BRANDS' ECO Ciclo de Conversas #6 – O sequestro de carbono
A sexta sessão do "Ciclo de Conversas - Rumo à Neutralidade Carbónica 2030", organizada pela CM Porto, teve como tema "O sequestro de carbono". O evento decorreu no Porto Innovation Hub.
O “Ciclo de Conversas – Rumo à Neutralidade Carbónica 2030” é uma iniciativa organizada pela Câmara Municipal do Porto, que conta com 10 sessões de esclarecimento e debate relacionadas com os temas da sustentabilidade, descarbonização e transição climática no contexto da neutralidade carbónica das cidades. A sexta sessão aconteceu na passada quinta-feira, dia 22 de junho, no Porto Innovation Hub, e teve como tema “O sequestro de carbono”.
Marta Pinto, Chefe da Divisão Municipal de Gestão Ambiental da Câmara Municipal do Porto, foi a moderadora do evento, que contou com a presença de Isabel Sousa Pinto, Professora na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto e Diretora no CIIMAR; José Paulo Silva, Diretor da Port’Ambiente (grupo Veolia); e João Gonçalo Soutinho, Presidente e Co-fundador da VERDE – Associação para a Conservação Integrada da Natureza.
Cada um dos oradores teve direito a uma intervenção, seguida de um espaço de debate e de esclarecimento com o público presente.
Na abertura da sessão, Marta Pinto começou por referir-se à “concentração excessiva de carbono na atmosfera”, que explicou ser dominantemente de origem humana. “Sabemos que esta concentração de carbono contribui para um aumento global da temperatura e é este aumento que tem impacto na delicada estrutura que regula o sistema climático global“, disse.
Marta Pinto alertou, por isso, que a principal forma de tirar carbono da atmosfera é não o colocar lá, é não o emitir: “No entanto, sabemos que vamos emiti-lo e que, principalmente, numa fase de transição, ele vai existir. Nesse sentido, são importantes as mudanças que estão a ser feitas ao nível da mobilidade, dos edifícios, da alimentação”.
"O Porto assumiu atingir a neutralidade carbónica em 2030, mas estamos perfeitamente conscientes que não é à custa do sequestro que vamos chegar lá, mas sim à custa, principalmente, da descarbonização. Por isso estamos a apostar em descarbonizar 85% e tentar compensar os restantes 15% de carbono que ainda vamos ter que emitir. E, mesmo assim, estes 15% parecem ser um grande desafio.”
Nesse sentido, Marta Pinto apontou as duas soluções disponíveis – as naturais e as tecnológicas: “Esta captura de carbono é um desafio porque ou vamos às grandes fontes emissoras de carbono e capturamos o carbono na fonte, ou então temos que o capturar a partir do ar e temos que o transformar. Estas soluções estão no início, são pouco maduras e pouco viáveis do ponto de vista económico. Aqui, na cidade do Porto, estamos a trabalhar já com as soluções de base natural, portanto, aquilo que o Porto tem tentado fazer é expandir as suas áreas verdes e requalificar. Entre os cálculos possíveis, no novo Parque da Alameda de Cartes que estamos a desenvolver, vamos ter a remoção anual de 28 toneladas de carbono num parque de 3,8 hectares“, referiu.
As várias tecnologias de captura de carbono
José Paulo Silva, Diretor da Port’Ambiente (grupo Veolia), trouxe para a discussão as várias possibilidades de captura de CO2 e apresentou o projeto embrionário que a Veolia está a desenvolver na Central de Valorização Energética da LIPOR.
“Ainda não falamos sobre parar as emissões, falamos apenas de abrandar o ritmo dessas emissões. Isso não é suficiente. Devíamos fazer uma analogia com a gestão de resíduos, em que a primeira medida é reduzir, depois reutilizar, e só se estas duas primeiras medidas não forem eficazes, é que entra a terceira medida, que é reciclar. Se a reciclagem não for possível, entram as outras tecnologias. Com o carbono devia ser a mesma coisa, a primeira grande medida deveria ser evitar as emissões“, começou por dizer.
Nesse sentido, o responsável da Port’Ambiente apresentou as várias etapas da captura de CO2. Uma delas é a opção de captar o carbono da atmosfera que, segundo ele, provoca emissões negativas, uma vez que retira CO2 que está disperso na atmosfera. “Esta é a solução mais virtuosa no tempo atual”, afirmou. Outra das opções é começar por capturar o CO2 biogénico (de origem não fóssil), que é aquele que não decorre do impacto da ação humana: “Portanto, como não decorre da ação humana, se começarmos por procurar capturar o CO2 biogénio criamos as emissões negativas”.
Em termos de tecnologias, João Paulo Silva confessou que a primeira opção não é a mais fácil, “isto porque seria mais fácil capturar o CO2 quando ele está concentrado, o que não é o caso no ar, onde há outros gases misturados“. Ainda assim, sendo uma opção viável, o responsável explicou que essa captura poderá ser feita por absorção ou por adsorção.
"Na absorção são utilizados solventes que vão absorver o CO2 contido em gases de combustão. Já na adsorção há outro componente ao qual o CO2 vai aderir e vai ser retido por essa forma. Mas depois da captura, o que fazemos? Uma opção é o armazenamento, em que o CO2 é injetado no solo em formações geológicas de grande profundidade. Outra opção mais interessante é dar uma utilidade ao CO2, nomeadamente para os refrigerantes da indústria alimentar, para materiais de construção ou, ainda, para produzir combustíveis alternativos aos combustíveis fósseis.”
O projeto embrionário que a Veolia está a desenvolver com a Lipor vai ao encontro desta última possibilidade – a de produzir combustíveis alternativos. “A Central de Valorização Energética da LIPOR (na LIPOR II) produz 300 mil toneladas por ano de CO2. Cerca de 60% são de origem biogénica e o objetivo é que, com essa captura de CO2, se consiga produzir combustível sintético para a aviação”, concluiu.
As árvores como aliado no sequestro de CO2
Por sua vez, João Gonçalo Soutinho, Presidente e Co-fundador da VERDE – Associação para a Conservação Integrada da Natureza, explicou de que forma as árvores podem ser um aliado no sequestro de carbono. O responsável explicou que esteve a analisar as árvores de Lousada, que considera serem muito semelhantes às do Porto, e chegou à conclusão que os carvalhos são o tipo de árvore com maior importância para a biodiversidade.
Nesse sentido, o responsável explicou que se começaram a discutir ideias para salvaguardar estas árvores: “Chegamos à conclusão de que tínhamos de envolver as pessoas, de reconhecer os proprietários, de lhes mostrar que estas árvores valem enquanto são vivas, e que devemos preservar o que existe”.
Foi também com base nesta conclusões que surgiu a VERDE, em 2021, “uma associação ambiental que implementou o Carbono Biodiverso, que é um projeto de compensação de empresas e cidadãos, onde os proprietários de terrenos podem receber dinheiro para geri-los de forma correta e manter as árvores como estão”.
"Quanto mais as árvores crescem, mais cresce o valor da sua biodiversidade. Em média, cada uma das árvores gigantes tem 1.3 toneladas de carbono, convertido para CO2 são quase cinco toneladas. À medida que as árvores se mantêm cá, não só ajudam a manter esse carbono em si, como ajudam a retirar mais da atmosfera, à volta dos 150kg de CO2 por ano, o que não é muito, mas é alguma coisa.”
João Gonçalo Soutinho terminou a sua intervenção fazendo o alerta para o facto de que, “mais importante do que plantar árvores, é cuidar das que já estão plantadas. Se se cortar uma delas, mesmo que se tenha plantado muitas, vamos estar a perder, isto porque um ano de sequestro de carbono de árvores gigantes é equivalente aos primeiros 15 anos de árvores que acabamos de plantar”.
Potencial dos oceanos para o equilíbrio
Isabel Sousa Pinto, Professora na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto e Diretora no CIIMAR, também abordou o papel das florestas no sequestro de carbono, neste caso das marinhas. “O oceano já contribuiu muito para não estarmos pior do que estamos, isto porque já absorveu cerca de 90% do calor gerado pela acumulação de CO2 na atmosfera e absorve cerca de 25% a 30% de CO2 emitido anualmente“, referiu.
A responsável garantiu, por isso, que o oceano pode ser uma contribuição para as soluções dos problemas das alterações climáticas: “21% do esforço que teria que ser feito para atingir 1.5 de aumento da temperatura poderia, de alguma forma, vir do oceano, com as energias renováveis oceânicas, com mudanças no transporte marítimo, com soluções baseadas na natureza, com mudanças na maneira como fazemos a pesca e a aquacultura e com o armazenamento do carbono no fundo do mar”.
As algas são um fator fundamental neste tema, já que, à semelhança das árvores, conseguem contribuir para o sequestro de carbono. “As algas têm uma particularidade, isto porque elas estão assentes em rocha, portanto não se podem enterrar ali. O que acontece é que a biomassa dessas algas não é consumida, ela acaba por ir parar às praias e ao mar e, neste caso, há uma parte que vai afundar. E determinou-se que qualquer biomassa abaixo dos mil metros vai demorar milhares de anos a voltar à superfície, portanto considera-se que esse carbono foi sequestrado, mesmo que não esteja enterrado“, explicou.
No entanto, Isabel Sousa Pinto reconheceu um problema neste processo, que está relacionado com a dificuldade de saber a quantidade de CO2 que é sequestrado e com o desaparecimento das florestas marinhas a nível global: “Estas algas estão a regredir aqui em Portugal, aliás, florestas marinhas já só temos mesmo na zona norte e temos tentado perceber porque é que isto aconteceu. Sabemos que a temperatura é um fator, mas não é o único”.
"Estamos a tentar perceber o que podemos fazer para restaurar estas florestas. Vamos repovoar áreas que costumavam ter estas algas para que elas deem origem a novas florestas e estamos a tentar determinar a quantidade de carbono das ainda existentes, e onde poderá ir parar o carbono das florestas que estamos a plantar.”
A responsável concluiu a sua intervenção explicando que a vantagem das algas em relação aos outros ecossistemas é que é possível aumentar muito a sua produção, através de cultivos. “A ideia é aumentar o sequestro de carbono através deste cultivo”, concluiu.
Pode ouvir a conferência em podcast aqui:
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