Menos impostos e burocracia, com fundos europeus voltados para a economia. O que os empresários querem do novo governo

As associações empresariais defendem uma aposta no reforço da competitividade e uma aposta nas exportações, argumentando que a redução do IRC e do IRS pode ajudar a dinamizar a economia.

Sem falar num “choque fiscal”, os porta-vozes das principais associações empresariais do país são unânimes: é preciso baixar a carga fiscal para famílias e para empresas. Além da vertente fiscal, realçam a importância de repensar o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e o PT2030 e alocar uma maior fatia destes fundos à economia, apostando na inovação e na tecnologia, para reforçar a produtividade e a competitividade das empresas nacionais.

O presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), Armindo Monteiro, reconhece que as propostas apresentadas pelos principais partidos têm mais economia, do que aconteceu em campanhas legislativas anteriores. Ainda assim, o representante dos partidos avisa que “é importante que esta discussão se faça de forma séria” e mais do que debitar medidas é preciso mostrar como se vai chegar lá, alerta.

Ao próximo Governo, os patrões pedem um conjunto de medidas que sejam capazes de dinamizar a competitividade da nossa economia e atrair investimento, sublinhando, desde logo, a necessidade de reduzir impostos. “Ser competitivo não é ter uma taxa de IRC de 31% e progressiva“, aponta Armindo Monteiro, em entrevista ao ECO. A CIP, no seu Pacto Social que apresentou aos partidos, defende a criação, de uma forma faseada até 2025, de uma taxa única de IRC de 17%, como medida para estimular e atrair o investimento.

Armindo Monteiro, presidente da CIP, em entrevista ao ECO - 15DEZ23
Armindo Monteiro, presidente da CIP, defende a redução do IRS e do IRC para aumentar o investimento.Hugo Amaral/ECO

Ainda no plano fiscal, os patrões defendem também um alívio da carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho. “Não podemos tributar apenas os rendimentos do trabalho, porque isso está claramente a penalizar os criadores de emprego, que é o que acontece hoje”, justifica em entrevista ao ECO. Em contrapartida, pede uma redução da Taxa Social Única (TSU).

A CIP propõe uma redução da TSU, de 23,75%, sobre as empresas, embora não indique valores. Mas vai mais além e quer também uma diminuição dos descontos, de 11%, que recaem sobre os trabalhadores. “Tem que conseguir-se reduzir o IRS e o IRC, mas com um objetivo. E para mim o objetivo é aumentar o investimento“, argumenta.

Não podemos tributar apenas os rendimentos do trabalho, porque isso está claramente a penalizar os criadores de emprego, que é o que acontece hoje.

Armindo Monteiro

Presidente da CIP

Mas estas são apenas algumas das 30 medidas propostas pela CIP aos governantes. Questões como isentar de IRS os primeiros 100 mil euros ganhos por um jovem até aos 35 anos, criar o 15º mês com neutralidade fiscal, implementar um regime de apoio à exportação ou desburocratizar são outras das medidas incluídas neste Pacto Social.

Tal como a CIP, também a Confederação do Comércio e Serviços (CCP) é favorável a uma redução da TSU, defendendo que o Estado deveria taxar o lucro das grandes empresas para ajudar a pagar pensões. “A CCP tem uma proposta de incorporar uma parte que incidisse sobre o valor acrescentado líquido (VAL)” na diversificação das fontes de financiamento do sistema previdencial, afirmou o presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), João Vieira Lopes, ao ECO.

João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), em entrevista ao ECO - 27FEV24
João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), defende que se taxe o lucro das grandes empresas para pagar pensões.Hugo Amaral/ECO

“Neste momento, praticamente, só as áreas de mão-de-obra intensiva é que sustentam a Segurança Social com a Taxa Social Única (TSU). Ora, a estrutura da economia está-se alterar e é preciso encontrar aqui equilíbrios, mas não ser maximalista. Esta é uma questão estratégica para o país”, sustentou Vieira Lopes. A confederação dos patrões defende a criação de uma taxa de 5,4% sobre o VAL, taxa essa que permitiria uma redução da TSU a cargo dos patrões de 23,75% para 13,75%.

Para o líder da CCP considera fundamental “incentivar com benefícios fiscais diretos e mais claro para o investimento privado, para que os empresários coloquem capitais próprios nas empresas”.

É preciso resolver o problema da capitalização, continuamos com as empresas dependentes da banca e a fiscalidade ainda continua, em muitas situações, a ser muito mais favorável a recorrer à banca do que investir na capitalização.

João Vieira Lopes

Presidente da Confederação do Comércio e Serviços

“É preciso resolver o problema da capitalização, continuamos com as empresas dependentes da banca e a fiscalidade ainda continua, em muitas situações, a ser muito mais favorável a recorrer à banca do que investir na capitalização”, reforçou, lamentando, que neste aspeto, “nenhum partido tem propostas muito radicais”. E acrescenta: “Os programas são uma desilusão”.

A Associação das Empresas Familiares refere que Portugal não precisa de um choque salarial, nem fiscal. “Precisa é de um choque de ambição. Temos de ter o objetivo de crescer 3 ou 4% ao ano, de forma sustentada, com outros países da Europa”, destaca Peter Villax, presidente da Associação das Empresas Familiares. Para o conseguir, o responsável sugere uma “colaboração” entre Governo e empresários.

Se fosse primeiro-ministro eleito no próximo mês, convidava os 100 presidentes das maiores empresas portuguesas e dizia: vamos trabalhar em conjunto para pôr este país a crescer. O que vocês querem? O que eu quero em termos de Estado Social, de receita fiscal, de serviços? O que é que vocês podem oferecer e o que precisam para chegar ao objetivo de crescemos 3 ou 4% ao ano.

Peter Villax

Presidente da Associação das Empresas Familiares

“Se fosse primeiro-ministro eleito no próximo mês, convidava os 100 presidentes das maiores empresas portuguesas e dizia: vamos trabalhar em conjunto para pôr este país a crescer. O que vocês querem? O que eu quero em termos de Estado Social, de receita fiscal, de serviços? O que é que vocês podem oferecer e o que precisam para chegar ao objetivo de crescemos 3 ou 4% ao ano”.

Peter Villax destaca ainda que “temos de olhar para as empresas como centros de criação de riqueza, prosperidade e emprego. São as empresas que fazem rodar a economia”. Dito isto, Peter Villax realça que “se ficássemos à espera do resultado das eleições abriríamos falência no fim do mês”. “As empresas têm de continuar, independentemente dos governos, porque a economia não pára e nós não paramos”.

Luis Miguel Ribeiro, presidente da AEP, em entrevista ao ECO - 13SET22
Luis Miguel Ribeiro, presidente da AEP, realça que os empresários precisam de um quadro governativo estável.Ricardo Castelo/ECO

A interrupção de um Governo em funções, qualquer que ele seja (e neste caso até estávamos perante um quadro com maioria parlamentar), com a consequente realização de eleições antecipadas, é sempre um fator gerador de instabilidade interna e de imprevisibilidade, o que não é positivo para o mundo dos negócios”, defende o presidente do conselho de administração da AEP, Luís Miguel Ribeiro.

“Os empresários precisam de contar com um quadro governativo estável, que permita assegurar políticas públicas promotoras de uma envolvente favorável ao bom desenvolvimento da atividade empresarial, algo que os empresários não têm sentido”, reforça o mesmo responsável, em respostas escritas ao ECO.

Quanto a medidas concretas, “A AEP defende uma mudança na cultura da governação da economia portuguesa, que impulsione a produtividade e a competitividade, onde a política fiscal atrativa para o investimento e para as pessoas deve fazer parte”, explica Luís Miguel Ribeiro. “Por maiores que sejam as remunerações brutas praticadas pelas empresas, a pesada e progressiva carga fiscal que incide sobre o trabalho reduz brutalmente a remuneração líquida dos trabalhadores e é um forte desincentivo aos mais qualificados, em geral com maiores níveis de remuneração bruta”, reforça.

O presidente do conselho de administração da AEP enumera ainda um conjunto de medidas que faziam parte do Orçamento do Estado para 2024 e que a associação considera “relevantes”, tais como a redução progressiva da taxa de IRC, para 17% até 2025; a redução significativa da tributação sobre o trabalho (IRS e Segurança Social), em particular nos jovens; ou a implementação de políticas adequadas no financiamento do investimento e na capitalização das empresas, nomeadamente através do Banco Português de Fomento e a alocação célere e imediata dos fundos europeus prioritariamente para as empresas.

Quem estiver a governar terá que criar condições para que o país se possa desenvolver e exportar mais.

Gualter Morgado

Diretor executivo da APIMA

Gualter Morgado, diretor executivo da Associação Portuguesa das Indústrias de Mobiliário e Afins (APIMA), alinha com as restantes associações e pede medidas fiscais que permitam aliviar a carga dos impostos sobre as empresas e sobre os trabalhadores. “Quem estiver a governar terá que criar condições para que o país se possa desenvolver e exportar mais“, defende.

Por outro lado, o representante do setor do mobiliário pede uma “simplificação das cargas burocráticas a que estão sujeitas as empresas. Temos mais pessoas não produtivas a responder a inquéritos e a prestar a mesmo informação a várias entidades governamentais”, aponta.

Ainda assim, Gualter Morgado comenta que com uma “conjuntura internacional tão instável e tão complicada, as eleições não são o que mais nos preocupa”. “Já temos que ter em conta tantas adversidades a nível internacional, que isso já é o nosso mal menor“, remata.

Ao contrário da APIMA, Rafael Campos Pereira, vice-presidente executivo da AIMMAP (Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos e Afins de Portugal), mostra-se preocupado com a estabilidade governativa do país, argumentando que “deveriam ser privilegiados acordos ao centro” para viabilizar o governo.

Uma das prioridades do novo Executivo, diz a AIMMAP, deverão ser os fundos europeus. “Tem que ser reposta a ordem na execução do PRR e do PT2030. É preciso canalizar os fundos para a economia e não para financiar o Orçamento do Estado“.

Tem que ser reposta a ordem na execução do PRR e do PT2030. É preciso canalizar os fundos para a economia e não para financiar o Orçamento do Estado.

Rafael Campos Pereira

Vice-presidente executivo da AIMMAP

O setor dos metais defende “aliviar os impostos sobre o rendimento, para aumentar as retribuições líquidas dos trabalhadores e estimular o crescimento da produtividade. Se aumentar o rendimento líquido das famílias, isto vai estimular o trabalho“. Já a “reforma do IRC é importante”, mas deve privilegiar-se as empresas que investem”.

Foi a pior altura para o Governo cair. É uma perda enorme para o país. Temos um PT2020 para encerrar, um PRR em velocidade cruzeiro e o PT2030 para começar. Esta malta não gosta do país”, acrescenta César Araújo, presidente da ANIVEC (Associação Nacional das Industrias de Vestuário e de Confecção). “Retrocederam anos quando estávamos numa velocidade cruzeiro. Era a última coisa que a população portuguesa e o setor económico merecia”, refere.

 

Não há desenvolvimento de um país sem economia. Podem querer dar casas, aumentar salários, saúde, podem querer tudo, mas sem desenvolver uma economia forte, robusta, não vão a lado nenhum.

César Araújo

Presidente da ANIVEC

Aos novos decisores pede-lhes que “pensem economia. Não há desenvolvimento de um país sem economia. Podem querer dar casas, aumentar salários, saúde, podem querer tudo, mas sem desenvolver uma economia forte, robusta, não vão a lado nenhum“.

“Premiamos o pequeno. Temos que criar empresas de raiz portuguesa que possam competir a nível global. Não podemos excluir as empresas que têm mais de 250 trabalhadores e torná-las grandes empresas. Não são grandes empresas”, aponta, referindo que é preciso mudar o critério de identificação do que são as pequenas e médias empresas.

“A existir um empate técnico vamos andar aos trambolhões. Um ano aos trambolhões. Vamos perder anos” de desenvolvimento, antecipa César Araújo.

Álvaro Mendonça e Moura, presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), em entrevista ao ECO - 04MAR24
Álvaro Mendonça e Moura, presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), em entrevista ao ECOHugo Amaral/ECO

Álvaro Mendonça e Moura, presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), lamenta a ausência da discussão de temas relacionados com a agricultura na campanha. Questionado sobre qual a primeira medida que gostaria de ver adotada pelo próximo Governo, Álvaro Mendonça e Moura não hesita: “A primeira medida era a nomeação de um ministro ou de uma ministra da Agricultura forte”, seria “um sinal de que o novo Governo, seja ele qual for, pretende que a agricultura seja um setor realmente estratégico para o país”.

“Sei é exatamente o perfil de pessoa que é necessário: uma pessoa que conheça a agricultura em profundidade, que tenha o apoio político do primeiro-ministro dentro do Governo, porque a agricultura não se faz só do Ministério da Agricultura, mas da relação com o Ministério do Ambiente, da Economia, e até com o Ministério da Administração Interna, por causa das questões de segurança. Depois tem de ser alguém apoiado pelo primeiro-ministro que tenha possibilidade de ter uma posição assertiva forte nas discussões a nível europeu”

A CAP enquanto parceiro social sublinha a importância de se discutir a sustentabilidade da Segurança Social, um tema que não teve o destaque devido nos debates dada a sua “importância estratégica”. Álvaro Mendonça e Moura gostaria de ver reaberta a discussão da redução da Taxa Social Única (TSU), “mas tem de ser visto de uma forma equilibrada”. “Julgo que é tempo de os governos, em sede de Concertação Social, discutirem com os parceiros sociais sem medo. Como é que podemos baixar a TSU sem pôr em causa a Segurança Social. Esse é um diálogo que espero que o Governo futuro, seja qual for, traga para a mesa da concertação social, com ambição, com coragem. Mas tem de ser discutida em sede de Concertação Social”, diz Mendonça e Moura.

Ainda em matéria fiscal, a Associação Portuguesa de Contribuintes desafia “os protagonistas políticos da próxima legislatura a assumirem o compromisso de nunca implementar medidas que conduzam ao aumento da receita fiscal, em novos impostos ou em impostos existente, sem que tenham sido devidamente ponderadas e privilegiadas medidas do lado da despesa, com impacto orçamental equivalente.

“Em benefício da transparência, desafiamos igualmente a que qualquer proposta de medidas que conduzam ao aumento da receita fiscal seja acompanhada de um enquadramento das medidas do lado da despesa que foram equacionadas e o racional que impediu a sua implementação em detrimento da medida com impacto no aumento da receita fiscal”, acrescenta a mesma associação.

A Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP) publicou um conjunto de 14 medidas que queria que o governo implementasse, propostas direcionadas para o setor em específico e para as empresas em geral. No que diz respeito ao setor, a AHRESP pede, por exemplo, a reposição integral a todas as bebidas sem exceção da taxa intermédia do IVA, imposto que ainda exclui os refrigerantes e as bebidas alcoólicas, taxadas a 23%.

Por outro lado, gostaria de ver uma “redução da carga fiscal sobre a atividade de Alojamento Local (AL), que, por via da legislação do pacote Mais Habitação, é obrigada a pagar a nova contribuição extraordinária sobre os apartamentos e estabelecimentos de hospedagem integrados numa fração autónoma de edifício em Alojamento Local (CEAL).

Ao nível da coesão social, a associação defende um programa de dinamização à economia nos territórios de baixa densidade, a reversão/suspensão total da aplicação das medidas relativas ao AL do pacote Mais Habitação e um programa para promover a dinamização de produtos regionais/locais.

No setor agroalimentar, a FIPA defende que o país necessita de ter uma visão clara para a criação de uma rede de infraestruturas sólida e competitiva, particularmente ao nível portuário, de forma a garantir o regular abastecimento de matérias-primas e o regular fluxo de exportações, e reforçar as capacidades necessárias para a criação de stocks de segurança. A redução da dependência externa no abastecimento de matérias-primas deverá ser uma prioridade, argumenta.

A FIPA realça ainda que a “conjuntura, nacional e internacional é desafiante e embora os números deixem perceber um incremento ao nível das exportações o setor ambiciona mais. Para tal é necessário um maior empenho no eliminar de barreiras alfandegárias em várias latitudes”, refere em comunicado.

“Nesta ronda pelos partidos políticos ficou lançado, entre outros, o desafio de enquadramento, durante a próxima legislatura, dos produtos alimentares na taxa reduzida de IVA, 6%. Acreditamos, por isso, que o setor será finalmente compreendido e as suas reivindicações atendidas. Afinal, numa economia mundial bastante agressiva, a indústria agroalimentar que opera em Portugal dá cartas e pode contribuir para o equilíbrio da respetiva balança comercial”, conclui Jorge Henriques, presidente da FIPA.

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