Contas de Benfica e Sporting escrutinadas pelo apito do VAR

Empatados na liderança do campeonato mas em polos opostos na gestão das suas contas. As águias lideram em lucros, mas os leões apostam na sustentabilidade. Quem será o campeão, dentro e fora de campo?

As quatro linhas são o palco principal do confronto entre leões e águias, mas nos bastidores desenrola-se uma outra batalha igualmente feroz e determinante para o futuro dos dois grandes rivais do futebol nacional.

Se na tabela classificativa os dois emblemas estão empatados na liderança do campeonato nacional, no plano financeiro as contas são bem mais bicudas, como revelam as contas do primeiro semestre fiscal (que agregam o período de julho a dezembro) das sociedades anónimas desportivas (SAD) de Benfica e Sporting, que foram apresentadas esta semana.

A Benfica SAD apresentou um lucro de 40,3 milhões de euros no primeiro semestre de 2024/2025, mais do dobro do período homólogo (18 milhões de euros), constituindo o segundo melhor resultado de sempre para um primeiro semestre na história da SAD encarnada — apenas os números recorde de 2019/2020, impulsionados pela venda de João Félix ao Atlético Madrid, superam este registo.

Em Alvalade, a Sporting SAD apresentou um resultado líquido de 15 milhões de euros, significativamente abaixo dos 58,3 milhões registados no período homólogo anterior — que tinha sido o melhor de sempre.

Quem olhar apenas para estes valores poderá rapidamente declarar vitória para o lado da Luz, mas tal como sucede dentro das quatro linhas quando a bola entra na baliza, é preciso recorrer ao VAR, porque os lucros são apenas a ponta do icebergue de qualquer operação empresarial.

O Sporting parece ter encontrado um caminho de sustentabilidade após anos de turbulência financeira, enquanto o Benfica mantém um modelo de negócio fortemente dependente da valorização e venda dos seus ativos.

A SAD encarnada viu os seus resultados impulsionados fundamentalmente pela venda de jogadores. As transferências de João Neves (59,9 milhões mais 10 milhões por objetivos), Marcos Leonardo (40 milhões), David Neres (28 milhões mais 2 milhões por objetivos) e Morato (11 milhões mais 6 milhões por objetivos) geraram um encaixe superior a 104 milhões de euros em receitas. Somem-se os 39,7 milhões de euros provenientes da participação na Liga dos Campeões e está explicada a origem de grande parte dos resultados da SAD benfiquista.

Já o Sporting construiu o seu resultado de forma diferente. Os rendimentos operacionais, excluindo transações de jogadores, totalizaram 94,5 milhões de euros, um crescimento de 71% face ao período homólogo. O negócio de merchandising atingiu recordes históricos (acima dos 9,8 milhões de euros), a venda de Gamebox alcançou os 8 milhões (metade deste montante foi alcançado no exercício) e a participação na renovada Liga dos Campeões também contribuiu significativamente para as contas leoninas.

Essa dinâmica contribuiu para que a Sporting SAD fechasse as contas com resultados operacionais excluindo transações de atletas de 16,7 milhões de euros, que se traduziu num crescimento homólogo de 78% face aos números do primeiro semestre da época 2022/2023.

Em contraste, a Benfica SAD continua a evidenciar uma operação deficitária, com os rendimentos operacionais excluindo transações de atletas a ficarem-se pelo 105,7 milhões de euros face a custos operacionais de 142,9 milhões. Este desequilíbrio estrutural significa que, por cada 10 euros de rendimentos operacionais sem transações de atletas, a Benfica SAD gastou 13,5 euros em custos operacionais.

Estas realidades revelam filosofias de gestão bem distintas: enquanto o Benfica continua muito dependente da venda de ativos (jogadores), o Sporting parece apostar numa diversificação maior das suas fontes de rendimento.

Para a Benfica SAD, esta opção de gestão tem ainda um desafio acrescido face à volatilidade de que depende a cotação de um jogador de futebol. É que, nos últimos três anos, por cada euro ganho entre compras e vendas, apenas 15 cêntimos entraram efetivamente nos cofres do Benfica, contra 84 cêntimos no Sporting. É como comparar um negócio com uma margem de lucro de 15% contra outro com 84%.

Tal como no futebol, no mundo das finanças também não basta ganhar hoje – é preciso construir as bases para continuar a vencer amanhã. E nesse aspeto, talvez o leão esteja a dar passos mais seguros do que a águia, apesar dos números imediatos sugerirem o contrário.

As contas das duas SAD revelam que o Benfica apresenta-se como uma potência financeira com maior volume de negócios e maior capacidade de gerar lucros a curto prazo, principalmente através da venda de jogadores. No entanto, a sua operação é deficitária quando excluídas estas transações, o que levanta questões sobre a sustentabilidade a longo prazo.

O Sporting, por sua vez, após uma reestruturação profunda da sua dívida em 2023– marcada por um perdão de cerca de 96 milhões de euros do Novobanco e do BCP em 2023, que permitiu aos leões reduzir drasticamente a dívida bancária e assim “limpar” o seu balanço -, parece apostar numa estratégia mais focada na sustentabilidade e na diversificação de receitas.

Se o campeonato financeiro se decidisse apenas pelos lucros do semestre, o Benfica seria o claro vencedor. No entanto, a saúde financeira de uma SAD é muito mais do que o resultado líquido de um período.

O Sporting parece ter encontrado um caminho de sustentabilidade após anos de turbulência financeira, enquanto o Benfica mantém um modelo de negócio fortemente dependente da valorização e venda dos seus ativos. A questão que se coloca é: qual das estratégias se revelará mais eficaz a longo prazo?

Tal como no futebol, no mundo das finanças também não basta ganhar hoje – é preciso construir as bases para continuar a vencer amanhã. E nesse aspeto, talvez o leão esteja a dar passos mais seguros do que a águia, apesar dos números imediatos sugerirem o contrário.

Por enquanto, os dois rivais continuam empatados na tabela do campeonato. Resta saber se, tal como nas contas, a filosofia de gestão mais sustentável acabará por triunfar nos relvados.

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