-as no cumprimento das obrigações”.

Diagnosticando que as empresas nacionais “são muito baseadas em boas ideias, mas em pouco investimento”, o líder da CIP lembrou que “houve uma altura que quisemos que o investimento surgisse pelo risco do outro, mas tem de surgir pelo risco do empresário”.
“Mas nem 8 nem 80. Todo o risco não pode ser também do empresário e não termos apoio nenhum. Há muitos instrumentos de apoio, mas o empresário tem de ter capacidade de arriscar e empreender”, completou.
Por outro lado, falando num “choque de gestão”, Armindo Monteiro reconheceu que “quem tem o capital não sabe tudo nem conhece todas as respostas” e que os empresários precisam de “humildade” e de “aprender com quem sabe”. Isto é, de “passar de patrão a empresário e de empresário a investidor”, que “não é uma questão só de semântica, mas de atitude”.
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