Será o procurador Figueira um cesteiro?

José Miguel Júdice analisou no Jornal das 8 da TVI o caso Fizz e as mudanças de opinião do procurador Orlando Figueira. Sublinha o peso político de Manuel Vicente e defende Proença de Carvalho.

O tema da acusação de corrupção ao antigo vice-presidente de Angola, Manuel Vicente, é incontornável. E agora já consigo ver tudo mais claro e por isso talvez seja capaz de iluminar a questão com um foco diverso do conhecido.

Para começar, uma rápida pesquisa no Google permite ler o seguinte: “os autos assumem natureza urgente pelo facto de o arguido Orlando Figueira se encontrar em medida de coação privativa da liberdade desde 23 de fevereiro de 2016”, ou seja, desde há dois anos. A acusação foi conhecida um ano depois e o julgamento começou há dias.
Outro facto: a acusação do processo Marquês deixou de lado a investigação em relação ao Brasil porque ia atrasar tudo e há quem diga (não sei se é verdade) que poderia chegar ao Presidente Lula. Ou seja, o MP não investiga tudo e usa critérios de oportunidade.

Outro facto ainda: Parece que Manuel Vicente foi há dias a Davos na comitiva do Presidente da República de Angola. O que tem enorme significado político e estratégico. No mundo dos símbolos, e no plano internacional isso é essencial, não se podia ser mais explícito, haja em vista que João Lourenço ia reunir com António Costa. Seja como for, parece que Vicente é “a pessoa por trás do trono”: para não dizer mais, é muito próximo de João Lourenço.

As coisas são o que são. A Justiça portuguesa demorou dois anos após a detenção de Orlando Figueira para iniciar o julgamento. E colocou o vice-presidente de um Estado soberano no banco dos réus, aparentemente apenas com base num indício: Figueira beneficiou Manuel Vicente e por isso recebeu um chorudo contrato.

Ninguém está acima da lei? Claro que não. Se Orlando Figueira aceitou que Manuel Vicente o corrompesse, ambos cometeram um grave crime? Claro que sim.
Mas todos os crimes são investigados? Claro que não. Leia-se o excelente artigo de Fernanda Câncio no Diário de Notícias de hoje. E se a certeza da forte probabilidade de condenação não existir, deve o MP acusar? Claro que não. Talvez por isso Ferreira Fernandes escrevesse que por vezes a Justiça é burra.

A arrogância do procurador Figueira é habitual nos Réus? Em mais de 40 anos, nunca vi nada assim. Só mesmo um procurador de República que se julgue “divino”, com costas quentes e sem sentido ético (não se pode ter tudo…) falaria assim a um Juiz. E que disse Figueira? Que quem lhe pagou foram outros. Mas que não foi corrompido: do alto da sua suficiência, acha que “vale” 760 000 euros.

Querem a minha previsão sobre como isto vai acabar? Há duas hipóteses:

  1. A primeira hipótese é que o Tribunal da Relação de Lisboa mande o processo já separado (e bem) pela 1ª instância para os tribunais angolanos. Aí ficará no congelador durante 5 anos, pois foi dito que em 2022 ele já poderá ser julgado. Ou então será aplicada a lei de amnistia angolana, se não tiver havido compromissos de Estado a Estado de que isso não aconteceria. Em Luanda dir-se-á que foi uma vitória, em Lisboa haverá alguma gritaria, mas tudo voltará ao normal.
  2. A segundo hipótese, se o Tribunal da Relação de Lisboa não fizer isso, é que a trapalhada em que se meteu o MP com esta acusação vai terminar com a conclusão óbvia: Figueira cometeu crimes e será condenado, provavelmente também por corrupção. Mas não se provará que foi Manuel Vicente quem o corrompeu. O que, aliás, nem parece difícil de antever em função dos factos conhecidos. E tudo termina em bem.

Qual é o problema da segunda hipótese? É que, para isso, o MP pode achar que tem se atirar ao banqueiro Carlos Silva (que até hoje, em todo o caso, não teve uma palavra de apoio do Governo de Angola) e a Proença de Carvalho (de que os procuradores em geral gostam menos do que o Presidente Bush Pai gosta de brócolos). E isso preocupa-me como cidadão. É que sinto que Figueira está divertido de mais, eufórico e arrogante como um novo rico, provocador como quem sente as costas quentes. E isso desgosta-me da parte de quem reconhece e confessa que cometeu crimes muito graves, sendo um Magistrado

E desgosta-me também por estar a ver aqui o terreno para criar bodes expiatórios, sobretudo quando são oferecidos numa bandeja de prata por um magistrado que confessa fraude fiscal e branqueamento de capitais, como se isso fosse igual a dizer que é adepto do Benfica.

Não conheço Carlos Silva e, por isso, nada posso dizer sobre ele. Mas a imputação a um advogado de colaborar na prática de um crime é devastadora. Eu conheço Proença de Carvalho há 40 anos e não acredito que isto possa ser verdade. Mesmo que tivesse minutado o tal contrato, o que não sei se ocorreu, o que seria se um advogado fosse condenado por minutar contratos, assumindo que não lhe foi dito (o que, aliás, seria um disparate) que era destinado a corrupção?

Por tudo isto talvez, não sei porquê, não deixa de me vir à cabeça um velho provérbio popular: “cesteiro que faz um cesto faz um cento”. Mas deve ser por estar a ficar velho, como é evidente. Com toda a sua sabedoria jurídica, o procurador da República Figueira seguramente que não faz cestos. Ainda que ele pareça estar contente como ficaria quem os soubesse fazer bem. E continuasse a fazê-los…

João Galamba e as más notícias

A história é conhecida. Numa entrevista ao DN, declarou em relação à função pública, e cito, que “dificilmente poderá haver aumentos salariais em 2019”. A teoria simplista é que disse isso por estupidez, sem instruções do primeiro-ministro e que se trata de um erro palmar. Pode ser, mas não é um erro. Por isso, a pergunta: Porquê isso foi dito?

Em primeiro lugar, porque esvazia cedo o balão as exigências do PCP e do BE, visto que já ficam a saber o que será provável. Nestes casos, mais vale cedo que tarde.

Depois, porque também disse “se for possível, esses aumentos devem existir”. E então será maravilhoso para o PS (nada melhor do que uma surpresa boa de que já se desistira) no final de 2018 dar uma alegria em ano eleitoral.

Mas, sobretudo, porque para ganhar as eleições de 2019, com maioria absoluta como deseja, tem de juntar às credenciais de esquerda que ganhou, o apoio do eleitorado do centro, moderado e preocupado em que estraguem tudo. E por isso ele também disse “é melhor que sejam passos curtos e mais lentos do que acelerados e depois tenha de se voltar para trás”.

Passos Coelho não diria diferente. Moral da história, o combate pelo eleitorado central já começou. Como disse um banqueiro que gosta de dizer o que pensa, habituem-se…

Os semáforos e as multas

A notícia (dada por Miguel Gaspar, o vereador do trânsito em Lisboa) passou despercebida, mas merece louvores. Os autocarros da Carris passarão a ter mais prioridade nos semáforos do Eixo Central (para já, entre Entrecampos e o Marquês de Pombal, a seguir na Estrada de Benfica e depois por aí fora) para assegurar a pontualidade.

E também passará a ser multado de imediato quem parar nos corredores BUS. E, digo eu, espera-se que também quem o faz em segunda fila atrapalhando o trânsito, como cantou Xico Buarque, ainda que aqui sem morte à mistura.

Dar realmente prioridade aos transportes públicos, diminuir a poluição, aumentar a produtividade, reduzir os custos de transporte de classes médias e baixar tempos mortos, é fazer Estado Social.

Por isso, com o louvor, vai uma oração a São Cristóvão ou a Mercúrio (para respeitar o pluralismo religioso) a pedir que tudo corra bem e que esta excelente ideia não falhe por motivos tecnológicos.

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