Vítor Bento, presidente do júri dos IRGAwards 2023, aponta para a necessidade de mudar a governance para "tirar o maior partido dessas circunstâncias [geopolíticas e geoeconómicas] favoráveis".
Vítor Bento é presidente do júri dos IRGAwards 2023, edição que, neste ano, é dedicada à inclusão social e ao legado que ficará para as próximas gerações. Em entrevista por escrito ao ECO, o economista afirma que “Portugal, pela sua localização geográfica e pelas suas condições internas – segurança, instituições funcionais, enquadramento geopolítico – está bem colocado para beneficiar dos reajustamentos desencadeados por essas mudanças ao nível da geopolítica e da geoeconomia“.
O último ano trouxe-nos uma escalada da inflação e dos juros sem precedentes. Como é que as organizações estão a lidar com este novo normal?
Na generalidade dos casos, e até aqui, o ajustamento das empresas não tem sido difícil, pois a procura total da economia ocidental – procura interna + exportações – tem continuado elevada e tem permitido mesmo manter ou aumentar as margens dos negócios e manter níveis elevados de liquidez. As dificuldades aumentarão, eventualmente, se a economia se confrontar com um arrefecimento rápido e significativo, em resultado do aperto da política monetária para combater a inflação.
As empresas também têm um papel importante e responsável no combate a esta crise inflacionista, nomeadamente ao nível das decisões que tomam nos salários e nos preços, como lembrou recentemente o governador do Banco de Portugal. Considera que as empresas têm contribuído para aliviar ou agravar a crise?
As empresas fazem o seu papel reagindo às circunstâncias e aos incentivos com que são confrontadas. Por outro lado, quando se verifica um excesso de procura na economia – seja por estímulos excessivos, seja por constrangimentos na oferta – os preços são, pela sua natureza, os instrumentos e racionamento “racional” e mais eficiente. Reprimir o automatismo deste ajustamento implicará outras formas menos eficientes de racionamento, como a escassez pura e simples de bens e serviços. Como sinal mais positivo, estes choques não parecem ter desencadeado (ainda?) movimentos de auto-alimentação de uma espiral que torne a inflação mais difícil de controlar.
Não é preciso ir buscar a célebre frase de Adam Smith, parafraseando-a, de que não é da benevolência das empresas que esperamos o nosso bem-estar, para lembrar que o que as empresas fazem ou procuram fazer é, por natureza, para melhorar a vida das pessoas.
Temos ainda outra realidade em mutação: de tensões geopolíticas e de uma reversão acelerada do quadro de globalização. Do que precisa uma organização para tirar proveito destas mudanças e mitigar potenciais efeitos adversos?
Portugal, pela sua localização geográfica e pelas suas condições internas – segurança, instituições funcionais, enquadramento geopolítico – está bem colocado para beneficiar dos reajustamentos desencadeados por essas mudanças ao nível da geopolítica e da geoeconomia. Assim, a sua governance consiga ajustar-se para tirar o maior partido dessas circunstâncias favoráveis.
As lideranças estão a responder bem à ameaça cibernética? Estão devidamente preparadas para lidar com este risco?
Não vejo – pelos resultados que se têm observado – nada que sugira que não.
Ao nível do setor público, o último ano veio expor a fragilidade da governance do Estado, nomeadamente no poder executivo com casos e casos a envolver o Governo. Como é que se pode ter uma boa governance pública? Que medidas deveriam ser preparadas?
Sobre aquilo a que podemos chamar governance política – estrutura e funcionamento dos órgãos políticos – não me vou pronunciar neste fórum. Mas sobre governance da Administração do Estado – directa e indirecta –, a que chamo da governance pública, temos assistido, ao longo dos anos, a uma deterioração da sua qualidade. E que deveria merecer uma atenção mais dedicada, quer das estruturas políticas, quer da sociedade civil.
A edição deste ano dos Investor Relations Awards é dedicada ao tema “Building better futures, Together”. O que as empresas devem fazer e não estão a fazer para melhorar a vida das pessoas?
Não é preciso ir buscar a célebre frase de Adam Smith, parafraseando-a, de que não é da benevolência das empresas que esperamos o nosso bem-estar, para lembrar que o que as empresas fazem ou procuram fazer é, por natureza, para melhorar a vida das pessoas. Porque é isso – com a continuidade de negócio que a induzida satisfação social fomenta – que mantém as empresas vivas, activas e a crescer. Quem falhar nessa satisfação fica pelo caminho.
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“Portugal está bem colocado para beneficiar da geopolítica internacional”
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