Debate sobre presidenciais precipitou-se e fevereiro pode tornar-se o mês do fim dos tabus e de (quase) todos os anúncios. Politólogos assinalam que protocandidatos querem evitar perder terreno.
No jogo da glória das presidenciais, o tiro de partida precipitou-se e os protocandidatos estão a ser pressionados para avançarem mais cedo com o anúncio, com fevereiro a tornar-se o mês de referência. A influenciar o timing estão, de acordo com os politólogos ouvidos pelo ECO, Henrique Gouveia e Melo, um candidato fora do circuito político que, a acreditar nas sondagens, se perfila forte, e as eleições autárquicas, que terão lugar a poucos meses de janeiro de 2026, mês em que os eleitores serão chamados a eleger o sucessor de Marcelo Rebelo de Sousa em Belém.
“Um fator que pesa bastante no calendário das candidaturas é o Almirante Gouveia e Melo. Como já se percebeu que haverá um candidato fora do espetro dos dois principais partidos, tal obriga quer o PS, quer o PSD, quer os próprios potenciais candidatos a anteciparem a sua agenda. Esperando muito mais qual é o risco? Havendo essa pré-candidatura, os candidatos do PS e PSD irem perdendo terreno“, considera André Azevedo Alves, politólogo e professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica, em declarações ao ECO.
Gouveia e Melo ainda não desfez o tabu sobre se entra na corrida, mas vai dando sinais nesse sentido. Tendo antecipado a passagem à reserva, afirmou recentemente que este é o momento de “tirar umas merecidas férias”, remetendo para “depois” outras decisões, enquanto as sondagens o colocam como o favorito. Entre 19 potenciais candidatos, segundo o estudo da Pitagórica para a TSF/Jornal de Notícias/TVI/CNN Portugal, divulgado em 9 de janeiro, é o nome que regista maior potencial de voto (57%). Além de 28% dos inquiridos afirmarem que votariam “de certeza” nele e outros 29% admitirem que “talvez” o façam, Gouveia e Melo tem também a menor rejeição de voto (39%) entre os eleitores.
O politólogo Bruno Ferreira Costa considera que o mais certo (e vantajoso) será que – a confirmar-se a sua candidatura – Gouveia e Melo seja dos últimos a anunciar. Não só para não se tornar no principal alvo ‘a abater’, mas também para ter tempo de entrar no contexto político uma vez que, até então, dedicou-se sempre à Marinha.
“Gouveia e Melo tem interesse em apresentar a candidatura mais tarde para não ter tanto tempo de escrutínio, contraditório ou desgaste e poder, entretanto, aprender mais sobre o país e a estabilidade do Governo“, defende o professor da Universidade da Beira Interior (UBI), referindo a título de exemplo a candidatura de André Pestana, coordenador do sindicato dos professores STOP, que deu a conhecer a sua intenção de ser um dos nomes a Belém em dezembro, mas que nas últimas semanas “caiu num vazio”.
Nas últimas quatro eleições presidenciais, em média, os candidatos concentraram os anúncios de candidaturas em setembro e outubro.
Nas últimas quatro eleições presidenciais, em média, os candidatos concentraram os anúncios de candidaturas em setembro e outubro. Apenas dois avançaram em fevereiro: André Ventura (em 2020 para as eleições de 2021) e Fernando Nobre (e 2010 para as eleições de 2011). Contudo, é esse o mês apontando para que os candidatos apoiados pelo PSD e PS anunciem a decisão.
“Meados de fevereiro, inícios de março será a altura certa [para os candidatos apresentarem candidaturas]“, indica Paula Espírito Santo ao ECO. “Mais tarde, poderá ser demasiado em cima do tempo das eleições autárquicas que acabará por roubar as atenções. Vai ser uma campanha dividida”, conclui a politóloga e investigadora do Instituto de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa (ISCSP).
A candidatura à Presidência da República é unipessoal, o que significa que os cidadãos de nacionalidade portuguesa maiores de 35 anos não concorrem por um partido. No entanto, é tradição que os principais partidos apoiem um candidato da sua área política, permitindo-lhes que a campanha beneficie da estrutura do partido. O líder do PSD, Luís Montenegro, sinalizou há meses que iria apoiar um militante. Com Pedro Passos Coelho autoexcluído da corrida, a candidatura do ex-líder social-democrata e comentador Luís Marques Mendes é considerado o segredo mais mal guardado da política portuguesa.
Montenegro garantiu recentemente que a solução de apoio do PSD a um candidato presidencial está “perto” e será “uma boa solução”, que “vai mobilizar o país e vai dar ao país aquilo que o país precisa”. O ministro adjunto e da Coesão Territorial, Manuel Castro Almeida, tem sido a voz mais sonante a manifestar-se publicamente sobre o assunto. Desde janeiro que em diversas entrevistas defende Marques Mendes como o candidato da sua ala.
“Desejo que Luís Marques Mendes apresente a sua candidatura e a minha convicção é que o PSD irá apoiá-lo“, afirmou em entrevista ao Observador. De acordo com o jornal Público, o antigo líder do PSD irá formalizar a candidatura a Belém em fevereiro e abandonar o programa de comentário na SIC. Contactada pelo ECO fonte da estação televisiva não quis fazer comentários, mas o ECO sabe que Marques Mendes deverá abandonar o canal com a entrada em vigor da nova grelha de programação.
Candidatura do ex-líder social-democrata e comentador Luís Marques Mendes é considerado o segredo mais mal guardado da política portuguesa.
Certo, é que o momento de anúncio da candidatura não deverá ocorrer num evento partidário. Aos olhos de professor de Ciência Política na Universidade da Beira Interior (UBI), Bruno Ferreira Costa, esse seria “um erro estratégico” dado que um candidato a Presidente da República tem de fazer campanha para “além do eleitorado de origem”.
“A candidatura terá de surgir num momento pessoal, individual. Sendo certo que nesse momento acontece em estreita colaboração, coordenação e comunicação com o partido para que, no momento imediato, possa anunciar formalmente uma declaração de apoio”, explica.
No caso do PSD, André Azevedo Alves atribui a antecipação face ao passado recente à “perceção” de que a candidatura de Marques Mendes “provavelmente vai ter muitas dificuldades” caso Gouveia e Melo avance e “ainda terá de fazer um longo caminho”. “Provavelmente terá tudo a ganhar em anunciar mais cedo para tentar que seja um candidato viável. Temos um cenário muito diferente quer no anúncio de Marcelo Rebelo de Sousa [em 2016], quer na comparação de perfil”, aponta.
Para o professor da Católica, o risco para o PSD estando no Governo “mais do que perder as presidenciais — embora também seja significativo — é a perspetiva que pode ocorrer face a dispersão de candidatos à direta do candidato apresentado ter um resultado muito mau“. Segundo o politólogo, mesmo que Gouveia e Melo não ganhe, “no mínimo influenciará a distribuição de votos” e uma eventual segunda volta.
Enquanto no PSD o nome do candidato está praticamente fechado, mitigando-se a hipótese de surgirem duas candidaturas de sociais-democratas, esta semana o PS fez um sprint para não ficar para trás. Em declarações à CNN, o presidente dos socialistas, Carlos César, anunciou que convocou a Comissão Nacional para o próximo dia 8 de fevereiro, “onde será tomada uma decisão” sobre o apoio do partido.
“No caso do PS temos outros fatores, além de Gouveia e Melo a acelerar pressões para a decisão, porque a própria escolha do candidato é motivo de clivagem interna. Estando o partido na oposição, é natural que estas se tornem mais agressivas e estão a refletir-se nas presidenciais”, assinala André Azevedo Lopes.
Outros fatores incidem sobre a necessidade do PS avaliar as sondagens e concentrar as escolhas num só candidato, no sentido de evitar o cenário de 2006, altura em que Mário Soares e Manuel Alegre anunciaram ambos uma candidatura e acabaram por perder contra Aníbal Cavaco Silva.
“Alguns candidatos querem perceber se têm apoio do partido mas os partidos ainda não estão numa fase de consensualizar opiniões. Estão à espera de sondagens. No caso do PS, o que tem acontecido desde 1996, é que o partido não tem conseguido centralizar ou convergir internamente as candidaturas porque tendem sempre a surgem várias”, explica Paula Espírito Santo.
Depois do governador do Banco de Portugal e ex-ministro das Finanças do Governo de António Costa, Mário Centeno, ter anunciado estar fora da corrida (era dado como bem posicionado nas sondagens), assim como Elisa Ferreira, o ‘duelo’ faz-se entre António Vitorino e António José Seguro, embora o nome de Augusto Santos Silva também entre na equação. O ex-presidente da Assembleia da República Augusto Santos Silva nunca descartou uma candidatura, embora em entrevista à RTP 2 tenha indicado que não avança case Vitorino entre em jogo. Posição que não assume sobre António José Seguro, que considera não “cumprir” os “requisitos mínimos” para a função.
O antigo secretário-geral socialista tem-se desdobrado em iniciativas, tentando medir o pulso à sua popularidade, e lançou o movimento UPortugal para “contribuir para a participação cívica dos portugueses”. António José Seguro garante que não aceita que lhe fixem tempos e não descarta avançar mesmo se Vitorino o fizer.
“Tenho os meus tempos, tenho as minhas conversas. Eu sou livre, não dependo de ninguém. Não me fixam prazos nem eu tenho prazos. É em função do que eu entendo em cada momento”, disse no espaço de comentário na CNN Portugal.
PS convocou Comissão Nacional para dia 8 de fevereiro para decidir qual o candidato apoiado pelo partido.
O presidente do Conselho Nacional para as Migrações e Asilo, António Vitorino, é apontando por vários órgãos de comunicação social como o favorito pela direção do PS. Carlos César destacou-lhe a “experiência e dimensão internacional” — foi diretor-geral da Organização Internacional para as Migrações e comissário Europeu. “É muito importante que esta eleição presidencial possa, na escolha dos portugueses, excluir simultaneamente extremismos ou protagonismos não identificados e que por isso são perigosos e que contribua para um equilíbrio entre os órgãos de soberania”, disse o presidente do PS na CNN Portugal quando questionado sobre Vitorino.
As declarações de Carlos César tiveram lugar depois de, na sexta-feira passada, o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, em entrevista ao Expresso, ter considerado que “num mundo em que, infelizmente, as guerras voltam” e “em que a política internacional é cada vez mais desafiante, ter um Presidente da República com experiência e dimensão internacional” lhe parece “importante”.
O líder socialista defendeu também a importância que haja “apenas uma candidatura” do seu campo político, porque aumenta as possibilidades de disputar uma vitória. Mas admitiu: “o secretário-geral do PS não controla a vontade individual de personalidades. Podemos sempre usar da nossa capacidade de convencimento, mas, no limite, é a vontade de cada um“, disse, num recado claro às declarações de Seguro.
O início do mês de fevereiro deverá ficar antes marcado pelo anúncio este fim-de-semana da Iniciativa Liberal durante a Convenção Nacional sobre o candidato escolhido. Por seu lado, o anúncio formal de André Ventura, com o apoio do Chega, está marcado para dia 28, embora já o tenha assumido publicamente. O PCP já sinalizou que irá apresentar um candidato próprio, enquanto no Bloco de Esquerda Marisa Matias já afastou uma candidatura e o partido tem insistido que a esquerda precisa de uma “candidatura forte”.
A pressionar os calendários estão também as eleições autárquicas. De acordo com Bruno Ferreira Costa, estas vão testar os quadros dos dois principais partidos numa altura em que vários incumbentes estão impedidos de se recandidatarem por terem atingido o limite de mandato, mas também vão pôr à prova o partido que suporta o Governo e que, nesta altura do campeonato, procura uma revalidação do eleitorado – ambição semelhante à do PS.
A pressionar os calendários estão também as eleições autárquicas, que terão lugar a poucos meses das presidenciais.
“Os partidos não querem misturar as duas lutas eleitorais. Existe uma razão para alguns candidatos [à Presidência da República] já terem entrado em terreno de campanha, ou pré-campanha, antes da segunda metade do ano e isso diz respeito ao grau de notoriedade que têm – ou não“, argumenta o politólogo, acrescentando que “grande parte dos candidatos que se vai falando já tem um grau de notoriedade significativo”. Assim, “havendo já uma ideia de uma potencial formalização de candidatura, esses nomes já estão na mira da comunicação social e isso permite preservar o candidato para um momento mais adequado, evitando um desgaste“, explica.
Uma coisa é garantida: “tanto à esquerda como à direita, os potenciais candidatos estão à espera de feedback do partido de origem para decidir se avançam com uma candidatura“, resume Paula Espírito Santo, excluindo a análise dos nomes independentes. Os outros, “precisam do apoio do partido e sem o apoio não avançam”, conclui.
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Almirante e autárquicas fazem acelerar anúncios para as presidenciais
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