Bruxelas revoluciona funcionamento do orçamento comunitário. Vêm aí planos nacionais e menos programas
Comissão Europeia propôs um orçamento de longo prazo de dois biliões de euros. Há 865 mil milhões para as políticas previstas nos planos e 410 mil milhões para o novo Fundo da Competitividade.
A Comissão Europeia propôs esta quarta-feira um orçamento de dois biliões de euros, o correspondente a 1,26% do Rendimento Nacional Bruto da União Europeia (UE), para financiar as suas políticas a longo prazo. Mais do que o valor global, que subiu face ao quadro atualmente em vigor, a proposta do executivo liderado por Ursula von der Leyen destaca-se por avançar efetivamente com uma revolução na forma como as verbas serão distribuídas.
O documento para o período entre 2028 e 2034 apresentado na quarta-feira à tarde por Ursula von der Leyen representa uma subida do valor global face aos 1,2 biliões de euros previstos no atual quadro financeiro plurianual, depois de intensas negociações na noite de terça-feira e quarta de manhã. No entanto, o valor ainda pode descer uma vez que a proposta é apenas um ponto de partida para as duras negociações que se advinham com o Parlamento Europeu e com os Estados-membros.
Entre os grandes números assinalam-se 300 mil milhões de euros para a agricultura, 218 mil milhões de euros para a coesão, dois mil milhões para as pescas e 131 mil milhões de euros para a área da defesa e espaço. Montantes que deverão ser alvo de contestação dos lobby.
No entanto, o grande marco da proposta é a verdadeira revolução no funcionamento do orçamento comunitário. Caso avance, a estrutura do orçamento passa de sete para quatro rubricas, de 52 para 16 programas e de 540 documentos de programação para 27 Planos de Parceria Nacionais e Regionais.
Para memória futura, há dois grandes números: 865 mil milhões de euros estarão alocados às políticas previstas nos planos e 410 mil milhões de euros para o novo Fundo Europeu para a Competitividade, que inclui o Horizonte Europa e o Fundo de Inovação.
Os planos passam a ser o principal garante da implementação da estratégia de políticas da União Europeia, com a Comissão Europeia a argumentar que permite maximizar o impacto dos fundos e serão mais simples e adaptados. Irão abranger as verbas da política de coesão, a política social, a Política Agrícola Comum (PAC), a política marítima e das pescas, a migração, a gestão das fronteiras e a segurança interna.
“No seu cerne continuam a estar a coesão e a agricultura. São os pilares centrais da solidariedade europeia e do investimento no modelo europeu. Estamos a salvaguardar mais de 300 mil milhões de euros para apoio ao rendimento dos agricultores e dos pescadores. Isto inclui uma reserva agrícola duplicada, para que os meios de subsistência dos nossos agricultores sejam protegidos”, sublinhou von der Leyen.
No domínio da coesão, estão previstos no mínimo 218 mil milhões de euros de investimento nas regiões menos desenvolvidas e, pela primeira vez, existe uma meta de despesa social de 14%. Com a informação divulgada pela Comissão Europeia ainda é difícil compreender que impacto terá para os fundos que Portugal recebe.
Na prática, o objetivo dos planos é que a libertação das verbas esteja associada ao cumprimento de metas de reformas, num modelo inspirado nos Planos de Recuperação e Resiliência. No entanto, Bruxelas garante que o financiamento será desembolsado de forma a garantir que as regiões não vejam o seu financiamento cortado quando surgirem problemas relacionados com reformas pelas quais não são responsáveis.
“Os planos irão promover a convergência e reduzirão as disparidades regionais. Identificarão investimentos e reformas para responder melhor aos desafios do futuro para os Estados-membros e as nossas regiões”, assinala o executivo comunitário, que detalha que serão concebidos e executados em “estreita parceria” entre a Comissão, os Estados, as regiões, as comunidades locais e todas as outras partes interessadas pertinentes.
A estrutura do orçamento passa de sete para quatro rubricas, de 52 para 16 programas e de 540 documentos de programação para 27 Planos de Parceria Nacionais e Regionais.
Para garantir o alinhamento com os objetivos da União Europeia, Bruxelas irá emitir recomendações a cada Estado-membro sobre as áreas prioritárias necessárias. A Comissão Europeia garante ainda que cada Estado-membro poderá aceder ao mesmo montante de fundos que dispõe atualmente e haverá um montante mínimo obrigatório para as regiões menos desenvolvidas, bem como uma salvaguarda que garanta que estas receberão globalmente, pelo menos, tanto financiamento como no âmbito da atual dotação de coesão.
Segundo Bruxelas, os Estados-membros terão flexibilidade para estruturar os planos de modo a refletir as suas próprias estruturas e preferências constitucionais e administrativas. Por exemplo, podem optar por estruturar os planos com capítulos nacionais, regionais ou setoriais.
Segundo Bruxelas, os Estados-membros terão flexibilidade para estruturar os planos de modo a refletir as suas próprias estruturas e preferências constitucionais e administrativas.
Entre os argumentos defendidos por Bruxelas está que estes planos permitem uma maior flexibilidade e adaptabilidade, com a atribuição progressiva de fundos ao longo do período de programação, uma revisão mais fácil dos planos e uma reserva a nível da UE, incluindo o novo mecanismo para responder a perturbações nos mercados agrícolas, permitindo uma margem adicional para adaptação a novas prioridades e crises.
O documento divulgado pela Comissão Europeia assinala que o apoio aos agricultores e aos pescadores será “circunscrito, incluindo medidas ambientais, investimentos nas explorações agrícolas, apoio aos jovens agricultores e instrumentos de gestão dos riscos”, mas as regras de financiamento para a agricultura e as comunidades rurais “serão mais simples, nomeadamente em matéria de pagamentos, controlos e auditorias”.
Grande pote junta agricultura e coesão
Será no âmbito deste novo modelo que os fundos para a agricultura, até agora geridos através da PAC, serão centralizados nos governos, onde serão geridos juntamente com os fundos para a coesão. O Executivo português defendia que estes fundos mantivessem uma gestão separada. Numa carta enviada recentemente à entidade liderada por Ursula von der Leyen, o Governo português sustentou que coesão e agricultura devem ser fundos autónomos com financiamento adequado, marcando assim posição contra os possíveis cortes na Política de Coesão e nas verbas para a Agricultura.
Numa primeira reação ao plano apresentado por Bruxelas, o ministro da Economia e da Coesão Territorial, Manuel Castro Almeida, critica esta “nacionalização” dos fundos para a agricultura e defende que não faz sentido juntar os valores da Política Agrícola Comum com a Coesão e garante: “Portugal vai defender que é muito importante garantir fundos específicos para a agricultura”.
Portugal vai defender que é muito importante garantir fundos específicos para a agricultura.
“Tem de haver uma diferenciação entre os fundos da PAC e os fundos da Coesão”, disse em declarações à RTP3. A proposta apresentada pela Comissão refere a possibilidade de serem criadas sinergias, permitindo criar “uma estratégia mais coerente para revitalizar as áreas rurais e garantir a renovação geracional”.
Bruxelas propõe um orçamento de 300 mil milhões de euros para o setor, abaixo dos 387 mil milhões de euros alocados até 2027 à Política Agrícola Comum.
O executivo comunitário refere que além da PAC, os agricultores poderão ser apoiados por outros planos, “como investimentos em zonas rurais apoiados por fundos de coesão; ferramentas de cooperação como o LEADER para desenvolver atividades de formação rural; ou apoio a reformas em benefício do setor agrícola (por exemplo, reformas fiscais para facilitar a transmissão de propriedades agrícolas ou benefícios sociais para jovens agricultores, a fim de incentivar a renovação geracional)”.
Os Estados-membros poderão ainda utilizar os montantes de flexibilidade não programados para apoiar os agricultores afetados por desastres naturais. “A ‘rede de segurança da unidade”, incluída no Instrumento da UE, permitirá à Comissão reagir rapidamente a perturbações de mercado que afetem o setor agrícola. O Instrumento da UE também permitirá que os Estados-membros recebam financiamento para desastres naturais, outras crises ou novas prioridades que possam afetar o setor agrícola”, detalha o documento divulgado pela Comissão Europeia.
A Comissão Europeia propõe ainda 131 mil milhões de euros para a defesa e cinco novos recursos próprios para financiar o orçamento, bem como um montante anual fixo para o reembolso da dívida entre 2028 e 2034, incluindo juros e capital, de 24 mil milhões de euros ao ano a preços correntes, emitida ao abrigo do Next Generation EU.
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