BRANDS' ECO Ciclo de Conversas Sessão #1 – Energia descentralizada e limpa
A primeira sessão do"Ciclo de Conversas - Rumo à neutralidade carbónica 2030", organizada pela CM do Porto, teve como tema "Energia descentralizada e limpa". O evento decorreu no Porto Innovation Hub.
O “Ciclo de Conversas – Rumo à Neutralidade Carbónica 2030” é uma iniciativa organizada pela Câmara Municipal do Porto, que conta com 10 sessões de esclarecimento e debate relacionadas ao tema da sustentabilidade e da descarbonização. A primeira sessão aconteceu na passada quinta-feira, dia 4 de maio, no Porto Innovation Hub e teve como tema “Energia descentralizada e limpa”.
A abertura do evento esteve a cargo de Filipe Araújo, Vice-Presidente da Câmara Municipal do Porto, que começou por dizer que o “Porto vai liderando pelo exemplo”. “A lógica de rumarmos à neutralidade preenche-nos a todos e tem sido muito impulsionada pelas cidades, têm sido as cidades a liderar este tema”, referiu.
O vice-presidente acrescentou, ainda, que foi nesse sentido que foi criado o Pacto do Porto para o Clima. Trata-se de “um compromisso de todos” e, prova disso, foi que “rapidamente teve centenas de subscritores, entre eles instituições, que queriam contribuir”.
Esta primeira sessão contou, também, com quatro intervenções – uma de Rui Pimenta, administrador da Agência de Energia do Porto; outra de Jorge Sousa, diretor do Serviço de Instalações e Equipamentos do Centro Hospitalar Universitário de São João; outra de João Peças Lopes, professor catedrático da FEUP; e ainda outra de Carlos Sampaio, CEO da Elergone Energia. No fim das reflexões de cada um, houve espaço para um debate entre todos, moderado por Rui Pimenta, seguido de uma sessão de esclarecimento ao público presente.
Projetos de energia solar no Porto
“Portugal tem 2300 a 3000 horas de sol por ano. A Alemanha tem 1700 horas, mas, mesmo assim, é o país com o maior índice europeu de energia fotovoltaica. Estamos claramente atrasados e temos que continuar a impulsionar este tema”, afirmou Rui Pimenta.
Ainda assim, apesar desse atraso nacional, o administrador da Agência de Energia do Porto ressalvou que a cidade do Porto já tem feito avanços notáveis na implementação de energias renováveis, principalmente a energia solar fotovoltaica que, segundo o responsável, “é a mais adequada para o nosso território”.
O Porto Solar foi um dos projetos referidos pelo responsável: “O Porto Solar é um projeto que está em fase final e que abrange 25 escolas”. Trata-se de uma iniciativa que instalou painéis solares em vários edifícios do município, entre os quais estão 25 escolas, de forma a torná-los autossuficientes.
Além deste projeto, há ainda outras iniciativas em desenvolvimento, como a instalação de 6MW de painéis fotovoltaicos em edifícios de habitação social no Porto, bem como a criação da primeira comunidade de energia renovável no bairro de habitação social Agra do Amial, “que se encontra em conclusão do licenciamento”.
Os apoios para esta finalidade foram outros dos pontos abordados por Rui Pimenta, que destacou o incentivo do município do Porto sobre o IMI para quem apostasse na instalação de renováveis, bem como um balcão de aconselhamento enquadrado com o Porto Energy Hub, que presta apoio a qualquer cidadão que precise de informações ou esclarecimentos tendo em vista o processo de instalação de produção fotovoltaica ou tendo em vista aumentar a eficiência energética da sua habitação ou empresa.
Consumidores passam a ser produtores de energia
O objetivo da descarbonização está na base de todos estes projetos e iniciativas que se querem sustentáveis e João Peças Lopes acrescentou, ainda, que, para isso, “os consumidores também vão passar a ser produtores de energia”. “Este é o cenário que vai consolidar-se nos próximos anos”, disse.
No entanto, segundo o professor da FEUP, para que esse cenário se consolide é extremamente necessário haver uma eficiência energética: “É importante que os consumos sejam deslocados, para que coincidam com momentos em que a energia renovável é mais forte. Para isso, é preciso implementar aparelhos que comuniquem com eletrodomésticos, como máquinas de lavar roupa ou louça, sistemas de aquecimento, etc, a fim de que se desloque os consumos para coincidirem com o período de maior fonte de energia renovável. Isto traduz-se numa eficiente utilização da energia e numa redução na fatura de eletricidade”.
Ainda assim, apesar das vantagens associadas a este sistema, João Peças Lopes reforçou a ideia de que há coisas que precisam de ser mudadas e melhoradas para que esta implementação seja possível e eficaz. “Claro que tudo isto tem implicações. Todo o paradigma do sistema elétrico muda, é preciso fazer investimentos em hardware, em sistemas de armazenamento, na sensorização do sistema e em novas ferramentas de gestão”, afirmou.
A realidade energética do Hospital de São João
Dentro dos consumos de energia de uma cidade, os hospitais têm um peso considerável e, estando esta sessão do Ciclo de Conversas relacionado com o tema da energia no município do Porto, falar do Hospital de São João seria inevitável, até pela enorme área que ocupa e pelo alto consumo energético que tem.
“O São João tem 200 mil m2 e gasta mais de 5 MW no final da manhã”, revelou Jorge Sousa. Ainda assim, o responsável garantiu que “toda a atividade de ambulatório tem pegada zero”.
Contudo, o diretor do Serviço de Instalações e Equipamentos do Centro Hospitalar Universitário de São João alertou para o facto de que “um hospital está em mutação constante, isto porque qualquer hospital, ao fim de 10 anos, consome mais energia porque está sempre a colocar novos equipamentos lá dentro”. Ou seja, isto leva a que, mesmo que se consiga melhorar a sua eficiência energética, têm que estar em constante atualização, uma vez que são os equipamentos que mais consomem no hospital.
Por essa razão, e com vista a implementar soluções efetivas, o hospital de São João começou por fazer alterações na própria estrutura do edifício. Primeiro mudou as coberturas que tinha em fibrocimento para painéis sandwich, o que, de acordo com o responsável, trouxe uma diferença notória à temperatura do hospital, mesmo sem aparelhos de aquecimento ou de refrigeração do ar, e depois ainda isolou todos os envidraçados.
Posteriormente, o hospital ainda construiu uma central de trigeração, usada até hoje: “Em 2009/2010, o hospital tinha caldeiras a nafta que, quando ligadas, lançavam um fumo negro visível a quilómetros de distância. Em 2011, substituímos e montamos uma central de trigeração. Essa central permitiu um conjunto de distribuição de linhas que alimenta, inclusive, a faculdade”.
E o retalho alimentar? Como se torna mais sustentável?
Depois do desempenho energético nos edifícios empresariais, de habitação e de saúde, vem também outro aspeto fundamental para a vida humana: a alimentação. E como é que o setor do retalho alimentar se pode tornar mais sustentável e contribuir para a descarbonização dos municípios e do país?
De acordo com Carlos Sampaio, os três desafios estão no “consumo de energia dos edifícios, nos transportes e no gás frigorigéneo”. No caso particular da Sonae MC, foi montado um roadmap capaz de contribuir para os objetivos do Acordo de Paris de garantir que o Planeta não aquecia mais de 1,5ºC até 2030 e a exigência da SONAE é de que a operação da SONAE MC seja neutra até 2040. O responsável afirmou que, pelo menos até 2030, estas mudanças vão fazer-se ainda com combustíveis fósseis, uma vez que ainda não conseguem pôr a sua frota a hidrogénio por ser algo ainda “muito desconhecido”.
“A ideia é otimizar as frotas, ter camiões de última geração, montar centrais fotovoltaicas, otimizar a utilização dos equipamentos, ter horários flexíveis e teletrabalho, promover a eco condução, bem como o uso de bicicletas e, ainda, ter uma frota de veículos elétricos e rede de carregamento“, afirmou.
Dentro das iniciativas promovidas nas lojas, o responsável destacou duas – o Plug and Charge e a Happy Hour. A primeira trata-se de um serviço de carregamento de carros elétricos, que permite aos clientes deixarem os seus carros a carregar no estacionamento do supermercado enquanto fazem as suas compras, enquanto o segundo ainda é uma ideia a concretizar, mas que visa criar uma “Happy Hour” de carregamentos com a energia excedente gerada por lojas que tenham central fotovoltaica.
Qual o futuro?
Na conclusão da primeira sessão do “Ciclo de Conversas”, foram abordados alguns desafios que podem vir a acontecer com a massificação da produção distribuída de energia renovável, mas também as soluções para os mesmos.
João Peças Lopes começou por apontar a questão das subtensões, que acabam por ser mais propícias de acontecer com o uso de energia fotovoltaica, uma vez que as horas de maior luz se concentram num determinado período do dia, o que “pode levar a problemas de qualidade no serviço e de congestionamento”.
Por sua vez, Jorge Sousa alertou para o facto de, com esta opção, haver mais probabilidades de cortes energéticos, uma vez que não há uma constância na chegada de energia. Assim sendo, o responsável do hospital de São João realçou a necessidade de continuar a usar o gás natural para garantir que estes cortes não influenciam o bom funcionamento do hospital e ainda acrescentou que “a mudança de paradigma para se deixar de usar gás natural tem de vir de cima”, ou seja, do governo.
Já Carlos Sampaio não hesitou em afirmar que não tem dúvidas de que o mundo tem de passar por esta transição energética, no entanto também é da opinião de que “tem de haver o estímulo correto para que isso aconteça”.
A solução, de acordo com João Peças Lopes, “começa na produção, que deverá ser limitada através de conversores para não se chegar às subtensões, e passa pela flexibilidade da procura e pelo armazenamento“. “Neste momento, a rede ainda não está preparada para essa produção massiva, mas existem soluções e têm que partir de todos os que estão envolvidos no processo”, concluiu.
Pode, ainda, ouvir a conferência em podcast, aqui:
A segunda sessão do Ciclo de Conversas, dedicada ao tema da “Mobilidade Sustentável” decorre no dia de hoje, às 18 horas, no Porto Innovation Hub.
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