“Em cinco anos vamos investir mil milhões nas áreas tecnológicas”

A Caixa está a apostar forte na transição digital, nomeadamente na Inteligência Artificial, mas Paulo Macedo alerta para a escassez de talento português

A Caixa Geral de Depósitos vai investir 200 milhões de euros nos próximos anos nas áreas de sistemas de informação, cibersegurança, inteligência artificial e digitalização, elevando para mil milhões o valor de investimento tecnológico no espaço de cinco anos. Quem o garante é Paulo Macedo, CEO do banco público, que alerta para a escassez de talento nestas áreas: “Nós temos a geração mais bem preparada, mas a geração mais bem preparada tem muita procura. O risco é se nós vamos ter as pessoas suficientes”, diz, em entrevista ao ECO.

Aborda ainda a necessidade de a Caixa continuar a procurar ter uma estrutura mais leve, como forma de preparar tempos mais difíceis, que para já não são a realidade. E compara aquilo que se espera atualmente de um líder com o que era exigido há uns anos. A grande diferença é um muito maior escrutínio, nomeadamente na ascensão aos lugares de topo da banca.

Paulo Macedo é um dos finalistas do prémio de melhor CEO nos IRGAwards 2025, iniciativa da Deloitte e que tem o ECO como parceiro, tendo mesmo conquistado essa distinção em 2024.

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O que é que identifica como principais riscos neste momento, para o setor bancário?

Os riscos do setor bancário, para além das questões da cibersegurança, são riscos como o ataque ao sistema de pagamentos, portanto, das big techs, não propriamente das fintechs. Acho que os bancos conviveram muito bem com as fintechs, quer alguns bancos comprando, quer outros fazendo parcerias. Mas a questão das big techs é de facto importante.

Depois vemos ameaças, nós temos uma lista de riscos, costumo nas minhas apresentações citar os riscos do World Economic Forum porque, como sai todos os anos e é atualizado, é uma série longa que se pode comparar. Mas depois a banca tem os riscos, entre aspas, identificados pelo Banco Central Europeu. Nos riscos temos para todos os gostos.

A questão é como é que lhes damos respostas, como é que os mitigamos e como é que os prioritizamos. Portanto, para além da cibersegurança, para além do ataque ao sistema de pagamentos, há a queda das margens financeiras e depois algumas incógnitas que vão mudar, como o euro digital.

Há diferentes ameaças e depois temos sempre uma ameaça que é comum às outras indústrias, que é a questão da escassez de talento. Designadamente nestas áreas da inteligência artificial. A Caixa já está a recrutar umas centenas de pessoas por ano, obviamente mais nestas áreas das engenharias, de data science, de inteligência artificial, mas também das áreas de risco, de compliance, auditoria e também várias pessoas para a área comercial. Nós temos a geração mais bem preparada, mas a geração mais bem preparada tem muita procura.

O risco é se nós vamos ter as pessoas suficientes, também com as que saem de Portugal, se vamos ter as pessoas, em quantidade e qualidade, para conseguirmos inovar como os nossos clientes exigem.

E, de facto, hoje em dia, vê-se bastante inovação na Caixa em termos de processo, em termos da jornada de cliente e em termos de maior agilidade e simplificação.

Temos sempre uma ameaça que é comum às outras indústrias, que é a questão da escassez de talento. Designadamente nestas áreas da inteligência artificial

Paulo Macedo

CEO da Caixa Geral de Depósitos

Neste ambiente de grandes mudanças, como é que acha que é possível às empresas e a qualquer organização, nomeadamente até à Caixa, conciliar a necessidade de dar resposta a estas mudanças de curto prazo, às vezes em sentidos contrários, com o ataque aos desafios e ao planeamento de longo prazo que qualquer organização, nomeadamente grande, tem que ter.

Há coisas que nós vamos ter sempre que fazer, independentemente da conjuntura. Nós vamos ter sempre que prestar melhor serviço aos nossos clientes, porque senão eles têm alternativas, felizmente que há alternativas.

Vamos ter sempre que ser mais ágeis e mais rápidos, ou a questão de ter melhores níveis de serviço no atendimento nos call centers. Por exemplo, a Caixa fez uma evolução muito boa no tempo de atendimento das pessoas nos balcões, embora nós tenhamos uma percentagem pequeníssima das nossas transações que são feitas ao balcão, a esmagadora maioria, mais de 90%, é feita fora do balcão. Esta melhoria de atendimento é importante.

E depois há coisas que nós não sabemos muito bem, mas em que temos que fazer investimentos estratégicos. Por exemplo, o caso da inteligência artificial, passe o lugar comum, é totalmente estratégico, não pelo que possibilita já hoje, mas pelo que vai possibilitar.

Nós hoje já utilizamos a inteligência artificial em várias áreas, desde a assistente digital, que estabelece mais de dois milhões de contactos por ano, desde a leitura de documentos até aos targets que definimos relativamente aos clientes, no sentido de que tipo de oferta é que lhe pode interessar. Mas o potencial é muito maior, a médio prazo.

Portanto, nós investimos em sistemas de informação, com cibersegurança, com inteligência artificial, com digitalização, etc. Temos planeado investir cerca de 200 milhões nos próximos anos. Em cinco anos vamos investir mil milhões de euros.

Nestas áreas?

Nestas áreas, são coisas estratégicas e temos um grupo grande de inteligência artificial e que estamos a escalar. Temos que fazer coisas do dia-a-dia, temos que fazer coisas estratégicas e, por outro lado, temos que nos preparar para tempos mais difíceis.

A Caixa tem que ter uma estrutura mais leve, não é por acaso que nós saímos da nossa sede onde estávamos confortáveis em 90.000 metros quadrados, na João XXI, e vamos para um edifício na Expo com 32.000. Não é por acaso que as agências em certos sítios hoje são mais pequenas do que eram há uns anos.

Paulo Macedo, CEO da Caixa Geral de Depósitos, em entrevista ao ECOHugo Amaral/ECO

Mas é curioso ter falado da sede e dos balcões e do nível de ter uma estrutura de custos controlada. A Caixa tem tido resultados muito bons tanto operacionalmente como resultado líquido. Mas, pelo que me diz, não há o risco de ficar deslumbrado com isso, continua a ter o pensamento de uma certa frugalidade, apesar destes anos de abundância, digamos assim.

Nós, por exemplo, não temos frugalidade nenhuma em investir em sistemas, em aumentar as pessoas, em promover, nunca pagámos prémios tão altos às pessoas da Caixa. Fizemos agora um inquérito, a que responderam mais de 70% dos colaboradores da Caixa, em que tivemos a melhor notação de sempre, pois há um ciclo virtuoso. Se a reputação da Caixa é boa, se as pessoas têm melhores equipamentos, os sistemas vão menos abaixo. Se os clientes estão mais satisfeitos, os empregados, os colaboradores também ficarão mais satisfeitos.

Por outro lado, nós temos o maior investimento da banca em formação, a todos os níveis, desde assistentes operacionais à gestão intermédia até ao topo.

Há áreas onde não somos nada frugais. Há outras áreas onde, de facto, é ostentar, ter ali no maior edifício talvez de Portugal, que deve ser aquele, os serviços centrais de um banco. A Caixa continua líder de mercado, apesar de tudo o que diziam, tem bons resultados, quer dizer, tem que ter um sítio digno, tem que ter um sítio onde as pessoas possam ter boa forma de trabalhar e até novas formas de trabalhar e de interagir.

Sobre o papel do CEO, ou se quisermos falar, líder, pessoa que está à frente de uma organização. O que é exigido a uma pessoa que está num cargo desses tem mudado nos últimos anos? Ou o que é essencial, o que se pede essencialmente é a mesma coisa que sempre foi?

Mudou há vários anos a questão do escrutínio. Mudou há vários anos também a questão da maior responsabilização, e tanto para os gestores públicos, como para os gestores de entidades de capitais públicos, como para entidades privadas.

E, de facto, uma concorrência mais aguerrida. Não me lembro de nunca ninguém ter dito na banca que a concorrência estava baixa ou que o ano ia ser muito fácil, é uma coisa que eu não me lembro e tenho já, feliz ou infelizmente, umas décadas disto. Todos estamos mais sofisticados e também temos muitos bancos a operar que têm matrizes fora de Portugal e que, portanto, trazem inovação e, portanto, cabe-nos a nós ter outro tipo de inovação e concorrer.

Há alguns desafios aos CEO que, de facto, são novos. Agora, mais uma vez, há que criar valor, servir melhor os clientes, ter atenção aos stakeholders, ter talvez mais cuidado na retenção e captação de talento, ter as pessoas mais satisfeitas, ter de facto aquela questão que nós dizíamos que os fornecedores são parceiros ou não são parceiros.

Portanto, isso era verdade antigamente, continua a ser hoje, todas essas coisas?

Uma parte, e depois eu diria que há uma maior exigência toda numa parte mais intangível, numa parte em termos de ética, numa parte de preparação da empresa para o futuro, de adaptação face à concorrência. Acho que isso é positivo, desde que não se queira alguma coisa como, por exemplo, com os políticos, hoje em dia vemos sistematicamente julgamentos públicos a toda hora aos diferentes dirigentes, em vez de saber os factos. Há um escrutínio que penso que é diferente, mas que também veio para ficar.

Por exemplo, uma das grandes diferenças do CEO, hoje em dia, de um banco, é todo o fit and proper que o próprio Banco de Portugal faz.

Até 2014, não eram pedidos tantos esclarecimentos sobre potenciais conflitos de interesse. Era um modelo muito complexo, moroso, mas, adaptado, devia aplicar-se a empresas cotadas, devia-se aplicar a entidades públicas. Os conflitos de interesses são identificados exaustivamente, os lugares ocupados são identificados até não sei quantos anos atrás, o currículo é avaliado.

Mas há aqui uma responsabilização das pessoas a vários níveis e sobre a sua vida também, de acordo com a justiça, se teve contraordenações ou se teve alguma coisa, as suas participações financeiras, se alguma vez foi multado, ou porquê, a origem da multa, etc. Portanto, é um escrutínio muito grande.

Esse processo de fit and proper quase podia ser, de facto, adaptado até a titulares de cargos políticos, temos tido tantas surpresas.

Acho que tem de ser, quer dizer, não sei como é que está hoje, se há a tal ficha. Que a tal ficha tem que ser aprofundada, não tenho dúvidas que tem que ser. Que não fazia uma coisa totalmente técnica e aplicá-la a políticos, isso também não fazia.

Agora conflitos de interesses, passado, empresas, qualificações, etc., têm de ser uma coisa bastante exaustiva.

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