Dos MBA nas universidades até CEO. Há fundos que são criados para quem pretende ser ser empreendedor sem criar uma empresa, mas precisa de capital até encontrar a perfeita para comprar.
O empreendedorismo por aquisição tem estado a crescer em Portugal e as faculdades de negócios começam a querer posicionar-se neste modelo de investimento em que o dinheiro serve para financiar a busca de empresas para comprar. Das salas de aula dos MBA costumam sair ideias e aspirações a CEO, mas para quem é mais avesso ao risco e não pretende criar uma empresa de raiz, adquirir um negócio estabelecido torna-se a opção preferencial.
É esse processo que se chama ETA – Entrepreneurship Through Acquisition e alimenta-se de Search Funds (“Fundos de Busca”) — que, como o próprio nome indica, são utilizados por ‘olheiros de aquisições’ e futuros gestores para ter capital enquanto fazem uma pesquisa intensiva pela empresa que vão adquirir. Empreendedorismo? Só mesmo a designação, até porque o conceito de “criar” é substituído por “investir” e o de “startup” por “PME”.
Em Portugal existem cerca de dez search funds, entre os quais Viriato Capital, Matter Capital, SLY Capital, Sobreiro Capital e Zinc Capital. O primeiro foi o Planalto Capital, criado em 2016 por João Diogo Stoffel, advogado de M&A e diretor-geral do grupo de colégios Project To Be.
Inspirada nas pisadas da Universidade de Stanford, a Nova SBE organizou um evento onde reuniu oito search funds portugueses e cerca de 20 investidores internacionais para provar que é possível “ser empreendedor comprando uma empresa, fazendo-a crescer” e posicionar-se perante a concorrência espanhola.
“Muitas vezes, o empreendedorismo são startups, rondas de capital de risco… Mas existem várias formas de os alunos virem a ser empreendedores. Uma das áreas que tem surtido especial atenção nas principais business schools americanas e, mais recentemente a nível europeu, é o ETA. Temos visto um crescimento grande em Portugal e na Europa seja no número de search funds seja no número de antigos alunos a prosseguir este caminho ou interessados em explorar”, conta ao ECO o diretor executivo do Nova SBE Haddad Entrepreneurship Institute, Euclides Major.
Temos visto um crescimento grande em Portugal e na Europa seja no número de search funds seja no número de antigos alunos a prosseguir este caminho ou interessados em explorar
O responsável do centro de empreendedorismo da Nova SBE diz que há uma percentagem significativa das pequenas e médias empresas em Portugal, cerca de 15%, que têm problemas de sucessão, pelo que “o talento jovem com alguma experiência profissional pode entrar e apresentar com uma solução de continuidade”.
“A Nova SBE pretende acompanhar esta tendência e liderar junto de algumas das principais escolas de negócios a nível europeu, até porque este ano há mais três fazer este tipo de eventos: London Business School, ICADE [Madrid] e IESE [Navarra]”, revela Euclides Major. É que enquanto nos Estados Unidos, este ecossistema está desenvolvido há várias décadas, na Europa há espaço para crescer, como se vê pelo facto de Espanha ser o mercado europeu mais desenvolvido (cerca de 50 search funds) e a Alemanha, com maior densidade populacional, tem menos de dez search funds ativos.

A sociedade de private equity Albira Investments foi uma das que esteve em Carcavelos atenta a um mercado que conhece bem, até porque encabeça este ciclo de investimento — financia os search funds, que depois comprarão uma empresa — e conta com quatro portugueses no portefólio (Sobreiro, Matter, Zinc e SLY).
“Estamos a falar de empresas sólidas em Portugal, Espanha, Itália… Não são startups. Começaram há uns 20-30 anos e são rentáveis. É por isso que gostamos delas. Acontece que pode haver um problema de sucessão, precisam de alguém que compre a empresa e os substitua no dia-a-dia de gestão, mas são demasiado pequenas ou requerem um período de transação que não interessa às típicas firmas de private equity”, explicou ao ECO o partner Marc Bartomeus.
Estamos a falar de empresas sólidas em Portugal, Espanha, Itália… Não são startups. Começaram há uns 20-30 anos e são rentáveis. É por isso que gostamos delas
Segundo o sócio da Albira, “estes empreendedores angariam capital para investigar”, enquanto a sociedade investe “para que possam receber um salário durante a fase de procura, pagar advogados, due diligence, todas as despesas associadas à negociação”. “Assim que encontram uma empresa, voltam a nós, explicam-nos qual é o negócio e depois fornecemos mais capital para que possam adquirir a empresa”, esclarece.
“Por exemplo, investimos recentemente na Sobreiro Capital, que vai começar a busca agora. Mas são processos que demoram tempo, cerca de um ou dois anos até se encontrar uma empresa para comprar, e não são fáceis. Envolve reuniões com muitas empresas”, conta ao ECO o investidor que, através da Albira, coloca em média 30 mil euros no search fund e depois mais meio milhão de euros para a aquisição.

“É um ecossistema colaborativo. É uma forma de investimento que vem das universidades e dos MBA, entre alunos e professores que eram investidores. De um modo pequeno, começou a expandir-se para o resto do mundo, mantendo a colaboração. Todos se conhecem e entreajudam, porque quem investe nestes modelos é hands on. Não é só pôr dinheiro à espera de retorno”, corrobora Mafalda Almeida Carvalho, sócia da CCSL.
Todos se conhecem e entreajudam, porque quem investe nestes modelos é mãos na massa. Não é só pôr dinheiro à espera de retorno. Por outro lado, alguns vendedores acham estranho vender a empresa de uma vida a pessoas que nunca geriram nada e vêm de um MBA
Na opinião da advogada, a principal vantagem dos search funds é a mitigação do risco de começar do zero, porque se compra uma empresa que já existe no mercado, porém existem dois obstáculos neste modelo: a falta de conhecimento e resistência à venda. Ou seja, apesar de alguns bancos saberem em que consistem os searchs funds, ainda é difícil para os ‘Indiana Jones’ das aquisições chegarem às instituições financeiras e terem acesso a financiamento para as suas buscas de mercado.
“Por outro lado, alguns vendedores acham estranho estar a vender a sua empresa de uma vida a pessoas que nunca foram CEO, nunca geriram nada e vêm de um MBA, portanto não percebem como o modelo funciona e que na retaguarda há um grupo enorme de investidores que põe as mãos na massa sem ser um CEO de primeira viagem”, sublinha a advogada de M&A.
A investidora sueca Helena Ahlström, diretora geral da Snowfall Capital, ouviu pela primeira vez o termo search fund há dez anos e, em 2019-2020, decidiu ir para Stanford investigar com o pano de fundo das montanhas da Califórnia. Dois anos mais tarde, criou com a sua sociedade com o amigo de longa data Ivar Schmidt e pagou 15 milhões de euros para comprar a empresa portuguesa Frotcom International, que vende sistemas de localização de carros e gestão de frotas. Na altura, o negócio com a HCapital fez-se através de de um modelo de search fund e, desde então, mudou-se para Portugal para acompanhar de perto os sistemas de telemática (GPS) made in Carnaxide.
“Encontrámo-los bem rápido. Falámos pela primeira vez talvez uns três meses depois de termos iniciado a nossa pesquisa. Desde o momento em que começámos até comprarmos [a Frotcom] passou um ano. Ainda não os pusemos na falência [risos], os clientes são estáveis, o negócio é bom e está tudo muito estruturado”, afirmou Helena Ahlström ao ECO, garantindo que se mantêm focada no mercado internacional, que representa mais de 80% das vendas. A investidora nórdica admite que “é bom fazer parte da comunidade de search funds em Portugal e vê-la crescer”. “Estive aqui no ano passado e está maior, com mais pessoas”, garante.
Falámos pela primeira vez talvez uns três meses depois de começar à procura. Até comprarmos a Frotcom International passou um ano. É um negócio bom e com clientes estáveis

Fundo… que não é fundo
- Qual a diferença em relação a outros fundos de investimento? Não existe uma política de investimento nem obrigatoriedade de registo no regulador, até porque se trata de uma sociedade que faz investimento numa única empresa e não uma sociedade gestora. Chamar-lhe fundo é um nome “comercial”, que começou a ser utilizado do outro lado do Atlântico na década de 80 e Portugal adaptou.
- Onde é que os advogados de M&A entram neste jogo? Apoio na procura de investidores para constituição do fundo (que, em termos formais e jurídicos, é uma sociedade) e na entrada no mercado transacional para terem uma shortlist de empresas para comprar, nomeadamente acordos com os investidores, parassociais, negociações (carta de oferta) e “namoro” até o processo de compra em si.
“É semelhante ao M&A com uma camada adicional de complexidade, porque além de se lidar com vendedores e bancos, como qualquer outra operação, lida-se com um grupo muito grande investidores, alguns dos quais os iniciais e querem ficar e os novos que se quer ir buscar”, assinala Mafalda Almeida Carvalho, sócia da CCSL Advogados.
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Empreendedorismo por aquisição. Quando o CEO começa por ser olheiro de empresas
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