O hidrogénio e o aço verde

O fabrico de aço verde é um excelente candidato para a exportação de produtos a partir da eletricidade. É uma estratégia que Espanha está a seguir e que pode ser interessante para Portugal.

O valor do hidrogénio verde só é totalmente capturado quando utilizado como matéria-prima. Uma possível utilização é a produção de Aço Verde. O aço é essencial à nossa sociedade, ao ponto de o consumo de aço per capita ser um bom indicador do nível de vida de um país. O consumo de aço tem vindo assim a aumentar em sintonia com a progressiva melhoria do nível de vida. Desde 1970 já multiplicou por três.

Muitas das nossas atividades estão dependentes do aço. Para se construir uma casa, uma ponte, um automóvel ou um frigorífico precisamos de aço. O aço é também essencial à transição energética, sendo fundamental, por exemplo, para a construção de turbinas eólicas e de painéis fotovoltaicos.

O problema é que a produção de aço é, de entre as indústrias pesadas, a que mais emite CO2. É também a segunda em consumo de energia. A indústria do aço é responsável por 4% das emissões de CO2 da Europa e 8% das emissões globais. Um valor imenso da ordem das 4 Gigatoneladas por ano. Na produção de uma tonelada de aço são emitidas duas toneladas de CO2.

Mas o aço é um material extraordinário, que pode ser reciclado sucessivas vezes e ao qual podem ser dadas diferentes propriedades. O que permite que apenas 58% do aço, hoje produzido, tenha de recorrer a minério de ferro. Os outros 42% são produzidos por reciclagem de sucata de ferro em fornos elétricos de arco. É o que faz, e bem, a Siderurgia Nacional.

Dos 58% de aço produzidos a partir de minério de ferro, 90% é produzido em altos fornos, mas existe uma forma diferente de o fazer, o DRI (“Direct Reduced Iron”), com o qual já se processa 10% do minério.

Há 3000, foi através de DRI que o homem aprendeu a produzir ferro, utilizando o carvão como elemento redutor. O carbono combina-se com o oxigénio do minério de ferro e produz ferro e um gás rico em carbono, através da seguinte reação química simplificada:

  • Minério de Ferro [Fe2O3] + Carvão [C] -> Ferro [Fe] + Dióxido de carbono [CO2]

A história é cíclica, e o DRI é hoje um dos caminhos adotados para descarbonizar o aço, produzindo Aço Verde.

Empresas como a MIDREX, desenharam fornos especiais (tipo “shaft”) que, inicialmente, utilizavam gás natural como fonte de energia para a redução direta do minério de ferro. Mas o gás natural pode ser substituído por hidrogénio em diferentes percentagens e no caso de se utilizar 100% de hidrogénio verde conseguiu-se Aço Verde. Mas é preciso muito hidrogénio, o que implica muita energia renovável.

Para reduzir o minério de ferro, utilizando hidrogénio em vez de carbono, segue-se a seguinte reação, também muito simplificada:

  • Minério de Ferro [Fe2O3] + Hidrogénio [H2] -> Ferro [Fe] + Água [H2]

A Suécia está na vanguarda do fabrico do Aço Verde e é lá onde foram efetuados, até agora, os maiores investimentos neste campo. Tem duas empresas, a Hybrit e a H2GrenSteel, apostadas em transformar uma das indústrias mais difíceis de descarbonizar.

Em Espanha, aqui ao lado, a Arcelor Mittal, que é a maior empresa siderúrgica do mundo, vai também investir mil milhões de euros num projeto de Aço Verde nas Astúrias. Este projeto candidatou-se a uma ajuda de Estado de 450 milhões de euros. Já obteve a aprovação da Direção-Geral da Concorrência da União Europeia e aguarda, agora, a autorização final da Comissão Europeia. A Espanha a mostrar o caminho num projeto que vai ser um marco na Europa.

Espanha e Portugal têm uma grande aposta na produção de eletricidade a partir de energia solar e fotovoltaica. Estas energias são voláteis e uma das formas de se atingir uma grande percentagem de energia renovável no “mix” energético, passa por instalar muita capacidade de geração, o que implica que, ao longo do ano, vai haver muitas horas com excesso de produção em que o valor da energia é muito baixo.

Uma alternativa seria exportar essa energia excedentária para um mercado que a valorizasse. Mas este caminho parece estar vedado pelas dificuldades encontradas em reforçar a interligação elétrica entre Espanha e França.

A estratégia, que Espanha parece estar a adotar, é trazer para o país indústrias com grande consumo de eletricidade e depois exportar os produtos produzidos em vez da eletricidade.

O fabrico de aço verde é um excelente candidato. Precisa de uma grande quantidade de hidrogénio produzido a partir de energias renováveis, podendo ser uma forma adequada de utilizar energia elétrica de baixo custo. Uma estratégia que poderá ser, também, interessante para Portugal.

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