Luz, quem a paga?
Não tenho qualquer problema de princípio com empresas lucrativas. Mas quando os ganhos são anormais, por falta de concorrência, não fico contente.
Estivesse eu em Campeã, Vila Real, e era possível – bastante provável, mesmo – que este artigo não existisse. É que eu uso o computador para escrever e os computadores requerem energia eléctrica e isso é coisa que não há naquela região desde a tarde de Terça-feira. Parece que neve e gelo (estamos em Fevereiro, que em Portugal é Inverno) se acumularam nas linhas e postes, fazendo-os cair. E, pelos vistos, ainda não houve como reerguê-los.
Eu olho para os preços da electricidade na Europa e ocorre-me que o segundo quilowatt-hora mais caro em paridade de poder de compra, que passa para o sexto lugar em termos absolutos, acima, por exemplo, da Suécia, do Reino Unido ou do Luxemburgo, daria direito a postes livres de neve. Mas talvez tenhamos de criar uma nova taxa para o efeito.
O lado positivo é que a falta de luz em Campeã não deverá estar a significar mais frio que o costume, porque as pessoas, com este custo da energia eléctrica (ou com esta qualidade de construção, no entender de António Mexia), já se habituaram a não usar meios de aquecimento que impliquem ligação à tomada.
Ironicamente, ontem foram conhecidos os resultados de 2017 do grupo EDP. Sem a venda da Naturgas e da Portgas, os seus lucros teriam diminuído 5%. Mesmo assim, ainda que menor que no ano anterior, sempre foi um EBITDA superior a 3.500 milhões de euros. Deve dar para pagar a nova imagem da EDP Distribuição e da EDP Serviço Universal exigida pela entidade reguladora, já que as actuais se confundem com a EDP Comercial.
Para aquela queda contribuíram, além da seca (sempre o clima) e das novas regras aplicáveis ao clawback, o fim dos ajustamentos anuais nos CMEC, em Julho de 2017. Ora, CMEC significa Custos para a Manutenção do Equilíbrio Contratual. Basicamente, são uma compensação pelo fim antecipado dos Contratos de Aquisição de Energia (CAE), aquando da liberalização do mercado ibérico. Custos, decididamente; já a parte do equilíbrio contratual oferece-me dúvidas. Parece-me mais que a liberalização do mercado veio apenas mudar o acrónimo da renda excessiva, quando a ideia era que esta desaparecesse.
Aliás, uma dica. Se uma empresa que tem pouca companhia no mercado – ainda por cima, num mercado em que a procura é rígida – nos oferece um desconto, isso é sintoma de que andamos a pagar preços bastante acima do que seriam os concorrenciais. Ficamos muito animados com os 5% ou 10% que nos concedem, mas, na verdade, o que isso indicia é que o consumidor não está a obter a sua quota de bem-estar, o chamado excedente.
Devo esclarecer que não tenho qualquer problema de princípio com empresas lucrativas. Pelo contrário. Mas quando os ganhos são anormais, no sentido em que resultam da falta de concorrência, eu não fico contente. Principalmente num sector tão importante quanto o energético, que ajuda a determinar custos de contexto para as demais empresas, ou seja, a própria competitividade da nossa economia.
Nota: A autora escreve segundo a ortografia anterior ao acordo de 1990.
Disclaimer: As opiniões expressas neste artigo são pessoais e vinculam apenas e somente a sua autora.
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