“Alívio” e “esperar para ver”. Como os analistas reagiram às eleições francesas
Sem maioria absoluta de nenhum dos blocos eleitorais, economistas estão preocupados com impasse legislativo na Assembleia Nacional.
O fraco desempenho da extrema-direita eurocética na segunda volta das eleições legislativas francesas, com a União Nacional (RN) atirada para o terceiro lugar, representa um “grande alívio”, mas o cenário de um parlamento fragmentado e um “vazio” legislativo deverá preocupar os investidores em ativos gauleses e no euro, segundo os analistas.
Nas reações imediatas compiladas pela agência Reuters às projeções que davam a vitória à coligação de esquerda Nova Frente Popular (NFP) de Jean-Luc Mélenchon, com entre 172 e 192 lugares, ainda longe dos 289 assentos necessários para uma maioria absoluta, o sentimento é positivo, mas com muita cautela.
“Este (resultado projetado) é um grande alívio para a Europa, uma vez que a extrema-direita eurocética parece ter tido um desempenho muito inferior ao esperado“, referiu Holger Schmeiding, economista-chefe da Berenberg, em Londres.
No mesmo sentido, Jan Von Gerich, analista-chefe de mercados da Nordea, acredita que é provável que os mercados financeiros recebam a votação com algum alívio. “Os resultados parecem mostrar que as forças mais moderadas continuam a aliar-se na segunda volta contra os candidatos mais extremistas, o que também tem repercussões nas próximas eleições presidenciais”.
A análise não é, contudo, de sentido único. Para Aneeka Gupta, diretora de research macroeconómico na Wisdomtree, os mercados vão ficar “satisfeitos por estarmos a evitar esta situação extrema com a extrema-direita”, mas adianta que “esse novo fôlego deverá ser curto, pois o resultado deverá levar a um impasse político, pelo menos até ao outono de 2025.”
“Vai ser muito difícil avançar e aprovar qualquer política e fazer reformas progressivas, porque os votos de cada partido estão divididos e ninguém tem maioria absoluta”, explica. “Diria que é uma situação um pouco complicada“.
Lee Hardman, analista sénior cambial na MUFG, recorda que ao longo da última semana, os mercados cambiais já estavam a desvalorizar uma grande parte do prémio de risco. “Por isso, penso que, por agora vamos esperar para ver o que acontece em termos da tentativa de formar um governo e do tipo de negociações que vão tentar ter lugar nas próximas semanas.”
“Isto acabará por ditar o que vai acontecer ao euro”, salienta. “Apenas com base nas sondagens da boca de urna, não estamos à espera de uma descida acentuada do euro.”
Simon Harvey, que lidera a análise cambial na Monex Europa, diz que “vai haver realmente um vazio no que diz respeito à capacidade legislativa da França”.
“É o mercado obrigacionista vai ser o verdadeiro local a analisar e poderá haver uma ligeira descida dos preços das obrigações francesas“, antevê. “Estamos a atravessar um período em que o poder político não é capaz de fazer nada de significativo. Na realidade, a reação deverá ser mínima. Se houver alguma, será no sentido de rendimentos mais altos, euro mais baixo e ações francesas mais baixas.”
Esquerda mais problemática?
Para alguns analistas, o facto de a vitória ser de uma coligação de esquerda poderá pressionar os mercados.
Von Gerich, da Nordea, diz que o programa económico da esquerda “é, em muitos aspectos, muito mais problemático do que o da direita e, embora a esquerda não consiga governar sozinha, as perspetivas para as finanças públicas francesas deterioram-se ainda mais com estes resultados”.
“Assim, é razoável esperar que os prémios de risco um pouco mais elevados nos ativos franceses prevaleçam também para além da reação inicial do mercado”, completa.
Ben Laidler, head of equity strategy da Bradesco, reconhece o alívio pelo facto de a extrema-direita ter ficado muito aquém do esperado, mas frisa que “ainda nos resta a incómoda surpresa de a esquerda se ter saído muito melhor do que o previsto”.
“Isto vai provavelmente pôr fim a esta tentativa de recuperação do euro e das ações francesas a que temos assistido nos últimos dias e representa mais incerteza de um ângulo que os mercados talvez tenham desviado o olhar“, conclui.
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