Mas a casa é minha ou é da vizinha?
A explosão do alojamento local parece causar urticária em algumas bancadas parlamentares. Há propostas para rever a lei. Até se admite ter os vizinhos a darem o aval sobre o que se faz lá em casa.
Bonjour. Aufidersien. Hola. Goodbye. E um olá? E um adeus, até já? Também há, claro, mas em muitos bairros portugueses, ouvem-se cada vez mais línguas diferentes. Veem-se pessoas de outras geografias, cruzam-se culturas, raças ou religiões. É o turismo. Não é de agora, mas parece que só agora faz mossa. Primeiro porque encheram as ruas (e os transportes públicos). Depois porque além dos hotéis começaram a viver nos prédios, nas casas… ao lado dos portugueses.
Até começarem a entrar na casa dos portugueses, estava tudo bem. Os estrangeiros trouxeram vida aos bairros históricos, fizeram-nos apreciar o nosso património. E mais importante ainda, trouxeram dinheiro. Muito dinheiro. Dinheiro para gastar, mas também deram força a um setor que vê nascer cada vez mais empresas, criando também cada vez mais empregos — a taxa de desemprego está já abaixo dos 10%, sendo o turismo um dos motores desta tendência positiva.
Muitos dos prédios onde estão essas casas que albergam hoje alemães, amanhã espanhóis, depois chineses ou norte-americanos, estavam como o pais quando chegou a troika: de rastos. Praticamente devolutas, sem grandes condições de habitabilidade. Ninguém lhes pegava. Até que, com o olho no negócio, muitos começaram a fazer contas às poupanças que rendem zero na banca. Comprar casas e colocar a arrendar passou a ser moda. Foi preciso gastar dinheiro, mas também se ganha dinheiro. E é assim que se faz. Investe-se agora para colher depois os frutos.
O Airbnb apenas veio facilitar o que há muito já se fazia. Veio descomplicar. E assim abrir todo um novo mercado em que do simples proprietário (que vai de férias e quer ter a casa a render) até ao investidor (que faz vida do arrendamento), todos ganham dinheiro com os turistas que nos últimos anos descobriram o país. Mas mais importante, ganham dinheiro e pagam impostos sobre o que ganham graças ao regime criado entretanto, o do alojamento local.
A explosão do negócio parece estar a causar alguma urticária nas bancadas parlamentares. Em causa está o impacto que este tipo de arrendamento está a ter no outro, o tradicional. Há cada vez menos casas para arrendar ao mês, o que faz com que os preços das rendas subam, subam e subam. E até os preços pedidos para comprar uma casa em Lisboa e Porto estão a acelerar a um ritmo que começa a gerar apreensão. Tanto cá como lá fora. Veja-se o alerta da Comissão Europeia. E até do Banco Central Europeu.
Não é mais do que o mercado a funcionar. Se há procura, e a oferta escasseia, os preços sobem. É assim há séculos. Mas parece que não. Parece que se quer mandar no mercado. Como? Revendo a lei. Há propostas de vários quadrantes. Desde as mais comedidas até às mais radicais. Há até, imagine-se, propostas para que se uma pessoa quiser colocar a casa no Airbnb tenha de se submeter à votação do condomínio. Estamos em 2017! Se a casa é minha, porque é que a decisão tem de ser da vizinha? Eu não digo à minha vizinha o que ela deve ou não fazer com a casa dela.
São propostas como esta que levam a questionar o porquê de se querer rever a fundo uma lei que veio trazer para a legalidade (leia-se, a pagar impostos) muitos que durante anos fugiram ao fisco. Que obrigaram a que menos tivessem de pagar mais dos seus rendimentos, muitos deles de classe média com impostos de rico, como diz Bagão Félix. Corrijam-se as falhas. Há sempre, claro, mas deixem o dinheiro continuar a circular. Deixem a economia funcionar. Os preços estão altos? Haverá uma altura em que estarão mais baixos. E aí, também vamos intervir? Vamos rever ou criar leis para fazê-los subir?
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