BRANDS' ECO “A IA Generativa não será o fim do low-code”

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  • 9 Fevereiro 2024

Rui Gonçalves, Partner de Technology Consulting da KPMG Portugal, partilhou, em entrevista ao ECO, algumas das conclusões do estudo "Low-code adoption as a driver of digital transformation", da KPMG.

A transformação digital tem vindo a alterar o panorama empresarial global, ao mesmo tempo que leva as empresas a procurarem alternativas inovadoras para se manterem competitivas. Neste contexto, o low-code tem-se destacado como uma ferramenta essencial no desenvolvimento de software, até pela agilidade e eficiência que confere às empresas.

Para aprofundar a compreensão dos benefícios e desafios desta tecnologia, a KPMG conduziu o estudo “Low-code adoption as a driver of digital transformation, que analisou empresas da Europa, África e da região da Ásia-Pacífico.

Em entrevista ao ECO, Rui Gonçalves, Partner de Technology Consulting da KPMG Portugal, partilhou alguns insights deste estudo, tais como as implicações do low-code nas estratégias empresariais, e ainda a forma como esta inovação não só otimiza a eficiência operacional, mas também molda o futuro das organizações num mundo cada vez mais digital.

De acordo com o estudo Low-code adoption as a driver of digital transformation, da KPMG, a tendência global para a adesão ao low-code varia de região para região. Prova disso são os dados do estudo, que mostram que 31% das empresas inquiridas considera o low-code como parte integrante da sua estratégia de desenvolvimento, mas nestas destacam-se as empresas de África (34%) e na região de Ásia-Pacífico (32%). A que se deve esta aposta maior em low-code nestas regiões?

Alguns dos fatores que impulsionam a variação da adoção de plataformas de low-code nestas regiões (nomeadamente em África), poderão ser a falta de infraestruturas de TI tradicionais e uma maior escassez de competências técnicas.

A elevada taxa de adoção em África pode também ser atribuída à necessidade de uma abordagem ágil e rápida para dar resposta às inúmeras mudanças nos ambientes de negócios predominantes em muitos mercados africanos.

No caso das empresas europeias, os números mostram que a aposta em low-code teve um aumento significativo, de 19% para 31%. Qual o motivo deste aumento?

Existe uma combinação de fatores que justificam o aumento mais acelerado na aceitação e integração de plataformas de low-code no panorama empresarial europeu. As plataformas de low-code podem reduzir significativamente tempo e custos de desenvolvimento em comparação com os métodos tradicionais. Não sendo uma característica exclusiva da Europa, os custos salariais e a escassez de competências face à procura podem ser elevados quando comparados com outras regiões e as empresas são atraídas pelo potencial de poupança de custos e inclusão de developers não-profissionais no desenvolvimento low-code.

Adicionalmente, muitas empresas europeias têm sistemas legados que necessitam de modernização e as plataformas low-code permitem desenvolver rapidamente aplicações que podem ser integradas nos sistemas existentes, facilitando o processo de modernização. A cultura de colaboração na Europa é propícia a abordagens mais inclusivas, envolvendo o negócio e o IT no processo de desenvolvimento.

Um fator particular na Europa é que esta tem algumas regulamentações rigorosas específicas para proteção de dados e segurança, como o RGPD e o DORA. Algumas plataformas low-code têm integradas funcionalidades de conformidade, facilitando a adesão aos requisitos regulamentares durante o desenvolvimento de aplicações.

No plano geopolítico, a exposição das empresas a diferentes geografias, especialmente quando essas geografias sofrem de instabilidade política e económica, a perceção de risco geopolítico influencia decisões para utilizar menos offshores de TI e recorrer mais a nearshores dentro do continente (principalmente em iniciativas mais estruturais).

A forte presença de vários fornecedores de plataformas low-code na Europa – oferecendo soluções localizadas e suporte adaptado às necessidades das empresas europeias – é também um dos fatores que contribui para esta rápida adoção de low-code.

No mesmo estudo, 81% das empresas inquiridas revelaram que consideram o low-code um fator-chave para acelerar o desenvolvimento, apontando como principais benefícios o aumento da eficiência dos processos (53%) e a produtividade dos funcionários (51%). Consegue dar exemplos práticos destes benefícios em cada uma destas áreas?

Partilho alguns exemplos de iniciativas que desenvolvemos com os nossos clientes em diferentes setores de atividade e que demonstram como as plataformas de low-code estão a ser aproveitadas para automação digital de processos, procurando agilizar e aumentar a eficiência de processos de negócio complexos:

  • Indústria automóvel: soluções para automatizar processos de controlo de qualidade. Podem automatizar auditorias de qualidade, capturar dados de sensores e dispositivos IoT e disparar alertas para desvios dos padrões de qualidade.
  • Banca de retalho: utilizam plataformas low-code para automatizar e agilizar processos de abertura de conta e concessão de crédito, criando aplicações à medida, personalizadas, digitalizar formulários, automatizar a verificação de documentos e identidade e acelerar o processo de aprovação.
  • Seguros: utilizar plataformas low-code com IA Generativa para automatizar e agilizar processos de gestão de acidentes, criando aplicações com inteligência para processar a “carta verde” sem intervenção manual.

    Rui Gonçalves, Partner de Technology Consulting da KPMG Portugal

Temos, ainda, alguns exemplos de iniciativas que desenvolvemos com os nossos clientes em diferentes setores de atividade e que demonstram como as plataformas low-code estão a ser aproveitadas para incrementar a produtividade dos colaboradores, ilustrativas da sua versatilidade para dar resposta rápida a desafios de produtividade em diferentes funções de negócios, impulsionando, em última análise, a eficiência e melhorando o desempenho organizacional:

  • Saúde: aplicação que desenvolvemos para as autoridades de saúde na Suíça, a fim de automatizar e gerir o processo de acompanhamento de pacientes com Covid que estão a recuperar em casa. Para maximizar a produtividade dos recursos da linha da frente (médicos e enfermeiros), libertando-os de tarefas com pouco valor acrescentado, criámos uma app que substitui a chamada telefónica regular para gerir as interações regulares com os pacientes, obter feedback, medir a evolução dos sintomas, recomendar atividades, etc… Note-se que, neste caso em particular, a utilização de low-code permitiu-nos entregar ao nosso cliente uma primeira versão da solução em menos de três semanas.
  • Departamentos de RH: utilizam plataformas low-code para desenvolver aplicações que automatizam o processo de onboarding de funcionários. Estas podem gerar listas de verificação de integração digital, facilitar a assinatura eletrónica de documentos e fornecer aos novos contratados acesso a materiais de formação e recursos da empresa, reduzindo assim a papelada manual e acelerando o processo de integração.
Outra vantagem fundamental apontada por 42% das empresas é a redução de custos. Qual a razão para ainda não haver uma maioria a pensar desta forma? Serão os custos iniciais associados que as fazem não ver esta redução?

Entendo que de forma indireta os casos que referi acima contribuem para uma maior eficiência de custos e que, de facto, é um dos temas mais relevantes quando se avalia a utilização de plataformas low-code.

É provável que, devido ao contexto económico atual, as TI irão estar sob pressão para contribuir e entregar ainda mais. Trabalhamos com muitos clientes que consideram o low-code para aumentar a rapidez do desenvolvimento de aplicação e, com a governação adequada, garantir maior controlo, consistência e conformidade, sem comprometer a eficiência, o time-to-market, a inovação e a entrega de experiências diferenciadoras aos utilizadores externos e internos.

O estudo Low-code adoption as a driver of digital transformation revela, ainda, que 64% das empresas ASPAC utilizam low-code para a automatização de processos, em comparação com 45% das empresas na Europa e 41% nos EUA. A que se deve esta diferença?

Embora o estudo não aponte razões específicas para esta diferença, baseado no portefólio de projetos da KPMG nestas regiões, entendemos que pode estar relacionado com uma maior diversidade de casos de uso de low-code na Europa e Américas, que faz com que a automatização de processos na ASPAC seja mais relevante em termos relativos.

Quais os principais desafios de segurança associados ao low-code?

Algumas plataformas de low-code têm funcionalidades de segurança para acelerar o security-by-design, facilitando a adesão aos requisitos e melhores práticas de segurança. Apesar desta vantagem, como em qualquer caso de desenvolvimento de software, as aplicações desenvolvidas com low-code podem conter vulnerabilidades de segurança.

Essas vulnerabilidades podem resultar da:

  • Falta de conhecimento técnico, que leva à introdução inadvertida de vulnerabilidades;
  • Integração com software de terceiros. Quando se utiliza low-code para desenvolver aplicações de nível empresarial, haverá necessidade de integrações com sistemas de terceiros. Essas integrações podem representar pontos de entrada para ataques cibernéticos;
  • Inexistência de padrões de segurança e conformidade que garantam que estejam alinhadas com as boas práticas de security-by-design.
Apesar dos benefícios associados ao low-code, 39% dos líderes empresariais inquiridos considera que este não pode ser utilizado para problemas e soluções complexos. Porquê?

O low-code pode não ser adequado para todos os casos de uso. Em algumas situações, as abordagens de codificação tradicionais ainda podem ser preferidas. No entanto, a adesão a esta tecnologia tem aumentado significativamente e é muito provável que continue a aumentar no futuro devido aos benefícios e eficiência que permite obter.

Claro que nestes 39% estão também os mais céticos em relação ao potencial das plataformas, por desconhecimento das capacidades, devido a casos de insucesso ou apenas por preferência.

Note-se que a sua adoção é muito diversificada e, se conhecemos casos de clientes que têm duas ou mais plataformas de low-code para dar resposta a desafios diferentes da sua arquitetura aplicacional, também há outros – onde se incluem os 39% – que posicionam estrategicamente o low-code apenas para a criação de soluções departamentais. Trabalhamos com alguns destes clientes que decidiram enquadrar o low-code apenas em iniciativas de democratização das TI, usando citizen developers (governados de forma adequada) para aumentar a comunidade dos profissionais do desenvolvimento, focando o low-code na redução da dívida técnica e “shadow IT” departamental.

Será possível contrariar essa tendência?

Acredito que a evolução das plataformas, mais literacia sobre low-code, aumento de casos de uso estruturantes de sucesso e a cada vez maior escassez de mão-de-obra especializada em tecnologia irá “naturalmente” contribuir para contrariar esta tendência.

Mais de metade das empresas inquiridas (54%), de acordo com o estudo, utilizam a IA em combinação com o low-code. Quais as vantagens desta estratégia?

Contrariamente a algumas notícias e artigos que surgiram quando se generalizou a utilização do OpenAI, a IA Generativa não será o fim do low-code.

Alguns analistas experientes com quem tenho conversado bastante sobre estes temas até acreditam que acontecerá o contrário. Nalgumas reflexões dessas discussões incluímos clientes e profissionais envolvidos em projetos que combinam low-code com IA:

  • A nova IA generativa pode produzir códigos complexos em milissegundos, a partir de instruções de linguagem natural (o inglês, por exemplo) – a barreira para o desenvolvimento de software nunca foi tão baixa;
  • Há muitas formas de IA e low-code (“desenvolvimento profissional”) coexistirem e crescerem juntos. Por um lado, o código gerado por IA (ainda) não substitui o desenvolvimento visual de ferramentas de low-code e a utilização de TuringBots aumentará drasticamente a adoção de low-code;
  • O SDLC (Software Development Life Cycle) continua complexo. O low-code, combinado com novas soluções como no-code e IA Generativa, pode aproximar as equipas de negócios e de tecnologia como equipas fluidas, transformando inovações em produtos;
  • A velocidade do low-code é ideal para permitir que os nossos clientes testem e adotem casos de uso de IA e IA generativa de forma rápida e em escala. Estamos, por exemplo, a construir casos de uso que utilizam GenAI para melhorar a experiência de self-service do cliente (por exemplo, chatbots e agentes de suporte virtuais), aumentando a qualidade da interação digital com o cliente;
  • Uso de IA generativa para migrar sistemas legados para plataformas modernas de low-code, reduzindo o risco, o custo e o tempo associados a programas de modernização tradicionais. Fazendo isso mais rapidamente, os nossos clientes reduzem o seu TCO resultante de reduzir contratos de manutenção dispendiosos e custos de licenciamento.
Como vê o futuro do low-code na prática empresarial?

Construir soluções de nível empresarial, transformar verdadeiramente um processo complexo ou automatizar digitalmente exige uma combinação de diversas tecnologias. Acreditamos que as plataformas low-code podem ser a “toolbench” estratégica a partir da qual as empresas podem impulsionar uma verdadeira transformação digital em grande escala.

Vemos a tecnologia low-code como um facilitador da jornada de transformação digital, uma vez que as principais tendências que definem o consumo de tecnologia pode ser endereçado com low-code.

A modernização de aplicações (incluindo sistemas centrais), a automação e a redução da dívida tecnológica são fundamentais para fazer isso de forma eficiente e permitir melhorias relevantes no modelo operacional.

Tal como refere o estudo, haverá a maior atenção e foco no Governance à medida que as plataformas low-code estão cada vez mais integradas nas empresas, definindo diretrizes e estruturas de governança para orientar e gerenciar iniciativas de low-code.

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