A “bússola” da política monetária dos bancos centrais pode estar avariada
Cláudio Borio do BIS desafia a utilidade da taxa de juro real neutra como guia da política monetária, e sugere que os bancos centrais têm um papel mais significativo na determinação das taxas de juro.
Esta quarta-feira, no último dia do Fórum anual do Banco Central Europeu, Cláudio Borio, responsável pelo departamento monetário e económico do Banco de Compensações Internacionais (BIS), apresentou uma perspetiva provocadora sobre as variáveis que influenciam a taxa de juro real de equilíbrio (ou taxa de juro natural) definida como “r*”, desafiando algumas noções convencionais.
Borio começou por questionar a utilidade do conceito da “r*” (taxa de juro real que não estimula nem contrai a atividade económica nem a inflação) como bússola para a política monetária.
Segundo o economista, “pensar sobre para onde irão as taxas de juro com base na r* provavelmente não é particularmente útil, e pelas mesmas razões que o r* não é uma bussola particularmente útil para a política monetária”.
O responsável do BIS argumentou que a relação entre a taxa de juro real de equilíbrio e os seus supostos determinantes, que pressupõe que é independente da política monetária e determinada apenas por fatores estruturais, é bastante imprecisa, tal como já havia defendido num paper de 2021. “Se permitirmos que os dados ‘falem’ e testarmos diretamente a ligação entre os chamados candidatos determinantes da r* e as taxas de juro de mercado ao longo de longos períodos, as evidências sugerem que esta ligação é muito fraca”.
Esta falta de precisão, segundo Borio, explica os intensos debates sobre onde a taxa de juro natural se encontra atualmente e para onde se dirige. “Não é surpreendente ver um debate tão acalorado sobre onde está a r* e para onde vai, dado que os fatores que explicam a r* tendem a ser muito lentos e presumivelmente mudaram muito pouco”.
Borio propôs uma abordagem alternativa para avaliar a evolução futura das taxas de juro reais. “Um lugar mais promissor para começar ao avaliar a evolução futura das taxas de juro reais é a função de reação do banco central”.
O economista argumentou que os bancos centrais desempenham um papel crucial na determinação das taxas de juro reais e que a política monetária pode ter impactos duradouros nas taxas de juro reais, que podem ser difíceis de distinguir de um impacto na própria r*. “O impacto da política monetária nas taxas de juro reais pode ser muito duradouro e dificilmente distinguível de um impacto na r*, dada a forma como o medimos”.
Esta perspetiva desafia a visão convencional de que a taxa de juro real de equilíbrio é determinada, principalmente, por fatores estruturais de longo prazo, como a demografia e a produtividade.
Borio sugere que as decisões de política monetária dos bancos centrais podem ter um papel mais significativo do que geralmente se reconhece. “No final das contas, penso que a r*, muito como a beleza, está nos olhos de quem vê”, concluiu o economista.
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