Garantia Pública: Vamos pôr o dedo na ferida?

  • ECO
  • 26 Setembro 2024

Rui Bairrada, CEO do Doutor Finanças, fala sobre os efeitos da Garantia Pública.

Os jovens não conseguem comprar casa. A falta de oferta, os preços dos imóveis e os rendimentos dos jovens estão na base desta dificuldade. É um problema estrutural. As medidas imediatas correm o sério risco de virem embrulhadas em contraindicações.

Sabemos que o problema do acesso à habitação não se resolve do dia para a noite. A garantia pública, sendo uma medida que tem uma boa intenção, tem efeitos adversos e não são pequenos.

Os jovens que mais precisam desta garantia arriscam a ser quem que não vai beneficiar dela. E porquê? Qual é o vendedor que opta por esperar que um financiamento seja aprovado para “reservar” o imóvel?

Perante dois interessados: um que avança com uma entrada e outro que tem de esperar por ver o seu crédito aprovado para poder libertar algum dinheiro, qual será o escolhido?

Vendo a questão por este prisma, resta concluir que só as pessoas que tiverem capital próprio para dar uma entrada é que vão conseguir beneficiar desta medida. Os jovens que não tiverem este dinheiro ficarão fora da corrida. E é por isso que digo que os jovens que realmente precisam de ajuda para comprar casa dificilmente a terão.

Doutor Finanças
Rui Bairrada, CEO do Doutor Finanças

Além disso, esta medida é um déjà vu. Financiarmos operações de compra de casa a 100% é corrermos o risco de uma crise afetar o imobiliário e os seus proprietários terem de vender o imóvel e, ainda assim, ficarem com uma dívida.

Recordemos a última crise que vivemos (e é só recuarmos 10 anos), em que algumas famílias tiveram de vender as suas casas porque deixaram de conseguir pagar os empréstimos. Em alguns casos, o valor de venda não cobriu a dívida que ainda tinham junto do banco. Foi este contexto que levou a que fossem implementadas medidas de proteção. Entre elas está a limitação de financiamento de um imóvel para um valor até 90%.

"Não podemos ignorar que os ciclos económicos nem sempre são favoráveis e que há o risco de passarmos por outro período de contração”

Rui Bairrada, CEO do Doutor Finanças

Sabemos que, desde então, o mercado imobiliário tem registado valorizações expressivas. Mas não podemos ignorar que os ciclos económicos nem sempre são favoráveis e que há o risco de passarmos por outro período de contração. Bem sei que esta medida poderá permitir que alguns jovens comprem casa, mas é importante termos todos consciência das contraindicações.

A estas questões acresce ainda o risco de estas medidas acentuarem a procura de imóveis (já há indicadores que apontam para esta realidade), num período em que a oferta vai demorar a aumentar. É expectável que isto represente uma pressão adicional no mercado imobiliário.

Conscientes de todos os efeitos adversos, é fundamental acelerar o lado da oferta, porque será esta a única solução que permitirá encontrar um equilíbrio no mercado. É preciso haver casas para comprar. Mas não só. É preciso que o mercado de arrendamento funcione efetivamente e permita que os jovens, e os menos jovens, tenham realmente acesso à habitação, sem porem em risco o seu futuro.

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