Pedidos de patentes e invenções sobem 19% até março. Guerra comercial pode mudar mapa da proteção da inovação

Este sábado é o Dia Mundial da Propriedade Intelectual. No primeiro trimestre, os pedidos de invenções nacionais cresceram para 241, mas a agenda 'America First' dos EUA pode mudar o paradigma.

As empresas e universidades estão cada vez mais preocupadas em proteger a inovação em Portugal. No primeiro trimestre deste ano, o número de pedidos de invenções nacionais (patentes, modelos de utilidade e certificados complementares de proteção) aumentou 19,3% para 241, de acordo com os dados provisórios do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). Em plena ofensiva protecionista dos Estados Unidos, este segmento económico também se poderá reconfigurar, inclusive com mais patentes chinesas na Europa.

Na data em que se celebra o Dia Mundial da Propriedade Intelectual (PI), especialistas explicam ao ECO que esse crescimento na proteção da inovação se deve à consciência de que são necessários mecanismos legais para salvaguardar ativos intangíveis (marcas ou designs) e de que a custódia das invenções tem valor económico e traz vantagem competitiva.

Por outro lado, o aumento dos pedidos de PI parece traduzir o impulso das empresas para expandirem os seus negócios internacionalmente, sendo a proteção da PI um pilar essencial nos processos de internacionalização, ao assegurar a exclusividade e a valorização dos produtos e serviços nos novos mercados”, diz a coordenadora Jurídica na consultora Inventa, Inês Monteiro Alves.

As concessões de direitos também aumentaram a dois dígitos de um ano para o outro, tal como os pedidos. Em três meses, foram concedidas 73 invenções nacionais, o que representa uma subida de 55,3%. Por sua vez, as marcas nacionais e OSDC (Outros Sinais Distintivos do Comércio) – formas de distinguir a marca, como logótipos – contabilizaram 6.193 pedidos de registo entre janeiro e março, mais 4,5% do que no mesmo período do ano passado.

Para Márcia Martinho da Rosa, advogada e agente oficial de PI, este acréscimo, “apesar de relevante, ainda é bastante incipiente” pelo peso das marcas em detrimento das patentes. “As marcas continuam a ser o direito mais solicitado, quando, idealmente, as patentes deveriam apresentar um crescimento mais expressivo. Tal evolução seria um verdadeiro indicador do progresso nacional em matéria de inovação e competitividade, algo que, infelizmente, ainda não se verifica de forma significativa”, alerta.

E dá como exemplo desta “fragilidade” a ausência de instrumentos eficazes de proteção de segredos comerciais. “Persistem ideias erradas, como acreditar que uma simples cláusula de confidencialidade no contrato de trabalho é suficiente. Isso está longe de garantir a segurança da informação estratégica”, garante Márcia Martinho da Rosa.

Pedidos de Patente, Modelo de Utilidade, Certificado Complementar de Proteção e Pedido Internacional em fase nacional. Fonte: INPI

Enquanto uma patente é um contrato entre o Estado e a instituição “inventora” e dá o direito exclusivo de produzir e comercializar uma invenção, que em contrapartida é divulgada publicamente, os modelos de utilidade têm um procedimento administrativo mais simples e célere, mas também dão direitos de fabrico/venda sobre essa nova ferramenta, tecnologia, entre outros.

Patentes europeias tradicionais caem 23%

Apesar do crescimento generalizado nos pedidos e concessões de invenções nacionais, o número de validações de patente europeia apresentadas em Portugal teve um decréscimo de 23,5%, em termos homólogos, para 731 no primeiro trimestre de 2025. Segundo as peritas, ainda é prematuro analisar as estatísticas, por serem provisórias e apenas referentes aos primeiros três meses do ano, mas a queda deverá estar sobretudo relacionada com o sistema de patente unitária europeia, que está em vigor deste o verão de 2023 e permite proteção em 18 países. Há requerentes que têm escolhido este modelo vez do tradicional, embora envolva custos superiores (taxas oficiais e honorários de representantes e traduções).

Fonte: INPI

 

Para mitigar o obstáculo financeiro, a coordenadora jurídica da Inventa refere que as pequenas e médias empresas (PME) têm recorrido ao Fundo PME da União Europeia (UE) gerido pelo EUIPO (European Union Intellectual Property Office), que oferece vouchers de reembolso às empresas para proteção dos direitos de PI. Como? Para marcas e desenhos, recebem até 75% de reembolso em taxas de pedido a nível nacional, regional e da UE. No caso das patentes, até 75% de reembolso em taxas de pré-concessão a nível nacional e até 50% nas taxas de exame e concessão de patentes europeias. Há também cheques para assessoria estratégica e reembolso parcial de taxas cobradas pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) para registos internacionais.

Mapa das invenções em mudança

A jurista Patrícia Akester, especialista em PI e Inteligência Artificial (IA), afirma ao ECO que a agenda America First do presidente norte-americano alterou o ambiente estratégico em que as empresas decidem proteger as suas invenções e vai reorganizar o mapa das patentes. Na sua opinião, se a instabilidade que tem caracterizado o mandato de Donald Trump na Casa Branca se mantiver, haverá uma redistribuição geográfica das patentes. “A hostilidade comercial norte-americana tenderá a desviar uma fração crescente das reivindicações de patentes feitas pela China – solicitações que outrora desembocavam no sistema americano – para a UE”, exemplifica investigadora na Universidade de Cambridge.

“É natural que se verifique também a redução da qualidade média das patentes. A incerteza e a volatilidade em torno da política comercial e o aumento de custos em sede de importação tenderão a espoletar a aposta frenética na reivindicação de patentes – ainda que carentes de conteúdo verdadeiramente inventivo – à laia de mecanismo de defesa, bem como a cortes ou adiamentos no que toca ao investimento em investigação e desenvolvimento”, antevê.

A política protecionista da maior economia do mundo pode também encarecer o acesso à inovação, porque as tarifas elevam o preço de componentes/equipamentos importados, e aumentar os litígios por disputas transfronteiriças sobre violação de direitos de PI e à importação/revenda (fora dos canais autorizados) de bens abrangidos por esses direitos, assinala Patrícia Akester.

O Dia Mundial da Propriedade Intelectual, que se celebra todos os anos a 26 de abril, foi estabelecido em 2000 como referência à data em que a Convenção da OMPI – Organização Mundial da Propriedade Intelectual entrou em vigor (em 1970) para aumentar a consciencialização sobre a importância da PI. O tema escolhido para 2025 é a música, que está ligada aos direitos de autor, mas em constante revolução de consumo e produção com as plataformas de ‘streaming’, como Spotify, Apple Music, Deezer ou YouTube, e a IA.

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