“Oposição não deve transformar Orçamento numa moção de censura”, aconselha Costa
Ex-primeiro-ministro adverte que governar em duodécimos “não é desejável”. "Ónus da negociação” está no Governo, que "deve criar condições para que o PS não tenha de o inviabilizar” o Orçamento.
O ex-primeiro-ministro António Costa considera que era bom o país ter um Orçamento do Estado, pedindo que não seja transformado numa moção de confiança ou de censura, e salientou que os portugueses não querem uma crise política.
“O Orçamento do Estado, independentemente de quem governe, é um instrumento essencial ao funcionamento normal do país. E, portanto, é bom o que o país tenha orçamentos do Estado e que o exercício da responsabilização dos governos seja feito pelos instrumentos próprios previstos na Constituição: a moção de censura e a moção de confiança”, considerou António Costa numa entrevista ao canal televisivo Now.
O ex-primeiro-ministro sustentou que “nem o Governo deve transformar o Orçamento numa moção de confiança, nem a oposição deve transformar o Orçamento numa moção de censura”, considerando que os partidos devem “transformar o debate do orçamento na normalidade que o debate deve ter”.
Salientando que a governação em duodécimos “não é desejável” e “não é a solução ideal num contexto de grande instabilidade internacional”, Costa considerou que o normal é que, “se o Governo não tem maioria, tem o dever de procurar encontrar uma solução para ter um Governo”.
“E aquilo que é normal nas oposições é não inviabilizarem à partida a existência de um Orçamento, mas predisporem-se a que o Orçamento possa ser viabilizado sem que isso seja entendido como um apoio ao Governo”, referiu.
Aquilo que é normal nas oposições é não inviabilizarem à partida a existência de um Orçamento, mas predisporem-se a que o Orçamento possa ser viabilizado sem que isso seja entendido como um apoio ao Governo.
Costa, eleito presidente do Conselho Europeu, defendeu que “o ónus da negociação” está no Governo e referiu que, se o executivo quer a viabilização do Orçamento, “deve criar condições para que o PS não tenha de o inviabilizar”.
“Se o governo propõe, por exemplo, uma descida radical do IRC, o PS é contra. Não é possível pedir ao PS para votar a favor de uma medida que é contra”, exemplificou, reforçando que, se o Governo não tem maioria, não pode obrigar outras forças políticas a votar a favor de algo que sabe que são contra.
Por outro lado, Costa considerou que, nas oposições, também não pode haver a leitura de que “se não inviabilizam o Orçamento é porque estão a apoiar o Governo”. “Não. Não inviabilizam o Orçamento, porque o país precisa de um Orçamento. Portanto, se o Orçamento não tiver nenhuma medida que seja absolutamente intolerável para a oposição, eu acho normal que a oposição viabilize”, considerou.
Referindo que não pretende sugerir o que o PS deve fazer, Costa referiu contudo que o “conjunto do sistema político deve orientar-se” pela ideia de que os instrumentos para pôr em causa a confiança num executivo é a moção de censura, e para a afirmar é a moção de confiança.
“O Orçamento é uma ferramenta de ação do Estado e, portanto, não deve o Estado ser privado dessa sua ferramenta”, considerou, recordando casos em que governos minoritários conseguiram aprovar orçamentos do Estado com o principal partido da oposição, como no primeiro executivo de António Guterres, em que orçamentos foram viabilizados pelo PSD, na altura liderado por Marcelo Rebelo de Sousa.
António Costa salientou ainda que, em 2022, quando o seu Governo viu a sua proposta de Orçamento do Estado ser chumbada na Assembleia da República, disse ao Presidente da República que estava disponível para governar em duodécimos.
Questionado se considera que é de evitar uma nova crise política, Costa respondeu: “Isso, claramente”. “Podemos ler todos os sinais que os portugueses nos dão todos os dias: deram nas eleições legislativas, nas europeias… (…) A última vontade e desejo que as pessoas têm é qualquer crise política ou que voltem a ser incomodadas pelos políticos a chamá-los para eleições”, afirmou.
Referindo que os dois últimos anos para os portugueses “foram duríssimos” – com a pandemia de Covid-19, a guerra na Ucrânia e a inflação -, Costa reforçou que “a última coisa que o país precisa é de nova crise política”. “O que os portugueses desejam é que haja tranquilidade”, frisou.
“Padrões éticos” diferentes da PGR
Na mesma entrevista, António Costa afirmou ainda que manifestamente não partilha dos “padrões éticos e de exigência” no exercício de funções públicas da Procuradora-Geral da República, reiterando que não se arrepende de se ter demitido.
Questionado sobre as declarações de Lucília Gago, que descartou qualquer responsabilidade sobre a sua demissão do ex-primeiro-ministro, salientando que Costa poderia “ter continuado nas suas funções”, o ex-primeiro-ministro salientou que “cada um assume as suas responsabilidades”, considerando que foi o que fez.
“Cada um tem os seus padrões éticos e de exigência relativamente aos cargos que ocupa. Manifestamente não temos os mesmos padrões”, afirmou.
António Costa acrescentou que, “é suposto que todos exerçam, com uma devida responsabilidade, as suas funções”, dando o exemplo das forças de segurança, que andam armadas com base no pressuposto de que utilizarão “a arma de uma forma adequada, proporcional e em caso de necessidade”.
“É assim que as nossas forças de segurança atuam, felizmente. Há depois uma ou outra exceção. Eu não acho que, quando há um mau exercício de uma função, se deva necessariamente alterar essa função”, frisou.
Questionando se, relativamente à Procuradora-Geral da República, considera que houve um “mau exercício” da sua função, o ex-primeiro-ministro respondeu: “Ninguém é bom juízo em causa própria, portanto não vou estar a falar por mim”.
“Acho que há um juízo geral das pessoas relativamente ao que aconteceu, ao que se passou. É uma página que está virada, foi dolorosa, mas entendi que tinha de me reinventar”, referiu, reiterando que não se arrepende de se ter demitido e salientando que tomou a “decisão certa na hora exata”.
Nesta entrevista, António Costa foi ainda questionado sobre a operação Tutti Frutti e o facto de o seu ex-ministro das Finanças Fernando Medina vir a ser constituído arguido, tendo considerado a situação bizarra.
“Acho, apesar de tudo, bizarro uma pessoa ser constituída arguida pela atribuição de um subsídio que não atribuiu – foi atribuído pela Câmara, que é um órgão colegial – e, além do mais, uma reunião em que ele nem sequer participou. Portanto, acho bizarro”, disse.
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