A nova dança dos mercados castiga quem se limita a assistir

O dólar fraqueja, a Ásia avança e a Europa reposiciona-se. Ficar parado em 2025 é o grande risco para as carteiras dos investidores, alertam os analistas da Allianz Global Investors.

Num cenário global onde a incerteza tornou-se regra e a volatilidade já não surpreende, os investidores procuram respostas para navegar num oceano de dúvidas. Esta semana, em Frankfurt, a Allianz Global Investors (AllianzGI) reuniu analistas e jornalistas para partilhar a sua bússola para 2025.

O diagnóstico feito por cerca de duas dezenas de especialistas é centrado num ambiente marcado pela perda de protagonismo do dólar e em que a Ásia assume-se como o novo motor do crescimento mundial, enquanto a banca europeia apresenta-se com uma solidez invejável. O futuro, dizem, pertence a quem souber diversificar, identificar tendências e agir com convicção.

No epicentro das previsões da gestora alemã está a convicção de que o dólar está sobrevalorizado e deverá continuar a desvalorizar face ao euro, ao mesmo tempo que mercados como a China, Índia e Japão ganham tração. Michael Krautzberger, global CIO de obrigações da AllianzGI, destaca que “o dólar está ‘rico’ em termos reais e ponderado pelo comércio”, e que “as dinâmicas estruturais e de política monetária favorecem o euro”.

A AllianzGI assume uma “convicção crescente” na estratégia de estar curto em dólar e longo em euro, assim como mais positivo em ações europeias face a ações norte-americanas.

Esta visão é reforçada pelo contexto de política monetária: com a Reserva Federal dos EUA (Fed) a preparar cortes nas taxas de juro, a atratividade do dólar diminui, sobretudo quando comparada com a Zona Euro, onde o ciclo de cortes começou mais cedo e por isso deverá ser mais lento nos próximos meses. Contudo, Stefan Hofrichter, diretor de economia e estratégia globais, acredita que, “provavelmente, o mercado está a descontar em demasiado os cortes da Fed”.

Além disso, a sustentabilidade da dívida pública norte-americana é cada vez mais questionada. Virginie Maisonneuve, diretora global de ações, alerta para “preocupações orçamentais” do Tesouro norte-americano e para “as avaliações das ações nos EUA”, com as contas públicas a caminharem para um défice orçamental acima de 8% do PIB já em 2026, que poderá pressionar ainda mais a moeda norte-americana.

A AllianzGI assume assim uma “convicção crescente” na estratégia de estar curto em dólar e longo em euro, com os seus analistas a mostrarem-se mais positivos em ações europeias face a ações norte-americanas.

Tobias C. Pross, CEO da Allianz Global Investors, revelou em Frankfurt que está confortável com os 571 mil milhões de euros ativos sob gestão com que fechou 2024, afastando (para já) uma possível uma fusão com a Amundi, como se falou no final do ano passado.

Ásia é o “novo” epicentro do crescimento mundial

No panorama global, se há uma região que merece atenção redobrada por parte dos analistas da gestora alemã é a Ásia. Wilfred Sit, responsável pelo departamento de ações da Ásia-Pacífico, destaca que “as avaliações das ações asiáticas estão abaixo dos níveis médios de longo prazo”, sublinhando ainda que a região beneficia de mercados grandes, líquidos e com capacidade de resposta política, particularmente nos mercados da China, Índia e Japão.

Além disso, a região beneficia de um alinhamento de um conjunto de variáveis que não se vislumbrava há muito tempo, como seja um dólar fraco, petróleo em baixa e ausência de recessão nos mercados desenvolvidos. “Para que qualquer investimento em mercados emergentes apresente ganhos é necessário acontecer estas três situações ao mesmo tempo”, destaca Jenny Zeng, CIO de obrigações para a região da Ásia-Pacífico.

Apesar das tensões comerciais e do abrandamento económico, a China apresenta-se como um mercado subavaliado e com forte potencial de recuperação, destacam ainda os analistas. Kevin You, gestor de portefólios de ações chinesas, refere que “a inovação tecnológica chinesa está subestimada, sobretudo em inteligência artificial e veículos elétricos”.

Para os investidores, é também incontornável o facto de as ações chinesas estarem a transacionar com um rácio preço/lucros abaixo da média histórica, o que pode criar oportunidades para investidores de longo prazo. Além disso, tem sido um mercado suportado pelo recorrente apoio de Pequim, intervindo sempre que o Shanghai Composite Index baixa dos 3.000 pontos, quase como se fosse uma regra tácita. “O apoio do governo ao mercado acionista é consistente com outras iniciativas dos últimos anos”, destaca Kevin You.

Num mundo em rápida transformação, onde a incerteza e a volatilidade parecem ser a nova norma, a mensagem dos analistas da AllianzGI aponta para que 2025 seja um ano de oportunidades para quem souber ler os sinais, diversificar e agir com convicção.

Numa altura em que grandes multinacionais como a Apple e a Samsung anunciaram a intenção de transferir parte da produção para a Índia, o mercado indiano é encarado como o grande beneficiário da diversificação das cadeias de produção globais, reforçado pela ideia de apresentar um mercado interno jovem e em rápido crescimento.

Anand Gupta, líder da equipa de gestão de portefólios de ações indianas, destaca que “a Índia contribuiu com 17,6% do crescimento global do PIB em 2023” e que “o consumo doméstico representa mais de 60% do PIB”, tornando o país menos vulnerável a choques externos. Além disso, o gestor destaca que já hoje a Índia detém o segundo maior mercado acionista entre os mercados emergentes e o quinto maior mercado do mundo, apesar de “encontrar-se num estado de desenvolvimento em que a China estava há 15 anos”.

Numa perspetiva menos emergente e mais consolidada, surge ainda o Japão no outlook da AllianzGI que, segundo Wilfred Sit, beneficia de um conjunto de reformas ao nível da governação das empresas, estabilidade geopolítica e políticas de incentivo ao investimento junto dos pequenos investidores que têm contribuído positivamente para o “crescimento sólido dos rendimentos dos particulares” e para uma recuperação “gradual do consumo”.

Stefan Hofrichter, economista-chefe da AllianzGi
Stefan Hofrichter, diretor de economia e estratégia globais da AllianzGI, considera que as ações norte-americanas estão mais caras face às europeias e, por isso, no decorrer da sua intervenção no AllianzGI Media Days em Frankfurt, referiu que “os investidores devem abraçar as ações europeias para o longo prazo”.

Tecnologia e defesa são temas estruturantes para a próxima década

Num ambiente global marcado por incerteza política e volatilidade, os analistas da AllianzGI consideram que os setores da tecnologia e da defesa devem assumir um papel central nas carteiras dos investidores para os próximos anos.

Apesar dos desafios de curto prazo, como as disrupções nas cadeias de abastecimento, as tarifas e o ambiente macroeconómico menos favorável, a convicção é clara: as tendências estruturais de longo prazo continuam intactas e oferecem oportunidades relevantes para investidores atentos.

Virginie Maisonneuve defende uma abordagem de construção de portefólio em pirâmide, com uma base diversificada e exposição a temas de forte convicção, como inteligência artificial, energia inteligente e defesa. A “digitalização e a transição energética” são megatendências que continuarão a impulsionar o setor tecnológico, mesmo com volatilidade de curto prazo, sublinha a analista.

O setor da defesa ganha também particular destaque num mundo mais fragmentado e com crescente instabilidade geopolítica. Stefan Hofrichter sublinha que “a necessidade de investimento em defesa é urgente na Europa”, estimando-se que a União Europeia precise de investir entre 750 mil milhões e 800 mil milhões de euros por ano em áreas como defesa, transição digital e infraestruturas.

“A necessidade de investimento é urgente. Sem capital privado, estes projetos não avançam. Isto abre uma janela de oportunidade para os investidores”, refere Stefan Hofrichter, reforçando a ideia de que as “ações europeias estão mais baratas do que as ações americanas e vão continuar a valorizar” e, por isso, “os investidores devem abraçar as ações europeias para o longo prazo.”

Para os pequenos investidores, o desafio é não ficarem reféns das incertezas, mas transformar a fragmentação global numa vantagem competitiva.

Destaque também para o setor financeiro e para a banca europeia, com os analistas da AllianzGI a identificarem boas oportunidades de investimento. Vincent Marioni, responsável pelo departamento de crédito, refere que “os bancos europeus apresentam valorizações atrativas e fundamentos sólidos”, beneficiando de um ambiente de taxas de juro mais estável e de uma maior disciplina de capital.

“A capacidade dos bancos europeus para absorverem perdas de crédito melhorou drasticamente desde a criação do Mecanismo Único de Supervisão, há 10 anos”, destaca Vincent Marioni, sublinhando ainda que a expectativa de crescimento moderado na Europa, aliada à necessidade de financiamento de grandes projetos públicos e privados, poderá favorecer o setor financeiro, mesmo num ambiente de continuidade de cortes das taxas de juro por parte do Banco Central Europeu.

Num mundo em rápida transformação, onde a incerteza e a volatilidade parecem ser a nova norma, a mensagem dos analistas da AllianzGI aponta para que 2025 seja um ano de oportunidades para quem souber ler os sinais, diversificar e agir com convicção. A desvalorização esperada do dólar, o dinamismo imparável da Ásia e o renascimento da banca e da indústria de defesa europeias desenham um novo mapa de investimento, onde a gestão ativa e a aposta em tendências estruturais – como tecnologia, defesa e transição energética – podem fazer a diferença.

Para os pequenos investidores, o desafio é não ficarem reféns das incertezas, mas transformar a fragmentação global numa vantagem competitiva. Este ano, segundo os especialistas, mais do que nunca, o risco está em ficar parado.

(O jornalista viajou a convite da AllianzGI)

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

A nova dança dos mercados castiga quem se limita a assistir

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião