Comunhão de adquiridos

Se a segurança passou a ser uma questão existencial, necessidade de investir mais em defesa se junta à necessidade de investir mais e mais rapidamente na transição energética.

Em 2008, vivemos uma crise de dívida privada vinda dos EUA, que se tornou numa crise que ameaçou implodir a Zona Euro. A crise foi interpretada como uma disputa entre credores e devedores públicos, que só podia ser sanada através da disciplina orçamental. Ante o choque externo vindo dos EUA, a UE dividiu-se e reafirmou uma certa ideia de ortodoxia orçamental supostamente violada por um conjunto de Estados-membros indisciplinados. Incapaz de agir coletivamente, sobrou o moralismo punitivo. A autofagia europeia só foi travada por Mario Draghi e pelo BCE.

E quanto às respostas aos desafios identificados por Draghi – que, diante dos desenvolvimentos recentes nos EUA, se tornaram ainda mais urgentes e prementes? A União Europeia repetirá os erros do passado ou, ao contrário, devemos ver a resposta à pandemia – quando a UE demonstrou unidade e mobilização para enfrentar a crise – como um modelo a ser seguido?

Ao contrário do que aconteceu em 2008, não estamos a discutir partilha de responsabilidades por dívidas passadas, públicas ou privadas. O momento presente não é passível de ser interpretado como uma disputa interna entre devedores e credores, assente numa lógica de separação de bens, porque não é sobre o passado, nem sobre quem paga esta ou aquela dívida. É sobre saber se um conjunto de países é capaz de agir coletivamente e de assumir compromissos futuros em matérias que implicaram sempre fortes investimentos e que não são compatíveis com os espartilhos orçamentais existentes. A UE foi capaz de agir coletivamente na resposta a pandemia e terá de ser capaz de fazer algo semelhante para responder de forma satisfatória aos desafios identificados no relatório Draghi, que se tornaram ainda mais urgentes com a eleição de Trump.

E nesta resposta europeia importa não enveredar pela lógica “austeritária” sugerida por Mark Rutte, ex-primeiro ministro dos Países Baixos, agora Secretário-Geral da Nato. Para investir mais em defesa, os países europeus não estão obrigados a cortar noutras despesas, sobretudo não estão obrigados a reduzir investimentos na transição energética. O investimento não tem de ser financiado com cortes.

Se a segurança passou a ser uma questão existencial, então tal significa que a necessidade de investir mais em defesa se junta à necessidade de investir mais e mais rapidamente na transição energética. São ambas formas de os países europeus reforçarem a sua autonomia estratégica e, por isso, devem avançar em paralelo.

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