A inovação energética como trunfo para reforçar a competitividade
Afonso Arnaldo, da Deloitte, João Marques Mendes, da PLMJ, e Pedro Alves, da Helexia, discutiram as vantagens da transição energética para o tecido empresarial.
A inovação energética e a competitividade setorial foram o mote da talk, organizada pelo ECO e pela Helexia, em parceria com a Deloitte e a PLMJ, que reuniu especialistas de áreas cruciais para a transição energética no lançamento de um conjunto de think tanks sobr-e estes temas
Para expor os desafios desta caminhada rumo a um modelo empresarial mais sustentável e descarbonizado, esta talk, moderada por André Veríssimo, subdiretor do ECO, contou com a presença de Afonso Arnaldo, partner da Deloitte, João Marques Mendes, partner da PLMJ, e Pedro Alves, Sales Director Portugal da Helexia.
“O âmbito principal deste projeto é as empresas compreenderem o potencial da geração de energia descentralizada. É possível, hoje, para a grande maioria das empresas, gerarem grande parte da sua energia de forma descentralizada, para autoconsumo, principalmente através de energia fotovoltaica. E o que nos move neste projeto é a possibilidade de poupança, é uma maneira de ter parte dos custos previsíveis, de conseguir uma descarbonização, e de tirar CO2 da equação de uma forma económica“, começou por dizer Pedro Alves.
O responsável da Helexia acrescentou, ainda, que, para esta iniciativa, o foco da empresa está, principalmente, em quatro setores, nomeadamente o retalho, o agroalimentar, o turismo e a indústria cerâmica, e justificou esta escolha por serem “setores onde a Helexia já tem experiência anterior, não só na geração descentralizada, mas também no apoio à eficiência energética”, bem como pelo facto de serem “setores que têm um potencial exportador relevante”.
“São setores onde a energia pode ser um fator de competitividade porque têm uma área relevante onde se pode instalar uma central, têm um tipo de necessidade energética para a qual a tecnologia atual pode fornecer uma solução de eletrificação, em vez de queimar gás natural, por exemplo, o que lhes permite reduzir o CO2. Portanto, há um conjunto de factos que tornam estes setores os quatro mais interessantes por onde queremos começar“, afirmou.
Por sua vez, o papel da Deloitte e da PLMJ neste projeto passa muito por uma “dupla responsabilidade”, que se prende com a responsabilidade enquanto empresas que têm de ter o seu papel no tema da sustentabilidade e da descarbonização, mas também com a responsabilidade de serem influenciadoras no mercado, já que trabalham estes temas com os seus clientes.
“Do ponto de vista daquilo que são os nossos objetivos enquanto humanidade e enquanto país na área da descarbonização, acho que os devemos trabalhar em conjunto. Portanto, essa partilha daquilo que é a nossa experiência, quer com a produção de estudos, que vamos produzindo a nível global ou a nível nacional, quer a partilha da experiência adquirida desta mesma interação, colocá-la em iniciativas como esta, que são iniciativas muito louváveis ao serviço da comunidade, é algo que para nós é importante”, disse Afonso Arnaldo.
A mesma opinião foi partilhada por João Marques Mendes, que garantiu: “Nós somos uma sociedade de advogados que assegura que os interesses dos clientes são alcançados num domínio transformador como aquele em que vivemos, de transformação energética e climática, e, depois, fruto do conhecimento que adquirimos, também temos um papel, ao nível de divulgação de conhecimento, que fazemos e que é um contributo para conseguirmos todos juntos alcançar este desiderato comum, que é conseguirmos uma sociedade mais descarbonizada”.
“Aquilo que nós pretendemos prestar aqui ao projeto passa pela consideração da regulação como um fator desbloqueador e não como um fator bloqueador da transformação que vamos viver. Aquilo que está a acontecer na Europa e em Portugal é uma transformação transversal de todas as áreas que dizem respeito à energia e, numa forma mais ampla, ao clima. Não há praticamente uma peça que não esteja em movimento e esta permanente mutação coloca desafios de perceção daquilo que está a ser feito”, aponta o partner da PLMJ
“A dificuldade também está no facto de a estratégia ser definida a um nível acima do nosso porque, neste momento, estas políticas são definidas ao nível europeu e a relação nem sempre é pensada para as especificidades da realidade local. Há um desafio nesta adaptação e nesta implementação e nós sentimos, por exemplo, no caso do autoconsumo, que é uma vertente fundamental para a descarbonização dos consumos elétricos e energéticos em geral das empresas, que há ainda limitações da regulação, que têm de ser debeladas e cuja receita não é fácil de encontrar. Foi este o desafio que aceitamos e que vamos tentar ajudar a chegar a bom porto”, acrescentou João Marques Mendes.
Quais os principais desafios na transição energética?
A literacia energética é um objetivo a alcançar já que, segundo Pedro Alves, tem sido o grande desafio na inovação: “Eu diria que todos os gestores em Portugal sabem o que é 1kWh, mas não é disso que estamos a falar. Estamos a falar de conhecer soluções que permitem descarbonizar de forma descentralizada. Enquanto nos setores de retalho ou no setor do turismo, grande parte da descarbonização virá à custa de descarbonizar a geração centralizada ou da rede elétrica nacional ou, até, da mobilidade elétrica, no caso da indústria, que é responsável por cerca de 30% das emissões de CO2 na Europa, há um conjunto de processos que já podem ser hoje eletrificados“.
“Com a tecnologia que temos disponível hoje, em 2024, é possível eletrificar mais de 3/4 dos consumos de calor industrial ou 3/4 da descarbonização. Portanto, é possível retirar 3/4 do CO2 emitido, eletrificando os consumos de calor industrial. E um dos objetivos dos think tanks e da forma como eles estão construídos é trazer à mesa pessoas que saibam falar sobre estes temas, que vêm falar de soluções e de como é possível descarbonizar o consumo”, disse.
Afonso Arnaldo, da Deloitte, também reforçou que a iliteracia energética está presente em muitas empresas e fundamentou a sua opinião com os dados do último estudo que a Deloitte fez, a nível global, sobre a sensibilidade entre o C-Level das grandes empresas para estes temas da sustentabilidade: “Ainda não estamos lá. Estamos numa fase em que uma percentagem muito grande (80%) já admite que sentiu e sente o impacto negativo das alterações climáticas. Mas quando perguntamos se vê benefícios diretos e imediatos de se fazer a transição e de se investir na descarbonização, a percentagem diminui. Ou seja, ainda não existe uma perceção imediata de fazer essa mesma descarbonização. É um bocadinho um sentimento quase que egoísta, à espera que o outro faça”.
“Mas temos ainda outro estudo, o Turning Point, que realizamos há cerca de um ano, e que comprova que uma visão de curto prazo seria uma visão perdedora. Trata-se de uma análise prospetiva a 2070. A prospeção que faz é que se conseguirmos descarbonizar a ponto de não ultrapassar os 2° (porque o 1,5° já se dá cientificamente como uma inevitabilidade), vamos ter um ganho de 43 biliões a nível do PIB mundial. Se deixarmos ultrapassar os 2°, vamos ter um prejuízo de 178 biliões acumulados até 2070. A médio e longo prazo, um investimento em descarbonização faz, de um ponto de vista económico, todo o sentido”, continuou.
No entanto, para isso, o responsável da Deloitte explica que o “primeiro desafio é o convencimento dos gestores de que este é o caminho”: “Depois vem a parte da regulação, que virá ajudar e que incute determinados comportamentos. Adicionalmente, a compreensão da existência de energias alternativas e de como se pode recorrer às mesmas para poder fazer esse caminho, mas também da própria eficiência energética porque, muitas vezes, também não é necessário fazer uma alteração radical da energia. Pode-se, antes, ser muito mais eficiente em muitas situações e isso é também algo que deve ser trabalhado. Portanto, são vários os desafios que são colocados e que devem ser utilizados de um ponto de vista estratégico daquilo que são as operações de qualquer empresa“.
Regulação pode ser o acelerador da inovação
“A transição energética e climática exige muito investimento, não apenas de produção de energia descentralizada ou mais remota, mas também ao nível de redes, em hardware e em software. E, muitas vezes, nas redes de baixa tensão, que são aquelas redes tradicionalmente mais esquecidas. E são custos que, a não ser que sejam comparticipados pelo Estado ou pelo fundo ambiental, tipicamente passam para os consumidores. Portanto, nada se faz sem investimento. No curto prazo, sai mais caro do que a solução alternativa, mas no médio longo prazo é decisivo para a sustentabilidade dos negócios e das empresas“, referiu João Marques Mendes, da PLMJ.
O partner da PLMJ afirmou, por isso, que “a regulação precisa de ser implementada”, mas, a par disso, “também vão ter de ser criados mecanismos impulsionadores e facilitadores do investimento e, desde logo, colocava aqui um tema que é decisivo: a geração descentralizada não será eficiente se eu não conseguir de forma eficaz partilhar a minha energia excedente. No geral, as redes não estão preparadas para isso. Estão a ser preparadas, mas hoje ainda sentimos muitos projetos com dificuldades em fazer isto”.
“Hoje, uma indústria que tem até determinada potência instalada não paga pelas emissões de CO2, portanto pode utilizar um gás que polui e não paga pelas emissões porque é a regulamentação em toda a Europa. Contudo, naturalmente, as empresas muito grandes pagam por essas emissões. Portanto, se este nível até ao qual não se pagam emissões baixar e, provavelmente, vai haver um movimento nesse sentido, estas empresas vão ter um incentivo“, explicou Pedro Alves.
Nesse sentido, Afonso Arnaldo garantiu que a regulação pode, ainda, ter um efeito dominó em vários setores: “Nós estamos numa fase em que, cada vez mais, por via da regulação, temos que comunicar ao mercado a pegada ecológica e vamos ter mais empresas a serem obrigadas a caminhar para a transformação e a descarbonizar por força de fornecerem a grandes empresas que têm de fazer essa comunicação“.
“Isto é um grande desafio, mas, ao mesmo tempo, é uma oportunidade. É, talvez, a principal oportunidade de se conseguir uma descarbonização de todo um conjunto de pequenos produtores, pequenos fabricantes, que, sozinhos, nunca conseguiriam fazer esse caminho, mas aqui têm, claramente, um incentivo para o fazer, que será dado pela necessidade das empresas que estão a jusante, que já têm maior dimensão, e têm de assegurar esta descarbonização ao longo de toda a sua cadeia de valor”, concluiu João Marques Mendes.
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