O marketing tradicional morreu. O digital também
Kotler acredita que o marketing vive hoje a sua era “4.0”, na qual existe (finalmente) uma convergência entre o marketing tradicional com o marketing digital.
É uma prática mais ou menos comum, entre os profissionais que trabalham no mundo das marcas, sejam eles marketeers ou publicitários, falarmos de Philip Kotler como se fosse um teórico do passado. No entanto, mesmo com os seus 86 anos (sim, leu bem, faz 87 em maio), o guru norte-americano, por muitos considerado o pai do marketing moderno, continua a escrever algumas das teorias mais interessantes que tenho lido nos últimos tempos. Desconfiado? Então, vejamos.
O surpreendente na escrita de Kotler não são tanto as novidades que nos traz, mas antes as coisas complicadas que se tornam simples após a sua explicação. Para os que não estão muito familiarizados com estas teorias, segue uma explicação sucinta: Kotler acredita que o marketing vive hoje a sua era “4.0”, ou seja, existiu uma primeira fase em que o marketing se focava no produto (este carro é melhor que os outros porque é mais veloz), depois passamos para uma segunda fase em que o marketing se focou nos consumidores (esta carro é melhor que os outros porque se adapta melhor a si), atravessámos ainda uma terceira fase em que o marketing se focou nos consumidores enquanto pessoas (este carro é melhor do que os concorrentes porque diz algo sobre si aos outros) e, por fim, vivemos atualmente a já referida quarta fase, na qual existe (finalmente) uma convergência entre o marketing tradicional (terceira fase) com o marketing digital.
Por outras palavras, no mundo de hoje, o marketing continua a estar focado no consumidor enquanto ser humano, mas tem que ter presente que este ser humano vive e consome numa economia digital (sabemos que este carro é melhor para si porque sabemos os seus hábitos, bem como o que costuma pesquisar no Google e seguir no Facebook, logo, se clicar agora aqui, poderá ver os modelos que temos para entregar no seu país, poderá de seguida pagar o sinal por PayPal e nós entregaremos a sua nova viatura, em sua casa, no prazo de 14 dias). Assim como assim, fiquem a saber que a Tesla já faz este serviço on-line em Portugal.
Tudo o que escrevi até agora, parece-nos algo de muito simples e até um pouco óbvio. Todos sabemos que vivemos na era da transformação digital, todos lemos sobre big data, programática, inteligência artificial, branded content digital e consumer journey. Mas será que todos nós, profissionais do marketing e da publicidade, estaremos preparados para enfrentar esta anunciada convergência entre o marketing tradicional e digital? Esta é a pergunta para 1 milhão de dólares.
Até há pouco tempo, o diretor de marketing tinha na sua equipa profissionais que se focavam na publicidade tradicional e outros que tratavam da publicidade digital, inevitavelmente o budget dos primeiros era muito maior do que o dos segundos. Da mesma forma, quando o diretor de marketing precisava de publicidade tradicional recorria a uma grande agência especializada apenas nesse tema, e quando precisava de publicidade digital, recorria a uma agência focada nesse negócio. Certamente, que já ouviu falar de excelentes agências para fazerem anúncios de TV, imprensa, rádio e outdoor, mas que são terríveis no digital. Tal como, já ouviu falar de agências digitais estupendas no CRM e no social media, mas incapazes de fazerem um anúncio de TV verdadeiramente relevante e criativo.
Seguindo a mesma lógica, mas agora dentro do mundo das agências, existiam profissionais que só percebiam de publicidade tradicional e outros que apenas percebiam de digital. Inevitavelmente, ambos tinham o seu espaço nas já referidas agências especializadas.
Chegamos agora ao âmago da questão: este mundo, descrito nos parágrafos anteriores, por e simplesmente deixou de existir. Se o consumidor é simultaneamente um ser humano e alguém que vive numa economia digital, então os marketeers, as agências e os publicitários de hoje, têm que ser, perdoem-me a brincadeira, altamente especializados em tudo – desde o analógico até ao digital.
O diretor criativo que acha que fazer filmes de trinta segundos para televisão é que é bom, tem tanto espaço na publicidade moderna, como o diretor criativo digital que acha que não precisa de saber fazer spots de rádio. Ou seja, espaço nenhum. O mundo de hoje exige profissionais híbridos, que naveguem no digital e no tradicional com a mesma agilidade, facilidade e profundidade.
Mas vivendo nós numa economia digital, arrisco-me a ir até um bocadinho mais longe e a afirmar, sem complexos, que o publicitário de hoje tem ainda que estar inevitavelmente mais focado no negócio das marcas que trabalha, sabendo com criatividade produzir uma comunicação que resulte inevitavelmente em conversão de vendas.
Sobre este ponto, há uma frase de Washington Olivetto que gosto muito: “o publicitário não vende nada”. Ao que o mestre da publicidade brasileira complementava com a seguinte explicação: “quando um cara vai ao stand comprar com um carro, não está lá um publicitário para o vender”, ou seja, “a publicidade o que pode fazer é levar o cara ao stand”, criando aquilo a que se chamava na época “predisposição para a compra”.
Olivetto tinha toda a razão no que dizia e por isso mesmo é que era um génio. Acontece que o mundo mudou e que, como vimos em cima, o publicitário de hoje é responsável por toda a jornada do consumidor, do anúncio na TV, à pesquisa no Google, passando pela entrada no site da marca e pela experiência do utilizador que o leva à compra do carro. Daí, a nossa profissão ser cada vez mais relevante no mundo dos negócios. Daí, ser tão importante que nós, profissionais das marcas, nunca percamos o caminho da inovação.
Em suma, falar de marketing tradicional e digital não faz qualquer sentido nos dias de hoje. O que agora existe é um movimento de convergência, que fará inevitavelmente com que todas as agências e profissionais se tornem absolutamente híbridos e focados num propósito maior: tornar as marcas mais próximas das pessoas e mais rentáveis para quem as detém.
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