Já há duas decisões a declarar “inconstitucional” lei que limita reinscrição da Função Pública na CGA

Segunda sentença dita o regresso à Caixa Geral de Aposentações de mais três professores, que saíram e depois voltaram à escola pública. Governo aguarda pela pronúncia do Tribunal Constitucional.

Uma segunda decisão judicial voltou a declarar a “inconstitucionalidade” da lei interpretativa, com origem no Governo e aprovada pelo Parlamento, que restringe a subscrição de funcionários públicos na Caixa Geral de Aposentações (CGA) por “violação do princípio da confiança”. Ao terceiro juízo no mesmo sentido, o Tribunal Constitucional terá de se pronunciar de forma geral e abstrata e decidir se elimina ou não a norma do ordenamento jurídico.

O Ministério do Trabalho, que tutela esta área, foi questionado pelo ECO se tenciona revogar o diploma face às sentenças de primeira instância que têm vindo a considerar que a norma viola a Lei Fundamental. Mas, para já, “o Governo não quer antecipar-se à declaração do Tribunal Constitucional, pelo que é prematura uma resposta”, afirmou fonte oficial do gabinete da ministra Maria do Rosário Palma Ramalho.

A nova sentença, também proveniente do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, determinou a reinscrição de três docentes no subsistema de proteção social convergente com efeitos a 2012, 2007 e 2005, respetivamente, segundo o acórdão a que o ECO teve acesso. De salientar que a CGA tem um regime mais favorável do que o da Segurança Social designadamente no pagamento de baixas médicas.

O juízo diz apenas respeito à situação em particular, não se podendo aplicar a outras, mas, após três julgamentos desta natureza, o plenário do Tribunal Constitucional (TC) é chamado a pronunciar-se de forma geral. Se confirmar a inconstitucionalidade, a lei cai e volta a regra que permite o reingresso sem limites de trabalhadores à CGA que tinham sido subscritores antes de 1 de janeiro de 2006, data em que o sistema foi encerrado, deixando de aceitar novos registos.

Este segundo acórdão debruça-se sobre o caso de três professores. Um começou a dar aulas em 1995 e foi admitido na CGA nesse mesmo ano, tendo “iniciado e cessado contratos” entre cada ano letivo com várias escolas. Em novembro de 2012, depois de ter celebrado novo vínculo noutro estabelecimento de ensino, o Estado cancelou o registo na CGA e inscreveu-a na Segurança Social.

O segundo professor iniciou a atividade em 2000 e, nesse mesmo ano, passou a subscritor do sistema de proteção social convergente. Também lecionou em várias escolas, “tendo iniciado e cessado contratos”, lê-se na sentença. E, em março de 2007, perdeu o direito à CGA e passou a descontar para a Segurança Social.

O terceiro caso é semelhante em tudo, apenas mudam as datas: o docente começou a trabalhar em 2003, ano em que se inscreveu na CGA. Mas, em setembro de 2005, transitou, à sua revelia, para a Segurança Social.

O Governo não quer antecipar-se à declaração do Tribunal Constitucional, pelo que é prematura uma resposta.

Ministério do Trabalho

Face aos vários acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo (STA) favoráveis ao regresso de trabalhadores à CGA, o juiz acabou por dar razão aos professores e a decisão foi proferida a 28 de janeiro deste ano, já depois da publicação da lei de dezembro do ano passado que restringe o registo de funcionários públicos que saíram e voltaram a trabalhar para o Estado.

Assim, estes funcionários públicos terão direito a reinscrever-se no regime de proteção social convergente com efeitos a 2012, 2007 e 2005, respetivamente. Mas esta decisão ficará suspensa até pronúncia do Tribunal Constitucional, após recurso do Ministério Público.

A conclusão é semelhante à da primeira sentença que o ECO noticiou: “Desaplica-se o número 2 do artigo 2.º da Lei n.º 45/2024 de 27 de dezembro por inconstitucionalidade”, devido à “violação do princípio da confiança”. O acórdão contesta o diploma, com origem no Governo e aprovado pelo Parlamento, que meteu um travão à reinscrição de trabalhadores no subsistema de proteção social convergente. Essa lei procede a uma “interpretação autêntica” das regras que permitem que funcionários voltem à CGA, depois de um hiato em que saíram por terem deixado de trabalhar para o Estado.

De lembrar que o subsistema de proteção social deixou deixou de aceitar novos subscritores desde 1 de janeiro de 2006. Ou seja, apenas os trabalhadores que estavam inscritos em data anterior podem regressar à CGA quando voltem a exercer funções na Administração Pública.

O artigo, declarado inconstitucional e que contraria vários acórdãos de tribunais superiores, estabelece que só é possível a reinscrição de funcionários públicos quando se verifique que não existiu descontinuidade temporal na prestação de trabalho ao Estado ou, existindo, se comprove que foi involuntária, limitada no tempo e justificada pelas especificidades próprias da carreira. Para além disso, é preciso comprovar que o funcionário não exerceu atividade remunerada durante o período em que interrompeu o vínculo público.

“O legislador viola a confiança legítima dos particulares e, consequentemente, o princípio da proteção da confiança, quando decide introduzir, em 2024, inovações na Lei n.º 60/2005, sem qualquer consideração pelos efeitos já constituídos, sem qualquer consideração pela jurisprudência que, de forma reiterada e constante, vinha atribuindo aos professores o direito à inscrição na Caixa Geral de Aposentações a quem antes de 1 de janeiro de 2006, estivesse inscrito nesse regime de providência”, conclui o juiz.

Perante as decisões de inconstitucionalidade da regra que limita o regresso dos trabalhadores à CGA, a Federação Nacional dos Professores (Fenprof) já enviou um ofício à Provedoria de Justiça “solicitando pronunciamento sobre as dúvidas de constitucionalidade da Lei n.º 45/2024, de 27 de dezembro”, afirmou ao ECO o secretário-geral da federação sindical Mário Nogueira. “Fomos informados de que já estava criado um grupo de trabalho e que, muito em breve, a Provedoria de Justiça se iria pronunciar”, sublinhou.

Tribunal Constitucional pode eliminar a lei ao fim de três sentenças

Tribunal ConstitucionalLusa

As decisões judiciais que têm saído vinculam apenas o caso concreto que apreciam. Não tem força geral para. Nestes casos, “o Ministério Público é sempre obrigado a recorrer para o Tribunal Constitucional e, até chegar a uma decisão, são suspensos os efeitos da sentença da primeira instância”, explicou ao ECO o constitucionalista Tiago Duarte.

O coletivo de juízes pode confirmar o juízo do tribunal administrativo, “que se aplica exclusivamente àquele situação, ou seja, não tem efeitos gerais”, refere. “Se considerar que não é inconstitucional, força o tribunal a refazer a sentença”, impedindo assim a reinscrição daquele trabalhador na CGA, acrescenta.

E quando é que a declaração de inconstitucionalidade ganha força geral? “Após três decisões de inconstitucionalidade”, que cheguem ao Palácio de Ratton “por recurso do Ministério Público, o Tribunal Constitucional tem de reunir todos os seus 13 juízes e decidir se de facto aquela norma viola efetivamente a lei fundamental. Se considerar que é realmente inconstitucional, então a norma tem de ser eliminada do ordenamento jurídico”, o professor de Direito Constitucional da Universidade Católica.

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