“É importante avaliar segurança e transparência dos modelos” de IA chineses, alerta Accenture

Paula Fernandes, diretora da Accenture Portugal para a área da Tecnologia, considera que a concorrência é benéfica, sobretudo a longo prazo, mas pede atenção à origem dos serviços de IA

Quase sete em cada dez (69%) executivos consideram que a difusão da Inteligência Artificial (IA), a um ritmo maior do que qualquer outra tecnologia, traz uma nova urgência à reinvenção das empresas e dos processos, concluiu a consultora Accenture no relatório Technology Vision 2025. A contrariedade é que esse raciocínio e os investimentos ainda não estão a surtir efeito em todas as organizações.

Em entrevista ao ECO, a managing director da Accenture Portugal responsável pela área de Tecnologia explica que essa lacuna se deve ao facto de ainda estarem na fase de experimentação da tecnologia. “Ainda não conseguiram integrá-la de forma eficaz nos seus modelos de negócio”, reconhece Paula Fernandes. Logo, recomenda que pensem na IA enquanto abordagem estratégica e integrada em vez de uma ferramenta isolada.

A especialista da Accenture comenta ainda o crescente número de plataformas de IA chinesas, que se mostram cada vez mais rápidas, embora a imparcialidade da informação seja questionável. Na opinião de Paula Fernandes, esta concorrência é “benéfica”, porque reduz a dependência de determinados fornecedores, mas as empresas e governos “devem estar atentos” à sua origem e funcionamento.

A Accenture concluiu que mais de um terço (36%) dos executivos afirmam que as suas empresas aumentaram as soluções de IA generativa, mas só 13% alcançaram um “impacto significativo a nível empresarial”. Por que está a ser difícil para as organizações obterem resultados?

A adoção de soluções de IA generativa não é apenas uma questão de implementação tecnológica, mas sim de transformação organizacional. Muitas empresas estão a experimentar a tecnologia, mas ainda não conseguiram integrá-la de forma eficaz nos seus modelos de negócio. Além disso, existem desafios em termos de escalabilidade, segurança e gestão da qualidade dos resultados gerados pela IA. É fundamental que as organizações não vejam a IA generativa apenas como uma ferramenta isolada, mas sim como um catalisador de mudança que exige uma abordagem estratégica e integrada, para realmente impulsionar valor empresarial.

Em Portugal, onde apenas 17% das empresas utilizam IA, segundo a Acepi, como é que os gestores podem tirar mais proveito desta tecnologia?

Acreditamos que os gestores portugueses devem encarar a IA como um investimento estratégico e não apenas como um custo operacional. Para tirar maior proveito, é essencial começar por identificar as áreas do negócio onde a IA pode gerar impacto imediato, como a automatização de processos repetitivos, análise avançada de dados ou personalização da experiência do cliente. Paralelamente, é necessário investir na capacitação das equipas e criar uma cultura de inovação.

 

Um dos problemas identificados no estudo é que chatbots semelhantes uns aos outros prejudicam a diferenciação das empresas. Como é que se pode inovar neste tipo de ferramentas digitais?

A diferenciação nos chatbots passa pela incorporação de identidade e personalidade digital nas interações com os clientes. Acreditamos que as empresas devem evitar abordagens genéricas e focar-se na criação de assistentes virtuais personalizados, que reflitam os valores e a voz da marca. Além disso, a integração de IA generativa pode permitir respostas mais contextuais e naturais, aumentando a capacidade de compreensão e interação. Tecnologias como processamento de linguagem natural avançado e integração com sistemas internos podem tornar os chatbots mais dinâmicos e eficazes. Finalmente, é crucial garantir que os chatbots estão alinhados com as necessidades e preferências dos clientes, através da recolha e análise de feedback contínuo.

Nas últimas semanas, assistimos a anúncios de investimentos massivos em IA quer pela administração Trump quer pelas Big Tech, que reforçarão o capex dedicado a esta área para 2025. Não receia que o ceticismo cresça entre os investidores e consumidores?

A crescente aposta em IA demonstra a importância estratégica desta tecnologia para o futuro. No entanto, é compreensível que possa surgir algum ceticismo, especialmente se os investimentos não forem acompanhados de um retorno visível. À medida que as aplicações da IA se tornam mais tangíveis e os benefícios mais evidentes, a confiança deve aumentar. Para mitigar esse risco, é fundamental uma comunicação transparente sobre os objetivos, as aplicações e os benefícios concretos da IA, tanto para os negócios como para a sociedade. Além disso, a regulação e a ética devem desempenhar um papel central na adoção de IA, para garantir um desenvolvimento sustentável e confiança por parte de todos os intervenientes.

Várias empresas de IA garantiram à imprensa americana que a DeepSeek é mais uma oportunidade do que uma ameaça, porque os programadores ficam menos dependentes de modelos mais fechados e caros, como o da OpenAI. Qual a sua opinião sobre estes players chineses?

A concorrência entre diferentes players de IA é benéfica para o ecossistema tecnológico global, pois incentiva a inovação e reduz a dependência de poucos fornecedores. A longo prazo, essa concorrência pode impulsionar uma maior democratização da IA, dando mais opções a empresas e programadores. No entanto, é importante avaliar a segurança, transparência e conformidade destes modelos, especialmente em termos de proteção de dados e ética. Organizações e governos devem estar atentos à proveniência e aos mecanismos de funcionamento destas plataformas para garantir uma adoção segura e alinhada com as normas internacionais.

É compreensível que possa surgir algum ceticismo sobre a IA, especialmente se os investimentos não forem acompanhados de um retorno visível.

Paula Fernandes

Managing director da Accenture Portugal responsável por Tecnologia

 

O relatório tem previsões específicas para o futuro: em 2027 uma grande empresa iniciará um programa para recompensar os trabalhadores pela automatização de tarefas e, em 2035, a maioria dos setores verá o lucro por colaborador duplicar numa década. Como funcionaria esse plano de recompensas? Essa duplicação de lucros é por eficiência através de IA?

De acordo com o nosso estudo, o plano de recompensas funcionaria incentivando os colaboradores a identificar processos que podem ser automatizados e sugerir soluções baseadas em IA, promovendo uma cultura de inovação. Esse modelo pode incluir bonificações financeiras, programas de desenvolvimento profissional e reconhecimento interno. A duplicação dos lucros está diretamente relacionada à maior eficiência proporcionada pela IA, reduzindo custos operacionais e aumentando a produtividade. A ideia é que, em vez de encarar a IA como uma ameaça, os colaboradores sejam incentivados a utilizar estas ferramentas para aumentar a sua produtividade e criar valor.

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