Fundada em 1973 e detida pela belga FN Herstal, a Browning Viana é uma das maiores fabricantes mundiais de armas de caça e desporto. Conheça a empresa minhota que quer "assaltar" a liderança italiana.
São 12h45. Muitos dos funcionários da Browning Viana já estão a regressar da hora de almoço. Para garantir que a produção não para, a pausa é dividida entre os trabalhadores que garantem o primeiro turno da fábrica localizada em Morenos – S. Romão de Neiva. O segundo turno haverá de começar pelas 15h e manter as máquinas a rodar até às 23h. Em conjunto, são produzidas diariamente 900 armas de caça e desporto, que seguem para países como os Estados Unidos, Bélgica ou Alemanha.
Criada em 1973 onde antes existia “um pântano”, a empresa de armas de Viana detida pelo grupo belga FN Herstal, é hoje uma das maiores fábricas de produção de armas de caça e desporto a nível mundial. Mas chegar aqui não foi um percurso sem sobressaltos. “Foi uma empresa que nasceu quase do nada. Havia um belga que morava aqui e conhecia umas pessoas do grupo FN Herstal. A partir daí criou-se um conjunto de condições que não existiam” para instalar a empresa, explica Rui Cunha, administrador da Browning Viana.
Depois de um crescimento “muito rápido” no início, a empresa entrou, nos anos 1990, num período de indefinição. As máquinas usadas para fabricar armas passaram a dedicar-se a outro outro tipo de “artilharia”, como tacos de golfe, raquetes de ténis ou pranchas de windsurf.
“A certa altura foi feita uma aposta na área do desporto, além das armas”, explica o administrador. E assim foi durante cerca de 15 anos, até o grupo acabar com essa divisão e voltar a focar no negócio core. Saíram os artigos de desporto, manteve-se a produção de armas. A fábrica de Viana cresceu dentro do grupo, em números e importância.
“Nos últimos anos fizemos a nossa parte – aumentar a competência, organização interna da fábrica, aumentar a produção – e houve um reconhecimento por parte do grupo de que havia consistência da nossa parte, não só ao nível da mão-de-obra, mas também ao nível da engenharia”, detalha Rui Cunha. A empresa minhota conseguiu mudar a imagem no grupo e “a importância da fábrica disparou nos últimos anos”.
Com uma produção anual de cerca de 174 mil armas e preços unitários que oscilam entre 600 e 7.000 euros – nos próximos anos a capacidade de produção vai aumentar para 200 mil –, a Browning Viana ambiciona alcançar a liderança mundial no fabrico de armas de caça e desporto. Um objetivo que não está muito distante. “O grande adversário é o grupo italiano Beretta, que é líder mundial na divisão civil — e depois deles seremos nós”, explica Rui Cunha. Para desarmar a rival italiana, está a investir em tecnologia de ponta e a terminar um investimento de 21 milhões de euros, ao qual será adicionado um outro “envelope” de 10 milhões, para os próximos quatro anos.
Robôs tomam fábrica de assalto
Do trabalho na madeira, aos polimentos e à montagem, esses sinais de maior modernidade são já visíveis. Num espaço agora ampliado, que ainda está à espera de ser ocupado com novas máquinas, os dois novos robôs destinados a fazer o polimento destacam-se com o seu braço metálico. O objetivo é prosseguir esta modernização, automatizando a pintura das armas e o tratamento de superfície, assim como a mecanização de outras peças. Uma aposta na engenharia que vai, por um lado, aliviar os operários destas tarefas mais “físicas e desgastantes” e, por outro, dar maior estabilidade ao processo, realça o responsável.
A internalização, já a partir de 2024, da produção de canos na fábrica – antes importados – é outra das apostas da empresa. Numa fase inicial serão fabricados in house perto de 80 mil canos (os outros continuam a ser garantidos pela casa-mãe). Uma nova linha de produção que resultou de um investimento de oito milhões de euros e que é “uma referência no grupo”.
O administrador da Browning Viana destaca a importância desta modernização também ao nível da retenção de talento. “O que está previsto aqui é uma carreira de tiro para teste de novas armas e continuar a fazer um investimento em tecnologia”, nota, acrescentando que este investimento em equipamento de produção pretende precisamente combater a dificuldade de atração de pessoal jovem.
Rui Cunha destaca ainda as condições “acima da média”, com um pacote salarial base de 1.075 euros, distribuição de resultados, seguro de saúde e um fundo de pensões. “As questões sociais são uma das grandes preocupações”, esclarece, calculando que, nos últimos dois anos, o aumento salarial global dos 620 trabalhadores da fábrica foi na casa dos 11%. “É cada vez mais difícil encontrar pessoas e retê-las é o desafio”, sintetiza. Com a maior automatização de processos, a expectativa é que os funcionários sejam mais especializados para responder aos desafios, num mercado global.
Eleições nos EUA? Democratas são bons “agentes de marketing”
Com praticamente toda a produção destinada à exportação, os Estados Unidos são responsáveis por cerca de 70% das vendas da empresa de Viana. Num mercado onde a procura “tem continuamente vindo a aumentar”, Rui Cunha destaca alguns eventos particulares que mexem com o negócio, nomeadamente as eleições. “Outro fator cíclico [que influencia a procura] é a questão das eleições. Quando os democratas estão no Governo, a venda de armas dispara”, refere o administrador da Browning Viana.
“Há uma piada nos Estados Unidos em que dizem que o maior agente comercial que tiveram foi o [Barack] Obama. Foi um pico enorme quando ele foi eleito”, brinca Rui Cunha. Já no período pré-eleitoral, como aquele que está prestes a ser iniciado, a tendência é para uma estabilização no negócio.
Para armas de caça e desporto, a questão das guerras não impacta positivamente. Não é por isso que se vai mais à caça ou ao tiro aos pratos.
Mas há outros acontecimentos que mexem com o negócio das armas. Perante um ambiente dominado pela escalada de conflitos, seja no Leste da Europa, seja no Médio Oriente, Rui Cunha admite que estes eventos são positivos para a divisão de defesa, uma vez que os países tendem a reforçar o orçamento para a compra de armas. “Para armas de caça e desporto, a questão das guerras não impacta positivamente. Não é por isso que se vai mais à caça ou ao tiro aos pratos”, conclui o administrador da Browning Viana.
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