Concorrência admite rever regime para quem colabora no combate a cartéis

Nuno Cunha Rodrigues disse esta terça-feira, na Assembleia da República, que o programa de clemência pode "ser afinado", após ser questionado sobre o cartel da banca.

O presidente da Autoridade da Concorrência (AdC) admitiu esta terça-feira a intenção de rever o programa de clemência, que beneficia as empresas que colaboram com o regulador no combate aos cartéis e ganham isenções ou descontos nas multas.

“Admito que [o regime de clemência] pudesse ser afinado”, disse Nuno Cunha Rodrigues, na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública (COFAP) que decorre na Assembleia da República.

O presidente da AdC reconhece a necessidade de “afinar” o programa nas questões de private enforcement, mas remeteu esclarecimentos para outro momento. Ou seja, referente às ações de indemnização por infrações ao direito da concorrência.

As declarações de Nuno Cunha Rodrigues, em resposta ao deputado Mário Amorim Lopes, da Iniciativa Liberal, surgiram no contexto do cartel da banca, no que a AdC multou os bancos em 225 milhões de euros, mas a coima acabou por prescrever. Neste caso, a denúncia que motivou a investigação (e consequente decisão) partiu do Barclays.

Questionado pelo deputado social-democrata Martim Syder sobre se é necessário legislar no sentido de evitar novas prescrições, o presidente da AdC afirmou que “tem dúvidas de que uma alteração legislativa beneficiasse” e “se o caso se tivesse passado hoje a prescrição não se teria colocado”. Em relação a situações passadas, como aconteceu com esta dos bancos, referiu que cabe “aos deputados nesta casa apreciar” se uma lei interpretativa faz sentido.

O cartel da banca esteve sete anos em tribunais – e assim permanece, tendo em conta que a AdC apresentou uma reclamação à Conferência de Juízes do Tribunal Constitucional pela decisão deste órgão de não apreciar os recursos interpostos (inclusive do Ministério Público).

“Pessoalmente, tenho dúvidas quanto a esta decisão [do Tribunal da Relação de Lisboa]. É o que é. A decisão coloca-se sobre casos passados, antes de 2022. Diria que, para o futuro, o problema não se coloca. Quanto a casos passados, temos assinalado riscos de prescrição. Temos alguns em curso”, adiantou o presidente da AdC, solicitando o reforço da formação dos magistrados em matérias de Direito da Concorrência.

“Numa perspetiva mais global de direito de concorrência, pode passar por maior formação aos magistrados judiciais para procurar atenuar algumas dúvidas que possam suscitar interpretação na lei”, sugeriu Nuno Cunha Rodrigues na audição parlamentar.

Como funciona o programa de clemência?

  • Trata-se de um regime especial de dispensa ou redução de coima em processos de contraordenação por infração às regras de concorrência investigados pela Autoridade da Concorrência. Para as empresas, traz grandes vantagens uma vez que, ao colaborarem com a AdC na investigação de um cartel, beneficiam da dispensa ou da redução da coima que pode ir até 10% do volume de negócios. Também os administradores e diretores das empresas envolvidas podem ser condenados até 10% da sua remuneração anual e beneficiar dessa dispensa ou redução da coima.

IA para ‘caçar’ quem não notifica compras

A Inteligência Artificial (IA), tecnologia na qual a AdC começou a investir este ano, também foi abordada na COFAP, tendo o presidente da autoridade revelado que os algoritmos já estão a ajudar investigação de casos, nomeadamente na busca das empresas que fizeram aquisições e não as notificaram ao abrigo da lei.

Nuno Cunha Rodrigues disse que a AdC tem três plataformas digitais à base de IA que entraram em funcionamento este ano (Screen IT, Scrap IT e Detect IT) e uma delas conseguiu detetar práticas de gun jumping (quando uma empresa avança com uma operação de concentração sem informar e receber o ‘OK’ da AdC).

Ainda assim, Nuno Cunha Rodrigues mostrou-se preocupado com a problemática da colusão algorítmica (risco de a tecnologia conseguir monitorizar e definir os preços em excesso). “A autoridade está atenta a cenários de colusão entre algoritmos. Colocam-se novos desafios nesse domínio”, reconheceu.

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