“Em muitos setores do nosso país a imigração faz parte da força de trabalho”

No ano passado, o negócio de ride-hailing da Bolt cresceu 50% e o número de motoristas ligados à plataforma 30%, revela Mário de Morais, responsável por esta área da empresa.

“Não há uma preponderância de um tipo de nacionalidade ou de classe. Geralmente, são pessoas que tinham outras opções, se calhar com salários mínimos ou similares, e que veem neste setor uma oportunidade de trabalhar de forma mais flexível e conciliar com outro tipo de coisas e fazer um extra”. É desta forma que Mário de Morais descreve os condutores que usam a plataforma de transporte de pessoas Bolt.

O novo responsável em Portugal da área de ride-hailing da empresa estoniana diz estar atento aos casos que ligam redes ilegais de imigração ao setor de TVDE como um todo, mas diz serem casos isolados num conjunto de centenas, milhares de viagens que correm bem.

No ano passado, a empresa, que viu crescer em 50% o seu volume de negócio, aumentou em 30% o número de motoristas. Seria possível esse crescimento e responder ao aumento da procura sem o contributo dos condutores imigrantes?

“Acredito que o setor se adaptava e continuávamos a ter o serviço. Em muitos setores do nosso país a imigração faz parte da força de trabalho. Não acho que seja diferente, nem acho que estejamos a promover”, diz o gestor, em entrevista ao ECO, a primeira desde que assumiu funções.

Uma operação conjunta da PSP e da GNR para a fiscalização de condutores de TVDE, abrangendo 1.444 condutores, detetou motoristas que não tinham contrato escrito com prova de relação laboral com um operador de TVDE e casos de operadores sem licença. Fala-se de situações em que o motorista que chega não é o indicado na aplicação. O que estão a fazer para garantir que isso não aconteça?

Pode ter acontecido no passado, em 2021-2022, aos dias de hoje temos selfies checks. É pedido ao condutor para fazer uma selfie de forma aleatória. Tem que validar que é ele, se o não for e se fizer logoff para alguém fazer login noutro sítio, fica automaticamente bloqueado, por fraude do serviço. Hoje isso seria uma situação muito rara de acontecer. Em relação aos operadores TVDE, terá de ter uma licença do IMT. O operador chega-nos a nós, e aos nossos concorrentes, com uma licença. Em relação aos contratos, o mercado está estruturado. Temos plataformas, operadores, os operadores têm motoristas que podem ser contratados ou podem querer ter flexibilidade e ser um trabalhador independente.

Aos dias de hoje temos selfies checks. É pedido ao condutor para fazer uma selfie de forma aleatória. Tem que validar que é ele, se o não for e se fizer logoff para alguém fazer login noutro sítio, fica automaticamente bloqueado, por fraude do serviço.

Não conheço o contexto legal dessas inspeções para perceber que tipo de contrato procuravam, mas grande parte dos motoristas podem estar, se o quiserem, como trabalhadores independentes e muitas vezes querem, pois dá-lhes flexibilidade de complementar com outro trabalho, de fazer determinados períodos horários e não estarem restringidos a um contrato rígido que, se pensarmos no setor, não faz muito sentido. Fará sentido dar esta flexibilidade, mas é uma gestão que passamos para o operador de TVDE. Garantimos é que o motorista tem todos os documentos legais para exercer a atividade e, a partir desse momento, o operador de TVDE escolhe o modo com que trabalha com ele.

Discute-se muito as redes ilegais de imigração que têm trazido muitos imigrantes indostânicos para o setor, há notícias de motoristas encontrados a dormir na bagageira dos carros.

É um caso isolado num grupo de centenas, milhares de viagens que correm bem. É um caso que me preocupa muito, porque tem uma repercussão grande na imagem do setor. Um motorista tem que ter um certificado emitido pelo IMT, tem de ter documentos oficiais. Garantimos que os documentos estão todos certos e temos feito um grande esforço, muito no ano passado, em assegurar que não há ninguém com um documento desatualizado na nossa plataforma. Toda a gente que está a trabalhar tem documentos em dia emitido pelas autoridades. Em cima disto, lançamos, obviamente features na aplicação, como o botão de pânico, quando a aplicação deteta anomalias na viagem.

A nossa luta e o nosso objetivo é que o serviço seja de qualidade. Quem o presta, tem de ser uma pessoa que o presta com qualidade. Se vem do Brasil, se é português ou de outro país, desde que esteja dentro da lei e faça um bom serviço deverá ser bem recebido, como em qualquer outro setor. Obviamente, estamos atentos a todos estes casos e controlamos, dentro do que nos permite a lei e do que é possível. São casos pontuais que, infelizmente, nos preocupam muito porque trazem esta imagem. Mas a maioria das viagens tem corrido mesmo muito bem e com bons ratings. Felizmente, a qualidade de serviço tem vindo a aumentar nos últimos meses. O setor talvez tenha passado por uma altura menos positiva, mas está a recuperar.

Mário De Morais, o novo responsável de Ride-hailing da Bolt em Portugal, em entrevista ao ECO - 17JAN24
Mário De Morais, o novo responsável de Ride-hailing da Bolt em Portugal, em entrevista ao ECOHugo Amaral/ECO

Mas quem são neste momento as pessoas que conduzem para a Bolt? Pode traçar o seu perfil?

Os motoristas que trabalham para as operadoras de TVDE e que usam a plataforma Bolt são variados. Normalmente, são pessoas que procuram flexibilidade de emprego. Não posso partilhar dados dos perfis demográficos. É algo que não fazemos, mas é muito variado. Não há uma preponderância de um tipo de nacionalidade ou de classe. Geralmente, são pessoas que tinham outras opções, se calhar com salários mínimos ou similares, e que veem neste setor uma oportunidade de trabalhar de forma mais flexível e conciliar com outro tipo de coisas e fazer um extra.

Mas quantos motoristas interagem convosco?

Não posso partilhar esse número. Mas, como disse, crescemos 50% a nível de volume e 30% a nível de motoristas.

A nossa luta e o nosso objetivo é que o serviço seja de qualidade. Quem o presta, tem de ser uma pessoa que o presta com qualidade. Se vem do Brasil, se é português ou de outro país, desde que esteja dentro da lei e faça um bom serviço deverá ser bem recebido, como em qualquer outro setor.

Esse crescimento deve-se em muito ou em parte à imigração? Seria possível hoje operar em todo o país como pretendem, responder ao aumento da procura, sem o contributo das pessoas que chegam a Portugal?

Depende da perspetiva. Há, de facto, uma percentagem de pessoas imigrantes ou que não são de nacionalidade portuguesa, mas que são brasileiras, que vieram do Leste. E há muitos portugueses na plataforma. Não lhe consigo responder concretamente à pergunta, acredito que o setor se adaptava e continuávamos a ter o serviço. Em muitos setores do nosso país a imigração faz parte da força de trabalho. Não acho que seja diferente, nem acho que estejamos a promover.

Como é que olha então para discursos anti-imigração de partidos como o Chega? Faz sentido num país que tem falta de mão de obra?

Faz sentido promovermos a qualidade. Como já disse, se um imigrante vem para cá de forma legal, faz todo o processo legal para entrar em qualquer setor como o nosso, quer trabalhar, faz um bom serviço e se há trabalho para ele, não me oponho a isto. Tal como nós, portugueses, vamos por outros países, muitas vezes trabalhar e já tivemos várias vagas de emigração ao longo da nossa história. Sempre fomos um país muito aberto ao mundo. Primeiro nós fomos, depois vieram. Não vejo que deva ser uma restrição só porque sim. Obviamente, temos que garantir que as pessoas vêm com qualidade e que querem contribuir para um país melhor.

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