Governo atira para as autarquias aumento do IMI sobre as casas
A atualização do valor da localização das casas, que deverá arrancar no próximo ano, só terá impacto no bolso dos proprietários se os próprios ou as câmaras pedirem uma reavaliação do imóvel.
A atualização do valor da localização das casas, que deve arrancar no próximo ano, só terá impacto automático no Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) se os próprios proprietários ou as câmaras pedirem uma reavaliação do imóvel.
Apesar de o Governo ter esse poder, o Ministério das Finanças afastou ao ECO a intenção de pedir uma revisão automática do valor patrimonial tributário (VPT), que iria, então, resultar numa subida do valor pago em IMI. Desta forma, o aumento só vai acontecer caso os proprietários ou as câmaras solicitem ao Fisco uma nova avaliação do VPT, que, por sua vez, com a revisão do zonamento, vai resultar num valor superior do imóvel.
“Aquando da aprovação de novos zonamentos – o que nunca terá impacto em 2024 –, as revisões não se refletem direta e imediatamente no IMI a pagar, sendo apenas aplicados nos casos em que se verifique uma nova avaliação do imóvel, designadamente, a pedido do proprietário”, disse ao ECO fonte oficial do ministério liderado por Fernando Medina.
O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Nuno Félix, revelou, em entrevista ao Jornal de Negócios/Antena1, que a Comissão Nacional para a Avaliação dos Prédios Urbanos (CNAPU), que reúne a Autoridade Tributária (AT), representantes dos municípios, dos proprietários, dos inquilinos e dos avaliadores, vai ter “um trabalho a fazer neste domínio ao nível daquilo que é o redesenho do zonamento, mas também ao nível daquilo que é olhar para o valor médio do construção”. “É um trabalho que a CNAPU desencadeará brevemente, mas que tem de ser necessariamente articulado com os municípios”, acrescentou.
Porém, o ECO sabe que a atualização dos coeficientes do zonamento só deverá arrancar no próximo ano ou mais tarde. E os trabalhos só estarão concluídos lá para 2026, ano de eleições legislativas e de conclusão do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
Só quando este processo estiver concluído é que poderá ter impacto no aumento do IMI. E para que tal aconteça, “é necessário que o proprietário ou o município solicite a reavaliação dos imóveis”, explicou ao ECO Sara Almeida, fiscalista e sócia da Espanha e Associados, acrescentando que “tal pedido só pode ser feito se já tiverem decorridos três anos desde a última avaliação”.
Como a localização “é a parcela que mais pesa na fórmula do valor patrimonial tributário (VPT)”, segundo Luísa Casimiro da Costa, fiscalista da Abreu Advogados, “é natural que a atualização de tal coeficiente tenha um impacto significativo na subida do IMI”.
Há, contudo, situações em que é obrigatória uma nova avaliação, o que levará a um agravamento do IMI, caso o processo avaliativo decorra logo após a atualização do valor da localização do prédio. “Quando o proprietário realiza obras de fundo no imóvel como reabilitação, construção de mais um piso ou de uma piscina ou quando compra uma casa nova, acabada de construir, tem de entregar o modelo 1 do IMI à Autoridade Tributária, o que desencadeará o processo de avaliação do valor patrimonial”, esclarece Ricardo Reis, fiscalista da Deloitte.
“Em Lisboa e Porto, a revisão do VPT vai ter certamente impacto face à quantidade de obras em curso para construir habitação. Concluídas as casas, tem de ser feita a avaliação do VPT para apuramento do IMI a cobrar”, alerta Luísa Casimiro da Costa, da Abreu Advogados.
Já o Imposto Municipal Sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), que é pago no momento da compra do imóvel, não sobe por via da atualização do VPT, uma vez que “este imposto incide sobre o maior valor entre estes dois: VPT e valor da compra”, ressalva Ricardo Reis. Nos últimos anos, e face ao aumento vertiginoso dos preços da habitação, não é provável que o valor patrimonial tributário ultrapasse o valor de mercado.
Do mesmo modo, o Imposto do Selo (IS) que é cobrado ao comprador de uma habitação não vai sofrer alteração alguma, a não ser que o vendedor ou a autarquia peça nova avaliação do valor patrimonial. “Só no caso das doações é que é obrigatória a atualização do valor património no registo predial, pelo que estes casos também deverão sofrer um aumento do IS”, de acordo com Ricardo Reis, da Deloitte.
O Ministério das Finanças esclarece ainda que “a última revisão estava prevista para 2018/2019 e não ocorreu em face do contexto pandémico” e que, por isso, “se prevê que a CNAPU reinicie brevemente esses trabalhos”. Tendo em conta “a complexidade daquela revisão do zonamento, envolvendo a CNAPU, as autarquias e os peritos regionais e locais, aqueles trabalhos não ficarão concluídos no corrente ano e, consequentemente, não produzirão efeitos em 2024”.
O valor cobrado em IMI é calculado através da multiplicação do VPT do imóvel pela taxa do imposto, que, para os prédios urbanos, varia entre 0,3% e 0,45%. Já os municípios em resgate financeiro ou abrangidos por programas de apoio à economia podem aplicar uma taxa máxima de 0,5%. As taxas são fixadas anualmente pelos municípios da área de localização dos imóveis e comunicadas à AT até 31 de dezembro de cada ano.
A receita deste imposto cabe à administração local. No Orçamento do Estado para 2024, as câmaras deverão arrecadar 1.539,8 milhões de euros, o que corresponde a uma subida de 3% ou de 45 milhões de euros em comparação com este ano.
As propostas de atualização dos coeficientes de localização são apresentadas pela Associação Nacional de Municípios Portugueses à CNAPU, que as valida e submete à aprovação do Governo. Mas, até ao momento, as autarquias ainda não foram ouvidas sobre a revisão do zonamento. “A Associação Nacional dos Municípios ainda não foi ouvida sobre esta matéria no atual mandato”, disse ao ECO fonte oficial, recusando comentar a intenção do Governo.
Proprietários dizem que revisão do valor dos imóveis é antiga
Ao ECO, o presidente da Associação Nacional de Proprietários disse que “já se fala desta intenção há muito tempo, mas ficou em standby“. António Frias Marques diz que “não está alarmado” com a revisão do zonamento, tendo dúvidas que a revisão do VPT de mais de seis milhões de imóveis seja um processo “exequível”.
Além disso, Frias Marques prevê que esta medida “não vai ter forte impacto” junto da maioria dos portugueses e sim sobre a classe alta e sobre os estrangeiros. Isto porque, são quem tem “as casas melhores situadas”. Para a maioria dos portugueses, “o impacto será pequeno porque a grande maioria das nossas casas estão muito mal situadas”.
Também o presidente da Associação Lisbonense de Proprietários diz ao ECO que a revisão do zonamento já esteve em cima da mesa. Mas Luís Menezes Leitão considera ser “preocupante” a intenção do Governo, vendo esta como “mais uma medida do Governo para aumentar os preços no imobiliário, numa altura em que estamos com um enorme aumento da carga fiscal”.
O representante dos proprietários sublinha ainda que “a subida do VPT vai resultar no aumento brutal do IMI” e acredita que “haverá pessoas a desistir de comprar casa”.
Numa altura em que o país enfrenta uma crise no acesso à habitação, a revisão do zonamento “é o contrário do que o Governo devia fazer para impulsionar a habitação acessível” e revela “falta de sensibilidade do Executivo” para resolver o problema da habitação, alerta Menezes Leitão.
Também o presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária (APEMIP), Paulo Caiado, diz ao ECO que a revisão do zonamento espelha a “necessidade” do Governo em “atualizar o coeficiente de localização devido à valorização das casas nos últimos anos. O VPT de muitos imóveis está desatualizado do valor de mercado, por isso, com esta medida, o objetivo do Governo é aumentar a receita fiscal”.
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