Portugueses na Sonangol: A nacionalidade é um estigma?

  • Paulo Gorjão
  • 27 Outubro 2017

A decisão de gestão da Sonangol de nomear dois administradores portugueses foi vítima colateral da conjuntura de política externa.

A poucos dias de deixar o cargo de Presidente da República, José Eduardo dos Santos exonerou o presidente da Comissão Executiva da Sonangol, Paulino Jerónimo, e dois administradores executivos, César Paxi e Jorge de Abreu, nomeando em simultâneo três novos administradores, um angolano, Ivan Sá de Almeida, e dois portugueses, Susana Almeida Brandão e Emídio Pinheiro.

Surpreendentemente, ou talvez não, na verdade, após serem conhecidas as alterações, as nomeações dos dois portugueses provocaram uma pequena tempestade num copo de água. A nacionalidade portuguesa, enquanto cartão de visita, já conheceu no passado melhores dias em Angola, o que, em bom rigor, explica a reacção destemperada e sem nexo que gerou em alguns círculos angolanos, e o subsequente eco mediático em Portugal.

A contestação às duas nomeações — centrada exclusivamente na nacionalidade, uma vez que a solidez dos currículos dos nomeados, tanto quanto sei, ninguém contestou — resulta, no fundo, exclusivamente da actual conjuntura menos boa que marca as relações luso-angolanas. De certo modo, uma decisão de gestão da Sonangol foi vítima colateral da conjuntura de política externa. Alguém duvida que, fosse outra a conjuntura luso-angolana, este seria um não assunto em Angola?

O momento menos bom nas relações bilaterais luso-angolanas, por sua vez, alimenta também o combate político interno angolano. A CASA-CE, com a legitimidade que decorre da normal dialéctica política, aproveitou para carregar nas tintas, destacando uma discriminação inexistente, na verdade, mas que em teoria politicamente lhe permite colher dividendos. Nada de novo, de anormal, ou de particularmente grave, mas importa perceber que, também nesta vertente, a reacção às nomeações para administradores executivos da Sonangol se explica como um subproduto da política interna angolana, mais ainda num momento de uma transição histórica e de consolidação do novo Presidente da República, João Lourenço.

Em suma, espuma, nada mais do que espuma do momento. Aquilo que verdadeiramente interessa? Os resultados operacionais. É pela bitola dos resultados do seu trabalho que os administradores executivos da Sonangol devem responder e não pela sua nacionalidade.

As escolhas parecem indiciar que, além de procurar reforçar a coesão na empresa, a ordem oriunda do topo é para focar na eficiência e nos resultados. Inevitavelmente, se assim é, então a escolha dos profissionais e dos administradores executivos passa por seleccionar os melhores em função das áreas em que vão actuar. Qualquer cidadão angolano, e o próprio accionista Estado, naturalmente, não pode deixar de ver nesta abordagem um sinal de pragmatismo e por essa via um bom indício para o futuro.

Mergulhada numa profunda crise, na sequência da quebra dos preços do petróleo e de uma gestão incapaz de dar a volta à situação, Isabel dos Santos assumiu em Junho de 2016 as rédeas da Sonangol tendo como missão principal a reestruturação da empresa, o que tem vindo a ser feito, aliás, sem que se conheçam grandes rupturas. Logo em 2016, a Sonangol registou um crescimento de 36%, resultado operacional que traduziu uma inversão na tendência registada nos dois anos anteriores.

Mais do que a nacionalidade, o elo comum entre os administradores executivos parece ser a sua competência associada à confiança pessoal. Angolanos ou portugueses, os escolhidos são profissionais competentes que gozam igualmente da confiança de Isabel dos Santos e de Mário Leite da Silva, como não poderia deixar de ser. Administradores executivos alinhados perante uma agenda e cultura de mudança na Sonangol, mais focada nos resultados e nas regras impostas pelos mercados altamente sofisticados em que a empresa se movimenta. A eficiência e a eficácia não são chavões, antes uma absoluta obrigação.

A Sonangol é a empresa mais importante em Angola. A sua saúde empresarial não é opcional, antes uma exigência de Estado com carácter de urgência. Pensar que o presidente João Lourenço e Isabel dos Santos poderão estar desalinhados nos objectivos de reestruturação da maior e mais importante empresa angolana não tem qualquer fundamento. João Lourenço é o primeiro interessado na revitalização da Sonangol e o primeiro beneficiário desse processo de reestruturação do grande pulmão da economia angolana. Como poderia ser de outra forma?

A polémica política, mas artificial, sobre a nacionalidade dos administradores executivos da Sonangol seguramente pouco ou nada interessa ao cidadão comum angolano. O que lhe importa são os resultados alcançados e que, tão rápido quanto possível, o pulmão volte a bombear o oxigénio de que a economia necessita.

Nota: Por opção própria, o autor não escreve segundo o novo acordo ortográfico.

  • Paulo Gorjão
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