Marcelo quer antecipar Censos e desvaloriza dados do INE sobre imigração
Após receber um esclarecimento do Governo, o Presidente da República concluiu que “os números do INE têm variáveis menos fiáveis do que os da AIMA" sobre o número de estrangeiros a residir no país.
O Presidente da República está a considerar pedir para antecipar o recenseamento da população residente em Portugal, previsto acontecer apenas em 2031, segundo o jornal Nascer do Sol. Em causa está o apuramento do número de estrangeiros a residir no país, após Marcelo Rebelo de Sousa ter questionado os dados que o Governo citou para justificar as mexidas na legislação da imigração.
A 10 de julho, o Chefe de Estado mencionava os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE). “O INE diz que há 10.700 e tal mil residentes em Portugal”, enquanto o Executivo diz que há “um milhão e seiscentos mil imigrantes”.
“Uma coisa não joga com a outra“, afirmou então Marcelo numa conferência do Expresso. Segundo o Presidente, ou há um milhão e seiscentos mil imigrantes e os residentes são 12 milhões, ou os residentes são os referidos “10 700 e tal mil” e os imigrantes são um milhão ou pouco menos.
Face às dúvidas do Presidente da República, o Governo enviou esta semana um esclarecimento a Belém. Em resposta, Marcelo disse que, “lido o esclarecimento, fica-se com a sensação de que quem tem razão é a AIMA [Agência para a Integração, Migrações e Asilo], e não o INE”. “Os números do INE têm variáveis menos fiáveis do que os da AIMA“, referiu.
De acordo com o Nascer do Sol, os valores da AIMA diferem dos do INE devido à contabilização dos processos relativos a manifestações de interesse. Os últimos dados da agência, de abril de 2025, contabilizaram um total de 1.546.521 estrangeiros com residência legal em Portugal, incluindo os processos de manifestações de interesse que resultaram em autorização de residência legal.
Já os dados do INE, de 2024, não incluíam os cerca de 440 mil pedidos e processos relativos a manifestações de interesse, até porque esses valores são registados no ano de submissão, e não no ano em que o processo foi concluído. “O INE não tem a informação com o detalhe necessário que permitisse a sua integração na metodologia de cálculo das estimativas de população”, indica o instituto ao ECO.
Ainda assim, a entidade estatística explica que as estimativas “serão passíveis” de revisão “à luz de informação adicional que venha a ser disponibilizada ao INE na articulação com as diversas entidades detentoras de dados”.
Por causa dessa diferença, Marcelo sugeriu então que poderá pedir que o INE antecipe a realização do Censos, que está marcada para 2031 (acontece de dez em dez anos). “Precisamos de saber se somos 11 ou 12 milhões”, disse, argumentando que a população mudou substancialmente em cinco anos e que é necessário realizar um novo estudo.
No entanto, a decisão não está nas mãos do Presidente da República e é muito difícil para o gabinete estatístico iniciar esse processo sozinho. O recenseamento da população depende, por um lado, de regras e recomendações elaboradas pela Organização das Nações Unidas (ONU), mas também da diretiva europeia sobre esta matéria, que estabelece que o ano de referência para a realização dos Censos na União Europeia (UE) é 2011.
A diretiva em causa, que data de 2008, indica que, embora cada Estado-membro possa definir o seu ano de referência, este deve ser escolhido de acordo com o regulamento da UE, que exige que os dados populacionais e habitacionais sejam enviados ao Eurostat, o departamento estatístico da Comissão Europeia, no início de cada década e recolhidos de dez em dez anos.
A vontade de Marcelo em antecipar a realização dos próximos Censos surge depois de, na quinta-feira, ter enviado com caráter de urgência a “Lei dos Estrangeiros” para fiscalização preventiva pelo Tribunal Constitucional. O Presidente da República aponta o dedo à pressa do Governo, que levou a um processo sem audições constitucionais ou a existirem em prazos incompatíveis com a efetiva consulta, questiona a segurança jurídica da lei, alerta para riscos e critica alterações ao reagrupamento familiar.
As alterações à legislação – que incluem que os imigrantes tenham um visto de trabalho passado pelo consulado português no país de origem para conseguirem depois regularizar-se em Portugal com autorização de residência, com exceção dos vistos gold e dos imigrantes altamente qualificados, que podem obter um visto de procura de emprego – foram aprovadas no Parlamento com os votos favoráveis do PSD, Chega e CDS-PP, a abstenção da Iniciativa Liberal e a oposição de toda a esquerda.
O novo diploma prevê também novas regras para o reagrupamento familiar, impondo um prazo de dois anos após a autorização de residência aprovada para pedidos de familiares maiores de idade.
(atualizado às 19h44 com resposta do INE)
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