O desafio da Logística em 2023 – como proteger um futuro incerto

  • David Sousa
  • 18 Abril 2023

David Sousa, diretor da SEMPER, alerta para os problemas de transporte e de como os seguros terão de voltar a olhar para a segurança dos transportes e da cadeia logística. Chama a atenção para Espanha

Se 2020 e 2021 nos desafiaram a gerir uma pandemia à escala planetária, um risco inesperado e desconhecido com consequências para as pessoas e empresas, 2022 representou uma época com novos e sucessivos obstáculos, que persistem.

O presente ano será, decerto, um período em que a incerteza se acomodará, cada vez mais, dominando o nosso vocabulário. Um cenário que não inibe a confiança e a segurança, mas que exige agilidade nas respostas e uma superior abrangência de prevenção face às mais recentes formas e dimensões das encruzilhadas da atualidade. Exigente, em particular, no setor dos Transportes & Logística, que acredito que atravessa uma fase sem precedentes. Acrescidos aos desafios diários inerentes à atividade – desde a disrupção da cadeia logística, a escassez de recursos humanos ou a adaptação às exigências ambientais do mercado -, o setor depara-se com números preocupantes no que concerne aos furtos de mercadorias, um crescente fenómeno que se prolongou, quer em número, quer em gravidade, no segundo ano da década.

A pequena vila de Vojvodinci, na Sérvia, ensina-nos isso mesmo. No dia 5 de dezembro de 2022, um motorista de transporte rodoviário esteve envolvido num furto de bens não especificados avaliados em mais de 5 milhões de euros. Este é o caso mais grave, neste mês, segundo os dados apurados pelo sistema de inteligência da TAPA (Transported Asset Protection Association), que indicam que o ano de 2022 terminou com uma média de quase 20 roubos de carga por dia, em dezembro, ao largo de 28 geografias do mercado EMEA (Europa, Médio Oriente e África).

Espanha tem sido um dos países mais fustigados por esta problemática, com mais de mil ocorrências registadas no último ano, cujas perdas superaram os 11 milhões de euros. Sendo esta uma das principais geografias de descanso e dormida para os transportadores portugueses, em particular nas estações de serviço, que não oferecem condições de segurança para evitar estas ocorrências, este cenário levanta sérias preocupações sobre a segurança das mercadorias e dos motoristas, merecendo uma grande reflexão sobre eventuais medidas mitigadoras.

A nível global, apenas nos últimos 31 dias do ano, as perdas de produto equivaleram a um montante total de 17 milhões de euros. A TAPA, associação que visa apoiar os prestadores de serviços de logística a minimizar perdas resultantes destes episódios, acredita que os casos não relatados catapultariam os números para graus desconcertantes. O quadro de perigos com que o setor se depara manifesta-se como um constrangimento claro às operações das empresas das cadeias de abastecimento e pode influenciar, invariavelmente, as flutuações de preços e disponibilidade de stocks que afetam os consumidores finais.

Quando observada a outra face da moeda, é possível entender que esta é uma situação paradoxal – a paragem dos operadores de transporte para descanso, em locais seguros, implica desvios constantes, custos acrescidos e um prolongamento dos tempos de trânsito que prejudicam a competitividade das empresas e não respondem aos tempos de entrega exigidos por um mercado em que a digitalização e as expectativas dos clientes crescem, lado a lado, a passos largos.

Esta é uma ameaça que, precisamente face à digitalização dos sistemas, extrapolou as fronteiras da criatividade e colocou o impacto das feridas nos operadores numa outra dimensão. No raio de ação do crime organizado, o modus operandi socorre-se, com cada vez mais frequência, de bolsas de carga online, plataformas digitais que, ao facilitarem o relacionamento comercial entre exportadores/importadores, transitários e transportadores, com claros benefícios económicos para todas as partes envolvidas, vieram também a ser alvo de grupos criminosos, com o intuito de explorar as vulnerabilidades deste sistema, em termos de segurança.

Após a realização bem-sucedida de transportes de menor dimensão e da conquista da confiança do cliente, estas organizações atacam aquando do transporte de cargas mais valiosas, momento a partir do qual se verifica o desaparecimento integral de carga, camião, motorista e empresa, cujos dados carregados nos referidos portais são totalmente falsos e desenvolvidos com o propósito específico de burlar o expedidor ou o transitário em causa. Esta é uma realidade com a qual fomos já confrontados no passado, com clientes a terem sido lesados em várias centenas de milhares de euros, em resultado das operações de uma quadrilha internacional organizada.

Desde equipamentos industriais, pneus, perfumes ou combustível, não há tipologia de mercadoria que escape a esta esfera de perigo, com consequências igualmente danosas nos veículos e no bem-estar dos motoristas. Qual a resposta necessária? Quando qualquer produto, empresa ou transportador está sob risco, a adaptação e a prevenção são determinantes, exigindo uma constante atualização em relação às táticas utilizadas pelas redes criminosas e um cuidadoso planeamento do transporte, tendo em conta que, nos dias de hoje, praticamente qualquer mercadoria poderá ser alvo de roubo.

Com a complexificação das cadeias logísticas, os seguros de transporte e logística, multirriscos ou os seguros de responsabilidade civil, ao cobrirem os mais diversos riscos que podem afetar a atividade transitária, desempenham um papel indispensável para o setor, que encontra na aliança com o ramo segurador umas das regras de ouro para minimização das lacunas de segurança a que está exposto.

Através de uma completa compreensão e avaliação dos riscos de cada transporte, na qual existe uma capacidade cada vez mais avançada de análise de dados com recurso a soluções digitais, esta apresenta-se como uma ferramenta crítica de proteção dos ativos das Organizações, bem como quando estão em causa danos ou prejuízos a terceiros.

Pela particularidade de cada negócio e características de cada geografia, a customização é um dos fatores chave na construção de uma solução completa para as necessidades de cada agente, face a uma supply chain com cadeias cada vez mais longas e multimodais.

Um novo futuro define-se, perante os nossos olhos. Uma equação de complexa solução. Aliadas às coberturas adequadas, as empresas do setor da Logística não estarão apenas a mitigar riscos, mas a incorporar uma vantagem competitiva que as capacitará devidamente para potenciar negócios e enfrentar qualquer tempestade que se avizinhe.

  • David Sousa
  • Diretor da SEMPER

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