Portugal diverge positivamente: uma das exceções no pessimismo europeu
Apesar do contexto adverso, Portugal tem evidenciado um desempenho económico favorável, impulsionado pelo forte crescimento da população empregada.
Portugal vive atualmente um momento de relativo otimismo económico, em contraste com o pessimismo predominante na Alemanha, França e na Zona Euro. O indicador de sentimento económico para Portugal, calculado pela Comissão Europeia, manteve-se nos 107 pontos em dezembro de 2024, permanecendo em território de expansão económica, definido por valores acima dos 100 pontos, os quais separam a expansão da contração da atividade económica, enquanto a média da Zona Euro caiu para 93,7 pontos, refletindo um cenário recessivo.
Este contraste evidencia uma fase de maior resiliência da economia portuguesa, destacando-se no contexto europeu como uma exceção à tendência negativa vivida no eixo franco-alemão. O sentimento económico da Alemanha recuou para 86,1 pontos, enquanto o de França desceu para 93,5 pontos, refletindo as dificuldades enfrentadas pelas duas maiores economias da Zona Euro e contrastando com o desempenho mais robusto da economia portuguesa.
A maior economia da Zona Euro, a Alemanha, enfrenta desafios importantes para preservar os seus mercados históricos da crescente concorrência global e para manter a competitividade nos mercados globais, sobretudo nos asiáticos, onde o domínio de qualidade e inovação se encontra cada vez mais em risco. Entre os principais fatores que agravam esta situação estão os elevados custos de energia, em contraste com a competitividade anteriormente garantida pelo gás russo barato, um recurso estratégico que não apenas reduzia custos, mas também fortalecia setores competitivos extra-preço, especialmente aqueles caracterizados por avanços tecnológicos. Diferentemente dos setores competitivos via preço, que dependem mais de mão de obra intensiva, os setores competitivos extra-preço, como os da inovação, são mais intensivos em capital e dependentes de energia barata, agravando-se ainda mais com o abandono da energia nuclear após o desastre de Fukushima, em 2011.
Além disso, a forte pressão no setor automóvel, sobretudo dos fabricantes chineses, e as crescentes dificuldades políticas, num contexto em que se aproximam as eleições de fevereiro, intensificam os desafios enfrentados pela Alemanha.
Por sua vez, a França tem enfrentado problemas semelhantes, tanto no plano económico quanto no político, sendo penalizada pelos crescentes défices orçamentais, agravados pelo envelhecimento demográfico, e pela possibilidade de uma instabilidade política prolongada. Estas fraquezas refletem as atuais limitações do eixo franco-alemão, o tradicional centro nevrálgico da integração económica europeia, que, ao enfraquecer, representa também dificuldades para todos os países da União Europeia, incluindo Portugal.
Segundo o Statista, o peso da economia alemã na União Europeia foi de 24,3% em 2023, seguido da França com 16,5%, Itália com 12,3% e Espanha com 8,6%, enquanto Portugal representou apenas 1,57% do PIB da região. Na Zona Euro, o peso da economia alemã é ainda maior, representando aproximadamente 30% do total.
Apesar deste contexto adverso, Portugal tem evidenciado um desempenho económico favorável, impulsionado pelo forte crescimento da população empregada, que atingiu quase 5,2 milhões de trabalhadores no final de 2023, de acordo com o Banco de Portugal, representando um aumento superior a 15% desde 2013. Uma parte deste aumento deve-se à imigração, muitas vezes favorecida pela proximidade cultural com países lusófonos de África e com o Brasil.
Este crescimento económico também tem sido sustentado por setores-chave como o turismo, que tem beneficiado da segurança do país e do seu sol. Paralelamente, Portugal tornou-se um destino atrativo para reformados de economias mais avançadas, que veem o país como um local seguro, com abundância de sol, sendo frequentemente apelidado da “Flórida da Europa”. Este fluxo de investidores e residentes estrangeiros tem dinamizado setores como o imobiliário e os serviços, fortalecendo a economia nacional. Outro setor em crescimento é a construção, que também tem desempenhado um papel importante como motor económico.
No entanto, para garantir a sustentabilidade do crescimento e assegurar a competitividade a longo prazo, é essencial que Portugal invista em soluções energéticas eficientes e que permitam uma base ininterrupta. Entre as possibilidades está o desenvolvimento de energia nuclear de última geração, como os pequenos reatores modulares (Small Modular Reactors, SMR), podendo substituir o gás natural como fonte de energia de base (baseload energy).
Estes reatores, ainda em fase inicial de implantação global, apresentam vantagens como custos reduzidos, maior segurança e flexibilidade, podendo ser uma peça-chave na transição energética de Portugal, reduzindo a dependência de combustíveis fósseis e complementando as intermitentes fontes renováveis, como hídrica, eólica e solar.
(O armazenamento de energia continua a ser um desafio, não sendo ainda uma solução viável em larga escala, exceto no caso de armazenamento a montante nas albufeiras das barragens, que funcionam como “baterias naturais”, embora vulneráveis à seca.)
Esses fatores são essenciais para o desenvolvimento de fontes de energia fiáveis e consistentes, como os SMR, não apenas para garantir a estabilidade do sistema energético nacional, mas também para atrair indústrias de todo o mundo. Quem oferecer energia mais barata e dispor de capital humano de excelência terá, com grande probabilidade, uma competitividade crescente no futuro.
É importante adotar uma visão que vá além do consumo atual de eletricidade, compreendendo que a geração de energia em maiores quantidades não apenas reduz os custos de produção, mas também cria condições mais favoráveis para a instalação em Portugal, por exemplo, de data centers e de setores industriais com elevado consumo energético, fortalecendo a economia nacional e aumentando a sua competitividade.
Além disso, um excedente de energia pode viabilizar sistemas de transporte elétrico, público e privado, mais acessíveis e eficientes, substituindo gradualmente os transportes a combustíveis fósseis. Esta transição energética não só promove uma economia mais sustentável e competitiva, como também reduz a dependência das importações de petróleo, que continua a pesar significativamente na nossa balança de pagamentos.
O crescente aumento da população empregada, aliado ao impulso do turismo e à retoma da construção, coloca Portugal numa trajetória divergente do sentimento económico pessimista vívido no centro da Europa, enquanto converge gradualmente com esses mesmos países em termos de desenvolvimento e competitividade.
O atual desempenho económico de Portugal é especialmente notável quando comparado com a sua trajetória histórica. Desde 1987, quando começaram a ser compilados estes dados para o país, pouco mais de um ano após a sua entrada na Comunidade Económica Europeia (CEE), em janeiro de 1986, é difícil encontrar uma divergência tão favorável para Portugal como a que se verifica atualmente.
O sentimento económico em dezembro de 2024 apresenta variações significativas entre os países da União Europeia. Na média da UE, o indicador desceu de 96,2 pontos em novembro para 94,5 pontos em dezembro, refletindo um ambiente económico maioritariamente negativo. No entanto, alguns países, como Espanha e Grécia, registam um sentimento económico muito semelhante ao português, mantendo-se em terreno positivo. Entre as economias mais pequenas que também têm apresentado um sentimento económico otimista encontram-se a Croácia, o Chipre, a Lituânia, a Sérvia, a Albânia, o Montenegro e a Macedónia do Norte, mostrando alguma resiliência face ao cenário europeu.
Por outro lado, os países que gravitam economicamente em torno da Alemanha têm sido os mais afetados. A Áustria, por exemplo, registou apenas 83,8 pontos, o valor mais baixo de toda a União Europeia. Também a Chéquia (96,4 pontos) e a Eslováquia (100,4 pontos), muitas vezes vistas como extensões económicas da Alemanha, evidenciam o impacto das dificuldades vividas pelo eixo franco-alemão.
Outros países da Europa de Leste apresentaram melhores resultados no indicador: a Roménia alcançou 102,6 pontos, a Polónia ficou nos 99,2 pontos, e a Bulgária destacou-se com 106,2 pontos. No entanto, a Hungria registou 91,7 pontos, abaixo da média da União Europeia.
No caso de Portugal, uma economia aberta e altamente exposta ao comércio internacional, qualquer crise económica global ou dificuldades prolongadas no eixo franco-alemão podem interromper a atual tendência de resiliência económica. Contudo, espera-se que, caso isso ocorra, seja apenas temporariamente, permitindo ao país continuar a convergir gradualmente com as economias mais desenvolvidas da Europa. É crucial manter o rumo, investindo em energia, infraestruturas e capital humano, para que o atual momento favorável se mantenha e para que Portugal continue a trilhar o caminho da convergência económica e social no contexto europeu.
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