Make Portugal Great Again
É toda esta mediocridade vigente que se apoderou das sociedades modernas que semeou a vitória de Trump e de outros fenómenos inexplicáveis.
Ao contrário de tantos em Portugal, eu não apoiei nenhum candidato nesta eleição americana. Sou português, não voto nos Estados Unidos, e os europeus não decidem eleições fora dos seus países. Ridículo o misto de preconceito e soberba de quem achava que, cá, influenciava alguma coisa lá.
Se fosse americano, teria muita dificuldade de escolha em quem votar. Nunca gostei de Hillary Clinton, mas temia também o carácter imprevisível de Donald Trump. Enquanto profissional de comunicação, como disse na semana passada aqui no ECO, entendo que a campanha que mais entusiasmou, que galvanizou jovens como o fez Barack Obama, nunca hostilizou os diversos segmentos de eleitorado e tinha menos pontos fracos para deixar espaço para ataques de campanhas negras era a de Bernie Sanders. Que por sinal, com o seu discurso contra o “establishment”, contra a Goldman Sachs e o dinheiro sem rosto, e que mencionava inúmeras vezes “jobs” na sua mensagem, jamais perderia todo o “Rust Belt”, zona onde Trump ganhou o lugar na Sala Oval.
A campanha de Hillary foi um desastre. Se perguntar se alguém se lembra de alguma ideia dela, temo que se recordem apenas da sua boca sempre aberta e a acenar ao público, tentando criar, como lhe mandaram fazer, uma ilusão de proximidade e simpatia incapaz de casar com a imagem gélida e pouca empática que, subliminarmente, povoa o imaginário dos americanos que nunca gostaram muito dela.
Trump foi o candidato, o estratega, a mensagem. E provou uma máxima que aprendi uma vez do Luís Paixão Martins: consultores de comunicação não ganham eleições, constroem narrativas. Quem ganha as eleições é o candidato. E Trump, o candidato, o estratega, a mensagem, ganhou. E ao contrário do que na Europa se pensava, muitos compatriotas seguiam-no com convicção, enchiam os seus comícios, que tinham mais gente, como ele dizia, do que Hillary com Beyoncé, Lady Gaga, Jennifer Lopez ou tantos outros artistas que a apoiaram.
Os tempos mudaram e o milionário soube adaptar-se à democracia das redes sociais, ao tempo das celebridades de “reality show”, compreendeu a raiva das pessoas que se sentem enganadas por políticos que não as ouvem, que se servem da política, ao invés do mais nobre que a política tem que é trabalhar para o bem das pessoas.
Trump ganhou porque os americanos assim decidiram. Vai ficar na história por ser o primeiro não político a ir para Washington. Não sabemos agora se terá coragem para «drenar o pântano» da capital política do mundo. Mas há uma coisa que temos de perceber e juntar: Brexit, Trump, presidente da câmara de Roma do partido de Beppe Grillo, talvez Marine Le Pen nas presidenciais francesas. São muitos sinais de desagregação dos partidos tradicionais.
As pessoas estão cansadas dos políticos, de um sistema que está longe da proximidade que seria de exigir a quem nos representa. Mas também estão cansadas de sondagens fajutas, imprensa que não escreve a verdade, comentadores que não têm qualidade, substância e não compreendem o mundo em que vivem, mas que por 15 minutos de fama não perdem a oportunidade de ir à televisão falar do que não sabem.
É toda esta mediocridade vigente que se apoderou das sociedades modernas que semeou a vitória de Trump e de outros fenómenos inexplicáveis. Se houvesse um bom Governo, de bem, justo, representativo, nunca haveria a revolta das maiorias silenciosas. Um dia destes, se calhar, também alguém aparecerá no nosso pântano a dizer qualquer coisa como: «Make Portugal Great Again». Deixo o aviso com algum tempo de antecedência.
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