Alexander Sukharevsky, líder global da unidade de Inteligência Artificial da McKinsey, afirma que a tecnologia traz “uma mudança de paradigma" e explica como as empresas se podem preparar.
“Pela primeira vez nos últimos 17 anos, há uma mudança de paradigmas que terá grande impacto nos negócios e na sociedade”, afirma Alexander Sukharevsky, líder global da QuamtumBlack, a unidade de Inteligência Artificial Generativa da McKinsey, sobre a transformação que esta tecnologia vai trazer.
A consultora americana estima que a inteligência artificial generativa possa gerar um benefício económico de 2,6 biliões a 4,4 biliões de dólares anuais, a nível mundial. As capacidades atuais da tecnologia poderão automatizar entre 60% a 70% do tempo de trabalho e aumentar a produtividade entre 0,1% de 0,6% todos os anos até 2043, compensando o declínio do crescimento do emprego devido ao envelhecimento da população.
Alexander Sukharevsky elenca vários casos de utilização da nova tecnologia, que diz mudará a forma de trabalhar e gerir: “Serão dezenas de assistentes virtuais que estarão na sua equipa e que o ajudarão a fazer o seu trabalho.”
O novo paradigma exigirá novas capacidades. “A competência número um é a criatividade e o design. A competência número dois é o pensamento crítico”, aponta.
Já na mira das grandes empresas, a nova ferramenta será decisiva também para as PME. “Vai-lhes permitir criar uma vantagem económica, acelerando o seu trabalho, criando uma melhor experiência para o consumidor e reduzindo custos”, sublinha o senior partner da Mckinsey.
O ChatGPT foi apresentado em novembro de 2022, iniciando a era da inteligência artificial (IA) generativa. Como é que as empresas estão a usar esta tecnologia para fazer crescer os seus negócios?
Embora o mundo tenha visto a tecnologia há cerca de 18 meses, temos menos de dois trimestres de implementação. Só no verão dez milhões de engenheiros de software tiveram acesso a essas ferramentas, para lá de algumas organizações privilegiadas. Estamos apenas no início, numa fase de pré-consciência. Algumas estão a focar na questão da produtividade e podemos ver quatro casos de utilização principais. O primeiro é a concisão. Basicamente, é possível interagir com uma base de dados em linguagem humana e fazer questões. A segunda é desenvolver software, seja para a migração de sistemas antigos para novos seja para acelerar o desenvolvimento de software. A terceira parte é o desenvolvimento de conteúdo, que pode ser imagem, filme, som. E por último, mas não menos importante, tudo o que tem a ver com a interação com os consumidores e clientes.
Como é que a IA generativa potencia essa interação?
Desde o site até ao call center, é possível fazer perguntas no seu idioma. A noção de site é anacrónica, porque obriga a seguir a mente de outra pessoa sobre como navegar e ter a resposta às suas necessidades em vez de o fazer da sua maneira. Estes são os quatro “cês”: concisão, código, conteúdo e interação com o cliente. Ao contrário de outras técnicas da IA, aqui há uma mudança de paradigma nos modelos de negócio.
O que estou a ver agora, pela primeira vez nos últimos 17 anos, há uma mudança de paradigmas, uma mudança de plataformas, que terá um grande impacto nos negócios, na tecnologia e na sociedade.
Ainda estamos na infância da IA generativa, mas já é certo que vai mudar os modelos de negócios.
Estamos até antes disso. Mas há duas coisas que já são reais. Em primeiro lugar, a IA generativa permite mudar a curva de custos entre 50 e 100 mil vezes. Por exemplo, fazer uma apresentação com seis ou sete slides. É preciso uma hora, um profissional para o fazer e tem um custo digamos de 75 dólares. Com a IA generativa pode ser 75 vezes mais barato. Em segundo lugar, é a primeira vez que é possível interagir com uma máquina na nossa linguagem, seja através de texto ou da voz.
Ainda que o mundo esteja a focar-se na IA e na IA generativa e esse seja agora o objeto brilhante, há outras duas tecnologias que estão a tornar-se viáveis, quer do ponto de vista comercial, quer tecnológico. Uma delas é a realidade aumentada e a outra a web 3.0, sobretudo com a ‘tokenização’ das transações. Agora as três juntam-se e é possível pensar em novos modelos de negócio. Por exemplo, a possibilidade de oferecer serviços médicos numa localização distante com os melhores especialistas ou fazer à distância a manutenção de camiões usados em minas. O que estou a ver agora, pela primeira vez nos últimos 17 anos, há uma mudança de paradigmas, uma mudança de plataformas, que terá um grande impacto nos negócios, na tecnologia e na sociedade.
Vê outros casos de utilização que vão desenvolver-se no futuro?
Imagine um dia em que acorda de manhã e tem um assistente virtual que faz a sua agenda, aconselha-o nos hábitos de nutrição, ajuda-o a estar em boa forma física, faz as suas compras, ajuda-o a criar o seu estilo de vestuário e lhe dá apoio emocional.
Ainda não estamos aí, mas vamos lá chegar.
Estamos muito perto, porque a tecnologia já existe. É uma questão de desenho. Este é o lado do consumidor, mas também temos o lado das empresas. Ainda não temos a inteligência artificial geral, o supercérebro, mas temos dúzias de assistentes virtuais que sabem fazer muito bem diferentes tarefas: como retirar informação de uma base de dados ou criar um gráfico, e que podem ajudar na troca de informação com os colegas. Serão dezenas de assistentes virtuais que estarão na sua equipa e que o ajudarão a fazer o seu trabalho. A tecnologia já existe, mas o fundamental é o desenho e a experiência.
Pense nas implicações que terá na gestão. Será necessário gerir humanos e assistentes virtuais e como combinar ambos. É uma oportunidade porque nos dá superpoderes e permite que foquemos o tempo e esforço naquilo em que somos melhores. Dá tempo para refletir, para criar, para nos inspirarmos.
Será necessário gerir humanos e assistentes virtuais e como combinar ambos. É uma oportunidade porque nos dá superpoderes e permite que foquemos o tempo e esforço naquilo em que somos melhores.
Que desafios enfrentam as empresas na adoção da IA generativa?
O momento em que o ChatGPT foi revelado ao mundo foi também o momento em que a confiança dos gestores na IA era mais baixo, porque durante anos só 11% das experiências piloto passavam à fase de produção e tornavam-se parte da empresa. Se olharmos para a inteligência artificial generativa (nos negócios tradicionais, não nas empresas de software), os números são ainda mais baixos, na casa de um dígito.
Há um fosso entre a perceção, o entusiasmo em torno da tecnologia, e a realidade da empresa. Em primeiro lugar, é preciso ter dados confiáveis, claros, aumentados e acessíveis. Depois, é necessário ter uma arquitetura de IT para permitir que os dados fluam dentro da organização. É também necessário ter colegas suficientes que sejam capazes de operar as máquinas. Mas, ainda mais importante, será preciso levar consigo o resto da organização, ter a certeza que compreendem a tecnologia, que não têm receio dela, mas que conhecem os limites. Sabemos que nos negócios tradicionais, estas não são necessariamente as competências.
A competência número um é a criatividade e o design. A competência número dois é o pensamento crítico.
Será preciso uma reaprendizagem massiva de competências dentro das empresas?
Diria um upskilling. Será necessário ensinar uma nova disciplina, se quiser. A questão dos assistentes virtuais, da nova forma de trabalhar, da metodologia ágil [agile], tudo isso se junta agora. Haverá preocupações com o risco que será necessário superar e também com os custos. Fazê-lo segundo o manual é muito caro e a economia do processo pode ser negativa. Usando uma arquitetura de pequenos modelos de IA [small model architecture] é possível ter uma economia positiva.
Neste contexto, que competências serão mais necessárias?
Acredito que estamos no início de uma nova era de criatividade. A minha melhor analogia é um chef com estrela Michelin. Os ingredientes são os mesmos, a receita pode ser conhecida de todos mas, por alguma razão, o chef cozinha melhor do que eu e o aspeto final é melhor. Aqui acontece o mesmo. A tecnologia é uma commodity. A questão é o que se faz com os dados que se tem? Como se incorpora a cultura? Como é que se cria a experiência? É uma experiência de design. É preciso repensar a forma como trabalhamos, considerando todas estas oportunidades. Por isso, a competência número um é a criatividade e o design. A competência número dois é o pensamento crítico, porque a máquina vai alucinar, é preciso monitorizá-la, retirar-lhe os enviesamentos.
Vemos sobretudo grandes empresas a investir na IA generativa. Como é que as PME vão poder aceder a estas ferramentas?
As PME já lá estão. É possível usar esta ferramenta para criar uma coleção de moda, para fazer o sumário de uma reunião. Se é uma PME que faz compras, pode usar esta ferramenta para ajudar a gerir a informação e a interação com os fornecedores. Isto passa a estar democratizado. Há dúzias de assistentes virtuais que podem dar vantagem às PME.
Terão de o fazer através de fornecedores.
Haverá várias soluções verticais. As PME terão de escolher entre diferentes kits de ferramentas. Vai-lhes permitir criar uma vantagem económica, acelerando o seu trabalho, criando uma melhor experiência para o consumidor e reduzindo custos.
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